.
Autor:
Miguel Ignatios
Qualificação:
Presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB) e do Instituto ADVB de Responsabilidade Social (IRES).
e-mail:
presidê[email protected]
Data:
14/12/01
As opiniões expressas em matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição do Empresário Online. Proibida a reprodução sem a autorização expressa do autor.

O Caminho para a Alca

A rota para o agrobusiness brasileiro ter acesso ao mercado mais cobiçado do planeta complicou-se bastante após a aprovação do fast track (autorização do Congresso americano para que o presidente Bush negocie acordos comerciais, que, depois, só poderão ser aprovados ou rejeitados pelos congressistas, mas não emendados). É que para aprová-lo – e ainda assim por apenas um voto de vantagem – todos os lobbies dos produtores agrícolas e siderúrgicos locais tiveram de ser atendidos.

Em outras palavras, tudo o que interessa ao Brasil (suco de laranja, açúcar, café, cacau, frango, carnes bovina e suína, aços, calçados e têxteis, dentre outros produtos) incluir na agenda de negociação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca) está fora do poder concedido ao presidente americano.

O primeiro a dar o alerta foi o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, para quem, os deputados americanos disseram não à Alca. Depois, foi a vez do embaixador brasileiro nos Estados Unidos, Rubens Barbosa, reconhecer as dificuldades. Até mesmo o presidente Fernando Henrique Cardoso teve de admitir que o caminho para a Alca ficou bem mais difícil.

As esperanças brasileiras concentram-se agora no Senado americano, que, em janeiro, poderá mudar o texto aprovado pela Câmara. Se não o fizer, as possibilidades de o Brasil vir a participar da Alca, no atual cronograma previsto, são praticamente nulas.

Passados mais de 500 anos da descoberta do caminho para as Índias pelas caravelas portuguesas, o Brasil terá de passar pelo novo "cabo das Tormentas", representado pelo forte protecionismo americano e a dúbia posição da Argentina em relação à Alca, se quiser atender o mercado americano com seus produtos agrícolas e manufaturados.

Essa nova viagem das "caravelas" brasileiras em busca do livre acesso ao mercado americano, para ser bem-sucedida, talvez tenha de contrariar a geografia e fazer escalas intermediárias em portos europeus. E, com certeza, toda a habilidade da diplomacia brasileira será exigida para a implantação da rota comercial entre Brasil, União Européia e Alca.

A agenda de negociações diplomáticas, em 2002, começa cedo: em janeiro, na Suíça, com delegados dos 143 países da Organização Mundial do Comércio (OMC); e estende-se até março, em Monterrey, no México; e no Panamá. Depois disso, em abril, em Buenos Aires, nova rodada de conversações entre Mercosul e União Européia.

Sem tempo nem para respirar, em maio, e, em novembro, diplomatas americanos e brasileiros, representando, respectivamente, 78% e 6% do PIB dos 34 países das Américas e do Caribe, darão início às duas primeiras rodadas de negociações para a implantação da Alca. Uma luta desigual, de Davi contra Golias!

Só há uma maneira de o Brasil fortalecer-se em meio a esse jogo de "xadrez" internacional, a ser disputado simultaneamente nos "tabuleiros" da OMC, da Alca e da União Européia: treinar, desde já, e em caráter permanente, nossos diplomatas e negociadores para a defesa de uma pauta mínima de interesses, estabelecida de comum acordo e com assistência e assessoria de todos os setores empresariais do País. Neste aspecto, vale lembrar a atuação pioneira da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), sob a liderança lúcida e firme de Horácio Lafer Piva, que tem levado adiante uma agenda sobre esse tema bastante carregada e importante.

Estabelecido o diálogo permanente e ágil com o setor produtivo, a diplomacia brasileira terá de manter conversações paralelas com os negociadores da União Européia, precavendo-se contra eventuais malogros e até mesmo sabotagens nos entendimentos futuros no âmbito do Mercosul.

Esta é, hoje, a única estratégia para o Brasil aumentar o seu cacife político diante dos Estados Unidos com vistas à formação da Alca. O Itamaraty terá de mirar-se no exemplo do México, que aderiu ao Nafta e, em seguida, fez um amplo acordo comercial, com concessões mútuas, com a União Européia. No caso brasileiro, as prioridades terão de ser invertidas: primeiro o acordo com os europeus e depois com a Alca.

Se nada disso der certo, só restará ao presidente Fernando Henrique Cardoso retardar a adesão do País à Alca. Nesse sentido, já existe, na Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul, proposta do senador Saturnino Braga (PSB-RJ) que prevê a realização de um plebiscito para decidir sobre o adiamento, por 20 anos, da entrada do Brasil no bloco.


.

© 1996/2002 - Hífen Comunicação Ltda.
Todos os Direitos Reservados.