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Autor:
Roberto Adami Tranjan
Qualificação:
Diretor da CEMPRE - Conhecimento & Educação Empresarial e autor do livro "Não Durma no Ponto - o que você precisa saber para chegar lá" pela Editora Gente
E-mail:
[email protected]
Data:
18/02/00
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Sabedoria Popular

Já dizia, nem me lembro quem, que o povo sabe das coisas. Grande verdade e como tem verdade na sabedoria popular. Recolhi alguns ditos populares de domínio público para "filosofarmos" um pouco sobre as coisas nas empresas. Afinal, as empresas tem sido gerenciadas com muita técnica mas com pouca sabedoria. Que tal recorrermos à sabedoria que emana do povo? Vamos lá:

Passarinho que engorda na gaiola voa baixo

O dito popular acima pode também ser aplicado ao caso de gerentes que insistem em buscar solução para os problemas da empresa em seu ambiente interno. Colocou na cabeça que o lucro é a diferença entre a receita e a despesa e, portanto, não consegue fazer mais nada que não seja manipular estas duas variáveis.

A variável "receita" depende de outras duas: o preço e o volume. Na dificuldade em aumentar preços, tenta ações que aumentem o volume, quase sempre na linha de "empurrar o produto para o mercado na base da força". Muitas vezes é preciso mexer na variável "despesa" para que isso aconteça tais como: prêmios para vendedores, descontos, bônus para os clientes etc.

Compenetrado com o ambiente interno da empresa, o gerente que busca o tempo todo a redução dos custos e das despesas assemelha-se ao passarinho que engorda na gaiola. A ação mais tradicional é a redução das despesas sem a redução dos processos. Pessoas são excluídas, mas o trabalho não é excluído. O resultado final quase sempre são menos pessoas fazendo mais trabalho. A redução das despesas em muitas vezes não compensa a perda de qualidade e produtividade na empresa e o estresse nas vidas dos que ficam.

Nessa de reduzir despesas, nem sempre a tesoura funciona no melhor sentido. Muitas vezes são eliminadas as despesas com o "negócio" e são mantidas as despesas com a "empresa". Apenas para elucidar: as despesas com o negócio existem para satisfazer o cliente; as despesas com a empresa existem para satisfazer as pessoas da empresa.

A busca obstinada pela produtividade pode ser também uma insistência em buscar o resultado no ambiente interno da empresa, através da redução de despesas com matérias-primas, das quebras, dos set-up’s, dos tempos de máquinas e dos operários etc. Mais uma vez, prevalece a visão interna de resultado.

O gerente da Era do Conhecimento é aquele que reconhece que o lucro é o dinheiro que está no bolso do cliente e que este só irá liberá-lo se houver indícios de que ficará muito satisfeito. Não existe no ambiente interno informações do que faz um cliente satisfeito. Todas essas informações estão fora da empresa, no mercado, na cabeça e no coração do próprio cliente. É aí que o gerente deve estar.

O gerente da Era do Conhecimento é um "gerente cenarista", ou seja, que aprendeu a fazer leitura de ambientes e aprendeu a construir cenários. Com isso, fez uma opção importante na sua vida: trocou problemas por soluções; ameaças por oportunidades; sentimentos derrotistas por sentimentos otimistas; desespero por fé. Em outras palavras: aprendeu a voar alto.

Jabuti quando tem pressa, aprende a voar

É possível que muitos diretores e donos de empresa não acreditem ou não consigam ver seus gerentes menos burocratas e mais empreendedores. "Construir cenários? Mas como se ele nem sabe lidar com o seu departamento?" Esta seria uma indignação provável. É claro que se não mudar a relação de trabalho, o gerente continuará fazendo todos os dias as mesmas coisas e do mesmo jeito. Em sendo assim, não há como obter resultados diferentes. Para que o gerente obtenha resultados diferentes, é preciso que ele rompa com o seu círculo vicioso de trabalho. Para isso, é preciso tirá-lo de sua "zona de conforto" e colocá-lo em uma "zona de risco". Em outras palavras: é preciso rever o "contrato psicológico" de trabalho.

O contrato de trabalho tradicional é aquele do tipo "patriarcal", ou seja, define quem manda, quem pode e quem não pode, quais são as normas e as regras do jogo. Quase sempre o gerente é contratado para fazer o que precisa ser feito e não necessariamente para produzir resultados. Quase sempre o gerente é contratado para resolver problemas em vez de buscar oportunidades. Quase sempre o gerente é pago para fazer a moçada trabalhar direito e não para formar equipe. Quase sempre o gerente é pago mais para controlar do que para planejar mudanças. E aí dá no que dá! Um gerente que, depois de um tempo, é mais um problema do que uma solução. É possível que não haja nada de errado com ele e com suas potencialidades; o erro está no "contrato psicológico" estabelecido pela empresa. Por que não rever o contrato?

O contrato de trabalho empreendedor é aquele que, de alguma maneira, sinaliza para o gerente que ele pode e que a fonte do conhecimento e do controle está dentro dele. É ele que precisa buscar novos conhecimentos para realizar melhor o seu trabalho. É ele que precisa identificar seus pontos fortes e fracos e buscar recursos, geralmente de conhecimentos, para transformar-se em um gerente mais eficaz. É ele que precisa compreender uma empresa de forma sistêmica para aprender o que de fato faz resultado na empresa e que resultado não é apenas o lucro mas é também clientes e funcionários satisfeitos.

