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Autor:
Romeu Chap Chap e Paulo André Jorge Germanos
Qualificação:
Presidente do Secovi-SP – O Sindicato da Habitação, e Paulo André Jorge Germanos, diretor conselheiro
E-mail:
[email protected]
Data:
23/05/02
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O Que a População Deve Saber Sobre o Plano Diretor

Na discussão do novo Plano Diretor, que substituirá o de 1988 em vigor até hoje, há o desejo de que São Paulo possa contar com uma lei atualizada e que efetivamente beneficie a população.

A Indústria Imobiliária sente-se no dever de alertar para o perigo de novas idéias equivocadas, trazidas no bojo da proposta da Secretaria de Planejamento do Município de São Paulo.

Todas as alterações da legislação municipal de parcelamento, uso e ocupação do solo urbano, nas últimas quatro décadas, resultaram em brutal encarecimento do terreno edificável. Ao mesmo tempo, novos loteamentos aprovados regularmente desapareceram do mercado formal, enquanto a legislação, muito elitista, restringiu o uso dos terrenos e provocou aumento no custo da moradia. A população de baixa renda e até mesmo a classe média não tiveram outra opção que não o encortiçamento e a favela.

Houve enorme esforço para reduzir o custo de construção, mas este foi anulado pela elevação do custo da fração de terreno e pela altíssima carga tributária que incide sobre a habitação produzida dentro da lei.

Novos instrumentos de parceria entre o Poder Público e a iniciativa privada foram introduzidos por lei e praticados, até serem impedidos por ações judiciais.


As chamadas Operações Interligadas - autorização de uso do solo mais intenso, outorgado por pagamento de contrapartida à cidade para construção de habitação de interesse social - foram sepultadas, apesar de seu resultado efetivo em benefício da população carente.

As Operações Urbanas também foram incompreendidas e estão em descrédito. A Operação Água Espraiada, aprovada no fim de 2001, já é objeto de ação civil pública, com possibilidade de se tornar "natimorta".

Estes instrumentos só foram possíveis porque a atual lei de zoneamento restringe fortemente o uso do solo - expresso pelos coeficientes de aproveitamento - e enseja a venda pela Prefeitura de "terreno virtual" acima do permitido naquela legislação, dentro de limites estabelecidos em lei e que atendem a critérios urbanísticos.

Agora, a Prefeitura pretende rebaixar ainda mais os limites atuais de construção (coeficiente único igual a 1 vez a área do terreno para toda a cidade), para depois vender a quem quiser construir acima desse limite o direito de chegar até 2,5 na maior parte da cidade, ou até 4 nos limites de 11 Operações Urbanas.

Assim, quem puder pagar poderá construir mais, em qualquer lugar da enorme "macrozona", pois a proposta do Plano Diretor só resguarda as Z-1 e as áreas de preservação ambiental. Mas a questão é a seguinte: quem poderá pagar o custo maior decorrente da compra obrigatória do mesmo terreno duas vezes (uma vez do proprietário e outra da Prefeitura)?

A expectativa de que esta "mágica" reduzirá o preço do terreno não se confirmará, pois muito do que se constrói em São Paulo é feito em lotes que tinham casas ou galpões que precisam ser demolidos. Não há lei que force alguém a vender sua casa, se isto não lhe permitir ao menos repor outro imóvel.

A proposta do Plano, que imagina poder baixar o preço de todos os terrenos, tem, na verdade, uma perversa lógica arrecadadora. Entretanto, a experiência mostrou que a arrecadação desejada não acontecerá como se espera.

Por isso é preciso exigir dos planejadores que plantem seus pés na realidade da cidade e do mercado - já tão inacessível para a maioria da população - de forma a tornar a moradia possível para um maior número de famílias.

A manutenção de um zoneamento - revisto, sim, pois a cidade cresceu e evoluiu desde 1972 - é essencial, sempre sob critério urbanístico. Acima dos baixos limites permitidos pelo zoneamento, cabe, onde for do interesse da cidade, vender direitos adicionais, sempre dentro de limites claros. Este mecanismo, hoje abrigado em lei federal - o Estatuto da Cidade (lei 10.257 de 2001) - sob o nome de Outorga Onerosa, trará recursos extra-orçamento para habitação de interesse social, sem representar aumento necessário do preço de terreno, pois não se suprimiu um direito para depois vendê-lo.

O rebaixamento do coeficiente de aproveitamento produziria ainda dois efeitos perversos para a cidade: a perda de arrecadação do IPTU, pela redução de toda a base de cálculo do imposto, e a indução à horizontalização da cidade, pelo desestímulo à construção mais adensada. Somente países muito ricos e sem pressão demográfica podem se dar ao luxo de espalhar a mancha urbana.

Devemos aproveitar as duras lições vividas por São Paulo, de forma benéfica! Acreditamos que novos recursos podem ser obtidos, sem penalizar os compradores de imóveis e mantendo a cidade com um zoneamento atualizado, ditado pelo urbanismo, e não pela sanha de arrecadar mais.

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