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Autor:
Severino Carvalho Filho
Qualificação:
Vice-Presidente Fetrabalho/Ba
E-Mail
[email protected]
Data:
22/02/03
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Trabalho Associado Remunerado Realização e Cidadania

A vivência, experiência e participação na vida diária do Cooperativismo de Trabalho brasileiro, ensinam e asseguram que, atualmente, a maioria dos trabalhadores só procuram constituir um empreendimento cooperativista, ou se associam a uma cooperativa de trabalho em operação, quando se acham alijados do sistema trabalhista celetista.

Poucos são os que por ideologia, e/ou espírito de empreendedorismo, e/ou desmotivação e decepção com o trabalho remunerado celetista, se aventuram a criar, manter e crescer uma Cooperativa de Trabalho, visto que um grande número de empreendedores gosta de ser dono sozinho, ou no máximo compartilhar com um ou dois outros na sua empresa mercantil. Esses empreendedores gostam de correr riscos e obter resultados sozinhos ou com alguns poucos.
O espírito de colaboração, cooperação, soma e divisão, ilumina e insufla muito poucos, ainda, em nosso Brasil.

País onde o(a) adolescente ouve dos pais e professores, conselhos para que cresça e adquira riquezas como profissional indivíduo, quase nunca como profissional comunitário.
Essa cultura tem que ser radicalmente modificada. E é isso que o Sistema Cooperativista Brasileiro está fazendo.

A mudança dessa cultura individualista e até egoísta será o pilar principal que tirará o cooperativismo de trabalho da incômoda opção de lugar para o trabalhador que não é aceito pelo sistema celetista e não pode ser empreendedor mercantil, ou por falta de capital ou de vocação, e por isso se sentir um excluído.

Em contatos com cooperativas de trabalho da Bahia, vivi e vivo essa experiência e sentimento, dos trabalhadores, de criar e fazer parte de um empreendimento econômico-sócio-educativo que só nasce por que os trabalhadores se encontram alijados das organizações que remuneram pelo sistema celetista, que pouco cobra produção, resultados, satisfação no trabalho e ainda "dá" benefícios, embora forçados pela lei(apesar de que muitos empresários "dão nó" nas leis de benefícios).

Ainda hoje os trabalhadores celetistas, na sua maioria, não querem saber se a empresa tem bons resultados financeiros, se eles trabalham o que deveriam e se seus resultados agregam valor à empresa. Eles querem receber o salário contratado, no final do mês, e todos os benefícios que a lei lhes proporciona.

Essas visões e atitudes de empresários e trabalhadores, embora desfocadas em relação ao desenvolvimento e progresso do país, ainda são um grande motivo que empurra a multidão de trabalhadores para o sistema celetista.

A não concordância com essas visões e atitudes leva muito poucos, além dos que se consideram excluídos, para se integrarem ao sistema de trabalho associado remunerado, das cooperativas de trabalho, que é calcado nos bons resultados financeiros de cada trabalhador, no trabalho que deve ser realizado com a qualidade e no prazo contratados e nas ações, de cada cooperado, que agregam valor aos clientes e à cooperativa .

Se perguntarmos, hoje, aos que se consideram excluídos se eles gostariam de fazer parte, novamente, do sistema celetista, nove em cada dez dirão que sim. E aí está uma das causas do insucesso das cooperativas.

Uma outra causa do insucesso das cooperativas é o individualismo exacerbado que se reflete na infidelidade de alguns cooperado, ao vender seus serviços por fora da sua cooperativa, ou na omissão na participação da vida associativa e na gestão da cooperativa, prejudicando a toda equipe de associados.

E o que causa mais prejuízo a todo sistema cooperativista de trabalho e aos trabalhadores "associados" são as atitudes e ações de "empreendedores" que criam "cooperativas de trabalho" para seu enriquecimento pessoal e exploração dos trabalhadores. Verdadeiras senzalas modernas e armadilhas para incautos.
Para com esses "empreendedores" o Ministério do Trabalho e Emprego - MTr e o Ministério Público do Trabalho - MPT precisam ser incisivos e usar toda força, vigor e munição que possuem para eliminar esse abuso e tirar do mercado esses pseudo "empresários".

Entretanto, se a cooperativa for fechada quem irá ajudar aos trabalhadores espoliados a voltar a pertencer a um sistema de trabalho remunerado ? O MTr? O MPT? Os sindicatos? As cooperativas de trabalho legais e corretas?

