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Autor:
Romeu Chap Chap
Qualificação:
Presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de São Paulo (Secovi-SP) e da Romeu Chap Chap Desenvolvimento e Consultoria Imobiliária S/C Ltda.
E-mail:
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Data:
26/08/03
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Por um New Deal Verde-Amarelo

Quando a construção vai bem, tudo vai bem num país, sentenciou o general e ex-presidente da França Charles de Gaulle, não por acaso um dos principais estadistas do pós-guerra.

Não são palavras vazias, razão pala qual as utilizo recorrentemente. Estão comprovadas na história de vários países, inclusive os Estados Unidos, que enfrentou a grande depressão depois do crash da Bolsa, em 1929, com investimentos em obras públicas e agricultura o denominado New Deal‰ de Franklin Delano Roosevelt. Fala-se até mesmo que buracos fechados durante o dia eram reabertos à noite, a fim de ocupar mão-de-obra.

Chegou a hora de o Brasil promover seu New Deal verde-amarelo. É isso o que agora pede o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), ao defender um grande acordo tripartite entre governo, empresários e trabalhadores, sem o que não se verá tão cedo o espetáculo do crescimento que tanto desejamos.

O CDES indica a necessidade de fortes investimentos públicos na área de habitação, setor apontado pelo presidente Lula como prioritário (a redução do déficit de moradias foi por ele definida como questão de honra). Soma-se a essas manifestações o que disse recentemente o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, ao afirmar que „o governo tem de buscar políticas que incentivem o crescimento da economia, a geração de emprego, investimentos na área de saneamento e habitação.

Não resta dúvida de que todo mundo concorda que o setor capaz de responder mais rapidamente às necessidades do País é o da construção. Diante disso, fica a questão: por que isso não acontece? Onde está o gargalo que impede uma ação efetiva neste campo, haja vista que existem recursos para iniciar esse ciclo virtuoso?

Possuo uma percepção muito particular sobre as razões dessas amarras ao desenvolvimento. Primeiro, há o acordo com o FMI. Temos de rezar a cartilha, cumprir as metas de inflação custe o que custar, razão pela qual não se poderia estimular a indústria da construção.

Isso se tornou patente quando, em minhas andanças por Brasília, há alguns anos, mostrei o poder multiplicador de nosso setor. As autoridades consideraram que dinamizar a construção gera muito emprego, renda, consumo e este, na visão de correntes de economistas, pode realimentar a inflação. Ou seja, um tiro no coração da mencionada cartilha.

De lá para cá, não houve qualquer incentivo à habitação. Pelo contrário. Criaram-se inúmeras dificuldades, as quais se vêm agravando, como se vê na absurda escassez de recursos para o financiamento da produção e aquisição de imóveis.

O recente anúncio de R$ 5,3 bilhões para moradia foi recebido calorosamente pelo setor produtivo. Porém, o nível de exigências para a concessão de créditos pela Caixa Econômica Federal dificulta muito as operações destinadas à produção de imóveis.

Enquanto isso, os agentes financeiros privados revelam inapetência cada vez maior em relação ao crédito imobiliário, apesar de, por lei, terem não só de aplicar os recursos das cadernetas de poupança, como cumprir resolução do Conselho Monetário Nacional que determina a reposição de mais de R$ 30 bilhões, os quais ficaram represados por conta das contas do Proer, envolvendo dívidas do Tesouro referentes ao extinto Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS). Ressalve-se a Nossa Caixa de São Paulo, que a partir de agosto volta à área habitacional por meio de linha de R$ 100 milhões com recursos do FGTS.

Temos, ainda e para citar apenas alguns pontos -, uma insegurança jurídica generalizada envolvendo os contratos, e aí não só os do mercado imobiliário. A aprovação de um empreendimento imobiliário segue intenso trâmite (prefeitura, cartório de imóveis e outros órgãos que zelam pelo meio ambiente, trânsito, dentre outros), processo que demanda tempo, recursos humanos e financeiros. Acontece que, vez por outra, nosso setor sofre interferências por exemplo, embargos do Ministério Público pelas mais diversas causas, como a incompatibilidade de legislações ambientais federal, estadual e municipal. Essas interferências geram enorme prejuízo, cuja dimensão nem sempre é avaliada pela autoridade responsável. Isso inibe o investimento, amedronta o comprador e apavora o empreendedor.

O governo Lula tem todas as chances de fazer nosso New Deal tupiniquim. Tem a legitimidade e o respaldo da população. Tem os instrumentos e mesmo os recursos para iniciar a alavancagem do crescimento econômico por meio do investimento na produção de moradias

Precisamos que o arcabouço legal que rege nosso sistema financeiro habitacional seja respeitado, aplicado e aprimorado. Que dele se afastem as ameaças, como o direcionamento de recursos do FGTS para finalidades outras que não moradia e saneamento básico. Necessitamos, por fim, do que faltava: a vontade política.

Lembre-se que o macrossetor da construção, responsável por quase 20% do PIB, pode gerar muito mais do que os atuais 9 milhões de empregos. Isso acontecerá facilmente se arregaçarmos as mangas e, com coragem, iniciarmos a redução do déficit de 6,6 milhões de moradias.

Em maio deste ano, cheguei a propor publicamente que o CDES também se dedicasse à discussão da política habitacional. A hora é agora. Em tempo de que propostas sejam incorporadas ao pacote de crescimento que, segundo o ministro Tarso Genro, será anunciado daqui a 45 dias, a contar do final de julho. Vamos agir, para que não caiam no vazio tantas palavras.

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