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Autor:
Ciro Pereira Scopel
Qualificação:
Vice-presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Secovi-SP
E-Mail
[email protected]
Data:
06/11/01
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Aos Clandestinos, o Perdão!

Temos acompanhado com freqüência na imprensa notícias sobre "loteamentos" clandestinos na Cantareira, em regiões de preservação de mananciais e em outras áreas protegidas por legislação ambiental. Há vinte anos, a lei que regulamenta o parcelamento de solo no Brasil (n.º 6.766/79, alterada pela lei n.º 9.785/99) estabeleceu dispositivos de proteção ao consumidor e ao meio ambiente, bem como requisitos urbanísticos. São regras severas, seguidas à risca por aqueles que atuam dentro da lei.

A obtenção de licença para um projeto de loteamento é bastante complexa e demorada. O processo percorre prefeituras, secretarias de Estado, concessionárias de serviço público e autarquias federais. Do início dos procedimentos (envolvendo as diretrizes municipais) até o final (quando ocorre o registro no componente Cartório de Imóveis), dificilmente gasta-se menos de 12 meses. E, às vezes, este prazo pode até ser estendido por alguns anos. Embora indignado, o setor formal ligado a essa atividade está, certa de maneira, acostumado com tais entraves burocráticos. Isto pode ser confirmado por meio de uma análise nos números do GRAPHOHAB – Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais , órgão que reúne todas as secretarias de Governo e concessionárias de serviços públicos envolvidas nos trâmites de aprovação de licença para parcelamento do solo no Estado de São Paulo.

De 1998 até hoje, foram emitidos certificados de autorização para 1460 projetos, totalizando mais de 450 mil unidades e área superior a 250 milhões de metros quadrados. Portanto, apesar das dificuldades burocráticas e do tempo consumido para a produção de loteamentos de acordo com a legislação vigente, o setor vem cumprindo o seu papel. Não se pode admitir, porém, a denominação de loteamento para as ocupações clandestinas, sejam elas decorrentes de invasões espontâneas ou fruto da ação criminosa de algumas pessoas mal-intencionadas – às vezes, contando até com a conivência dos proprietários das glebas. Em ambas as situações, ainda que estabelecido o problemas social, o adquirente – que não deixa de ser um invasor – tem sua parcela de responsabilidade. Ou será que ele não está consciente de que seu ato é considerado ilegal?

Também não se justifica atender a demanda habitacional, sobretudo na classe de baixa renda, às custas do comprometimento. Para se ter uma idéia da proporção do problema, basta lembras que, nas bacias do Guarapiranga e da Billings e na região Metropolitana de São Paulo, há 1,6 milhão de pessoas vivendo nestas condições. Está provado que de nada adianta a edição de legislação protecionistas e salvadoras de todas as mazelas neste campo. Mesmo porque, quem as segue é o setor formal que representamos, cumpridor rigoroso dos ritos legais, com endereço certo e sabido, e que tem um nome a zelar. Os loteadores criam não somente o terreno urbanizado, mas também espaços públicos, como ruas, áreas verdes e institucionais. Além de não receber um centavo de financiamento, ainda são obrigados a transferir, gratuitamente, aos municípios ou concessionárias de serviços públicos – agora em processo de privatização – todas as benfeitorias introduzidas nos loteamentos.

O interessante (ou inexplicável) é que, para nós, a fiscalização é rigorosa e implicável, seja por parte do Poder Municipal, da Policia Florestal ou do Ministério Público e demais "fiscais de plantão". Já os invasores – os clandestinos – contam com o beneplácito dessa mesma fiscalização – que faz "vista grossa" – bem como com o perdão do poder público, que anistia as irregularidades e promove a implantação de infra-estrutura às custas do erário público e do equilíbrio do meio ambiente. Aos clandestinos, o perdão! Até quando?

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