Para mudarmos todas essas atitudes incorretas e danosas à sociedade, e outras mais que também prejudicam o trabalho associado, precisamos mudar a cultura atual dos trabalhadores através de uma Educação para um ótimo relacionamento em equipe, em associação e em comunidade. Que o individual seja igual ao coletivo.

Há uma pergunta ansiosa por uma boa resposta: Ser excluído do sistema remunerado celetista e ser parte do sistema de trabalho associado remunerado é nefasto para o trabalhador? Torna-o um "sub-raça" na sociedade?

O que tenho visto em muitas cooperativas corretas da Bahia me levam a acreditar que a resposta é NÃO.

No principio, uma pessoa é estimulada e encontra motivos para participar de uma Cooperativa de Trabalho quando idealiza, compreende e acredita, que seu lugar no mercado de trabalho é conquistado realizando serviços como profissional autônomo, e para clientes que lhe agradam como parceiros; que há grande probabilidade de ser melhor remunerado trabalhando da forma acima.
No primeiro instante, a grande maioria dos profissionais só se sentem estimulados a fazer parte de uma cooperativa de trabalho dando esses dois primeiros passos.

É a sua sobrevivência física.
Aqui as atitudes de sócio e participante da cooperativa estão na primeira infância, com baixos resultados práticos e muita vontade de acertar. Alguns poucos, conscientes e capacitados, cooperados "tocam" o empreendimento econômica e socialmente.

Quando o profissional melhora a sua análise do mercado de trabalho ele age para se atualizar constantemente e crê que só a capacitação técnica-administrativa o manterá competitivo e o fará crescer como profissional e pessoa; crê que sempre haverão competências, conhecimentos e habilidades, sejam técnicas, e ou operacionais, e ou administrativas e ou gerenciais, essenciais para ele continuar no mercado, com remunerações que considera justas, e no entanto, sabe que não as dominará, integralmente, no tempo e local em que necessitar.


É a sua manutenção no Mercado comprador - pagador.
Nesta fase há um bom número de cooperados qualificados para a gestão da cooperativa. Entretanto, o espírito de colaboração e cooperação poderá ser um adolescente em formação. A participação na vida da cooperativa poderá não ser a esperada. Se desde a primeira fase a cooperativa não incrementar uma educação cooperativista (filosofia / doutrina / princípios / valores / vivência) continuada, ela poderá ser uma boa empresa e uma cooperativa muito fraca com tendência à extinção.

Somente quando os cooperados compreenderem e internalizarem que precisam dessa associação, da cooperação com outras pessoas com competências, conhecimentos e habilidades, complementares as suas e com essas pessoas deverão somar e dividir esses recursos, além de investir dinheiro e tempo para o sucesso individual e do grupo(equipe), acreditarão que sua Qualidade de Vida (financeira / social / cultural / status) melhorará substancialmente se trabalharem em EQUIPE, se participarem ativamente de uma Cooperativa de Trabalho e vivenciarem os Princípios (Adesão voluntária e livre à cooperativa, de cada participante / Participação econômica de todos / Gestão democrática e livre / Autonomia e independência da cooperativa / Educação, formação e informação para todos / Intercooperação entre cooperativas / Interesse pela comunidade) e os Valores (Solidariedade / Equidade / Igualdade / Responsabilidade / Ajuda mútua / Democracia) do Sistema Cooperativista.
Esta é a fase da Cooperativa Plena e dos trabalhadores associados Realizados e Satisfeitos.

Quem é Pleno, Realizado e Satisfeito não é, nem poderá ser, excluído ou "sub-raça".

É isto que deve ser ensinado, e repetido quantas vezes forem necessárias, a todos os trabalhadores que desejarem participar, ou que já estão, e precisam do sistema de trabalho associado remunerado.

Esse sistema não exclui o trabalhador da sociedade e lhe confere os instrumentos básicos para que ele exerça sua cidadania brasileira.

As empresas mercantis devem explicitar, em seus meios de propaganda, com orgulho, que contratam cooperativas de trabalho legais e corretas; que contribuem para a melhoria da qualidade de vida de trabalhadores associados e que resgatam a cidadania desses brasileiros.

Os órgãos institucionais públicos de fiscalização e correção, como o MTr e MPT, devem dirigir seus esforços, tempo e recursos para orientar e educar as cooperativas de trabalho legais e corretas, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida de trabalhadores associados e facilitando o resgate da cidadania desses brasileiros.

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