Esse gerente empreendedor é típico da Era do Conhecimento e sua remuneração não poderá ser fixa, característica da Era Industrial. Deverá compartilhar da visão de futuro da empresa e ser remunerado pelos resultados que a empresa foi capaz de gerar. Deverá adquirir a velocidade necessária para sobreviver e prosperar na Era do Conhecimento. Não desanime com o seu gerente. Lembre do dito popular acima e acrescente um outro: em tempo de guerra, urubu é perdiz.

Sapo não pula por boniteza, mas porém por precisão

Não é preciso pensar muito para perceber que a década de 80 em nada se parece com a década de 90. Mais que isso: não é preciso ser um bom leitor de ambientes para perceber que a primeira metade da década de 90 em nada se parece com a segunda metade da década de 90. Apenas para ser mais rigoroso: o ano de 1998 foi igual ao de 1999 para a sua empresa? Você acredita mesmo que conseguirá trabalhar do mesmo jeito nos anos 2000, 2001, 2002, etc.? É claro que não! O novo mundo tem apenas 10 anos: começou quando a queda do Muro de Berlim foi trocada pelas letras www.

Essa mudança não é de pouca monta. Implica um novo jogo com novas regras. É possível que a sua empresa, que não está parada no tempo, esteja em busca de maior produtividade em seus processos e maior qualidade em seus produtos. Acontece que isso pode significar apenas correr melhor na pista errada. Esse é o ponto: a pista é outra e os critérios de produtividade e qualidade também são outros.

É claro que não dá mais para comprar, produzir, estocar, vender, receber, pagar, etc. do mesmo jeito. A tradicional firma econômica está com os seus dias contados. Veremos, a cada novo ano, uma enxurrada de firmas econômicas em dois movimentos: a maior parte desocupando espaço no mercado e uma pequena parte tentando transformar-se em uma empresa progressista. A empresa progressista é aquela que compreendeu que o jogo é outro, bem como as suas regras. Transformar firma econômica em empresa progressista é tarefa para os determinados que possuem fé no futuro. E que gostam de grandes desafios já que...

Não há pesqueiro bom sem mosquito borrachudo

As lideranças que querem transformar suas firmas econômicas em empresas progressistas sabem que essa mudança não é tão simples como aquelas aclamadas nas décadas de 80 e 90. Essa exigirá muito mais do que mudanças nos processos, apenas. Os desafios das décadas de 80 e 90 foram resolvidos por meio dos programas de qualidade que visavam a melhora dos processos e dos produtos, por meio das terceirizações que previam uma economia nos processos, através das novas tecnologias de fabricação japonesas, que almejavam maior economia e produtividade, por meio da automação fabril e da informatização administrativa, sempre voltadas à melhoria dos processos. A afirmação-chave é a seguinte: o problema não está mais tanto no processo; o problema está nos "modelos mentais" de quem lidera empresas.

Se o jogo mudou e também as suas regras, não dá mais para disputar o campeonato com os mesmos conhecimentos e habilidades. Um novo jogo implica novas habilidades; novas regras implicam novos conhecimentos. É muito difícil aproveitar os conhecimentos e habilidades do jogo de boliche se o novo jogo é o xadrez. É assim com as empresas: é muito difícil aproveitar as práticas da Era Industrial para a realidade da Era do Conhecimento. São outros os padrões e o principal obstáculo está em se livrar do modelo mental da Era Industrial e trocá-lo pelo modelo mental da Era do Conhecimento.

O maior desafio desta vez não está nos processos. É claro que os processos precisam ser mudados e, otimizá-los apenas, como ocorreu em demasia na Era Industrial, é muito pouco. Os processos precisam ser transformados, assim como o jeito de gerenciar e o modo de lidar com o cliente. Antes disso significar um novo conjunto de conhecimentos e habilidades, implica um novo jeito de perceber essa nova realidade. É este o desafio da mudança do modelo mental. A mudança do modelo mental não se dá apenas pela compreensão do que está acontecendo. Exige um processo de educação e reeducação. Como ficam as pequenas e médias empresas diante dessa nova realidade?

Deus não deu asa à cobra, mas ensinou o bote

A Era do Conhecimento é a libertação das pequenas e médias empresas. Nesse novo jogo, a idéia vale mais do que a máquina, a equipe vale mais do que o produto, a visão compartilhada vale mais do que a norma e o controle. A pequena e média empresa está muito mais preparada para criar em equipe do que a grande empresa. E existe um fato novo: a informação está tão disponível para a pequena e média empresa como está para a grande empresa.

A Internet é um recurso que pode ser utilizado tanto pela grande empresa como pela pequena e média. Isso é um fato histórico novo. O comércio eletrônico crescerá em uma velocidade exponencial nos próximos anos e dará espaço para todos os tipos de empresas. Se a imaginação é um componente fundamental para o sucesso futuro, esta já existe há bom tempo e em abundância na pequena e média empresa, enquanto nas grandes empresas, é mercadoria escassa, uma vez que não se dá bem com a burocracia.

A Era do Conhecimento é a hora e a vez da pequena e média empresa que saberá transformar-se em progressista para os líderes que querem ser mais e para todos aqueles que não querem dormir no ponto!


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