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Autor:
Miguel Ignatios
Qualificação:
Presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB) e da Fundação Brasileira de Marketing (FBM).
E-Mail
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Data:
26/05/01
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As Perdas do Apagão

A empresa Brasil descobriu, durante a última reunião de acionistas, convocada para saber se as metas de cada setor estavam sendo alcançadas, que ficara sem controller. Tal ausência não seria grave, nem teria causado grandes perdas, se os objetivos estratégicos da companhia tivessem sido mantidos. É que, para sanear as contas da empresa, abaladas por gastos maiores do que as receitas, a função do controller foi acumulada interinamente pelo diretor de finanças. Resultado: passado o período do ajuste, percebeu-se que as contas haviam sido equilibradas, mas que o setor mais importante - o industrial - fora relegado a segundo plano.

Essa é, resumidamente, a situação do país, às vésperas do início do racionamento de energia elétrica, o qual tem data para começar (junho), mas ninguém sabe ao certo quando irá terminar. Ou seja, faltando um ano e meio para o final do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, o setor mais dinâmico da economia brasileira, o industrial, terá de conviver com a falta de energia elétrica, um insumo de produção essencial e estratégico. Em outras palavras, o governo federal, que elegeu outras prioridades neste ano, poderá ser derrotado nas urnas, em 2002, pela economia, cuja expansão será bruscamente freada pela escassez de energia. Esse grave equívoco nos leva a lembrar o papel destinado ao Brasil no mundo globalizado, qual seja o de um país emergente com excelente parque e vocação industriais e disposto a adquirir tecnologia de ponta nos setores ainda defasados em relação às nações mais avançadas. É isso que a globalização espera dele e é também o que todos os brasileiros anseiam. Desviar-se disso é confundir tática com estratégia ou em linguagem mais simples não saber distinguir os objetivos permanentes dos temporários. Explico melhor: o objetivo tático e temporário do país ao longo dos últimos anos foi o ajuste fiscal, acertado com o FMI; mas o objetivo estratégico e permanente, de colocar o Brasil no 1º Mundo, o mais rápido possível, não poderia ter sido abandonado como foi.

Discutir, daqui para frente, a quem cabe a culpa por tal equívoco (aos ex-ministros do setor, todos eles do PFL e ligados ao senador Antônio Carlos Magalhães; à equipe do ministro Pedro Malan, à alta cúpula tucana, incluído o presidente FHC; ou se à incúria da burocracia oficial, incapaz de manter sob controle a execução de várias metas ao mesmo tempo) é tarefa inútil. O melhor que se tem a fazer é administrar de forma competente o racionamento e começar a tomar já as medidas necessárias para evitar que ele venha a se repetir nos próximos anos. Para tanto, avaliem-se os projetos mais viáveis em termos econômicos e de menor impacto sobre o meio ambiente, pressione-se o BNDES para liberar recursos e o FMI para que reveja a proibição de as estatais do setor elétrico fazerem investimentos. Se for o caso, que se repense o modelo da privatização do setor elétrico.

Fingir que tudo ficará bem assim que surgirem as primeiras piadas sobre os apagões não vai solucionar os problemas, nem diminuir os prejuízos. Pesquisa divulgada pela consultoria Pricewaterhouse Coopers, em Buenos Aires, na abertura da Cúpula Econômica do Mercosul, em meados de maio, nos dá uma idéia do que o país já perdeu: US$ 40 bilhões em investimentos diretos estrangeiros, devido ao que ela chama de "índice de opacidade", ou falta de transparência, em cinco itens: nível perceptível de corrupção, sistema legal complicado, política econômica oficial, práticas contábeis e regime de regulação. A estimativa dessas perdas não leva ainda em consideração o impacto da falta de energia.


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