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Autor:
C.K. Prahalad
Qualificação:
Professor de administração de empresas da University of Michigan, EUA.
E-Mail
[email protected]
Data:
21/08/02
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Quatro Bilhões de Pobres Prometem Crescimento e Lucro a Multinacionais.

A prática de um capitalismo inclusivo permitirá as multis o acesso a um mercado de trilhões de dólares e, à população acesso aos benefícios da economia global.

As multinacionais precisam reconhecer que a base da pirâmide socioeconômica é um território inexplorado de lucros crescentes e que para poder participar desse mercado devem superar o desafio de combinar baixo custo, boa qualidade, sustentabilidade e rentabilidade. Isto não só lhes daria acesso a crescimento e lucro, mais também permitira que bilhões de pessoas saíam da miséria e do desespero, evitando a desintegração social, o caos político o terrorismo e a decadência ambiental que certamente advirão se o fosso entre ricos e pobres continuar a crescer.
O principio norteador destas empresas deve ser produzir e não extrair riquezas dos países onde atuam. Em primeiro lugar deve-se disponibilizar crédito financeiro e aumentar o potencial de ganho dos pobres. Bancos como o Grameen de Bangladesh, India, provam que pode ser feito. O banco foi o pioneiro na concessão de crédito para as populações carentes.

O banco projetou um programa para resolver os problemas de concessão de crédito a clientes do mais baixo nível de renda –pessoas de alto risco, que não oferecem garantias com empréstimos que seguem à risca as regras contratuais. Para isto o banco ideou um mecanismo prático, e inovador para avaliar em profundidade esses candidatos que não tem mais patrimônio do que seu nome: o candidato tem que ter o apoio de cinco membros da comunidade que não sejam parentes e o pessoal de vendas os visita travando conhecimento das pessoas e do andamento de seus projetos. A partir de 1996 o Grameen tem um índice de pagamento de 95%. Atualmente, atende 25 milhões de clientes em todo o mundo, tanto em países em desenvolvimento como nos desenvolvidos incluindo Estados Unidos e Grã Bretanha.

O segundo passo deve ser o aproveitamento do terreno propício para inovações. As inovações sustentáveis de produtos iniciados na base da pirâmide do mercado, promovidos para os demais consumidores tem impacto positivo também nos degraus mais altos da pirâmide. A HLL, subsidiária da Unilever na Índia, atacou o problema de falta de refrigeração e o reduzido consumo de energia naquele país desenvolvendo uma técnica que permite transportar sorvete em caminhões não refrigerados. O sistema que reduz o uso da eletricidade e torna desnecessário o uso de refrigerantes poluentes ou perigosos tem uma vantagem extra, é mais barato.

O terceiro passo é melhorar o acesso dos mais pobres a informação. É fundamental disponibilizar os sistemas de distribuição e comunicação para que se possa desenvolver a base da pirâmide. A Arvind Mills é a quinta maior fabricante de brim no mundo. Ela lançou um sistema de distribuição de jeans totalmente novo. O Ruf & Tuf é um kit com todos os componentes necessários para fabricar um jean que passou a ser distribuído por uma rede de milhares de pequenos alfaiates que tinham todo o interesse e motivação para expandir a venda. Como resultado o Ruf & Tuf são os jeans mais vendidos na Índia, ultrapassando de longe a Levi’s e outras marcas.

As multinacionais também podem desempenhar o papel de distribuir os produtos das empresas da base da pirâmide. Por meio de parcerias é possível alavancar as bases de conhecimento tradicionais para produzir mercadorias sustentáveis e em muitos casos superiores para clientes do topo. E as telecomunicações tem um papel determinante neste aspecto. Onde há telefones e conexões de Internet é possível imaginar um único mercado interconectado unindo ricos e pobres na busca de um desenvolvimento econômico sustentável.

Por último as multinacionais têm de combinar tecnologia de ponta com una profunda percepção sobre a localidade. É preciso fomentar mercados e culturas locais, promover soluções locais. Para as multinacionais a melhor abordagem é aliar a capacitação local e conhecimentos sobre o mercado às melhores práticas mundiais. De qualquer maneira os novos modelos de negócios não podem romper com a cultura e com o estilo de vida dos habitantes locais.

Porém, as grandes empresas são apenas um dos atores, as multinacionais têm de trabalhar com as ONGs, com governos locais e estatuais e com as comunidades.

No entanto alguém precisa tomar a liderança a pergunta é por que as multinacionais?

Há varios motivos fortes como sua capacidade de desenvolver e distribuir produtos e serviços sustentáveis é superior muitas vezes à dos empresários locais. Elas podem transferir conhecimentos de um mercado para outro - da China para o Brasil ou a Índia - como já demonstraram empresas como a Avon, a Unilever, o Citigroup e tantas outras.

As Multinacionais podem ser pontos de partida para construção de infra-estrutura comercial, e fornecimento de acesso a informações, idéias gerenciais e recursos financeiros. Sem elas ONGs bem-intencionadas, comunidades, governos locais, empreendedores ou órgãos de desenvolvimento multilateral continuarão a patinar em suas tentativas de promover o fotalecimento da pirâmide.

Chega a ser trágico que os capitalistas ocidentais tenham partido do princípio de que os ricos serão servidos pelo setor corporativo, enquanto os governos e as ONGs protegerão os pobres e o ambiente. Essa divisão implícita é mais forte do que a maioria das pessoas pode perceber. Surge uma grande oportunidade de romper esse código. As empresas privadas que se dedicarem à prática de um capitalismo mais inclusivo terão a posibilidade de prosperar e de levar tal prosperidade a bilhões de pessoas.

Explorar a fortuna que existe na base da pirâmide representa o mais elevado dos nossos objetivos.

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