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Autor:
Alfried Karl Plöger
Qualificação:
Presidente da Abigraf Regional São Paulo e da Associação Brasileira de Companhias Abertas (Abrasca).
E-mail:
[email protected]
Data:
28/06/03
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Possibilidades do Brasil no Cenário Pós-Guerra

O excelente resultado da balança comercial em março e a indicação de que a regulamentação do sistema financeiro vai deslanchar, com a votação no Congresso da emenda constitucional relativa ao artigo 192 da Carta, semearam boa dose de otimismo no mercado neste início de abril. Às boas notícias soma-se outro fato, de menor repercussão, mas significativo como potencial indutor de crescimento da economia nacional: favorecidos pelo fraco desempenho das ações e pelo baixo rendimento dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos, os fundos de títulos da dívida dos países emergentes, dentre eles o Brasil, já receberam mais dinheiro em 2003 do que durante todo o ano passado.

Este é um sintoma muito claro de que a credibilidade no Brasil está realmente em alta e que os investimentos estrangeiros podem voltar a se concentrar no País. Os norte-americanos começam a sentir, no mercado interno e no internacional, o peso da guerra com o Iraque. Por mais que os interesses dos negócios possam ser considerados acima do bem e do mal nesta era de intensa competitividade, soma-se à retração natural da economia de um país beligerante o ceticismo provocado pelo desrespeito às deliberações da ONU e à deflagração de um conflito violento, à revelia do desejo de paz da maioria das Nações.

Neste cenário, é indiscutível que a política internacional — obviamente com repercussão na economia — passará por sensíveis transformações. Os europeus, com exceção da Inglaterra (que, aliás, já não adotara o Euro como moeda), Espanha e Portugal, colocaram-se frontalmente contra a invasão do Iraque e, com muita clareza, aparecem como a alternativa natural de mercado a concorrer com a economia dos Estados Unidos. Quanto mais a guerra durar, mais forte estará a posição política e econômica da União Européia no concerto das nações. Em paralelo, a China também se consolida de forma definitiva como mercado.

A guerra torna mais evidente e acelera um processo de mudanças que já vinha se delineando no eixo econômico internacional. Os países emergentes, que paulatinamente buscavam reduzir a dependência de uma única nação e/ou bloco, tratam agora de trabalhar de forma mais clara nessa direção, por meio de um grande esforço na diplomacia econômica. Aqui, cabe abrir parêntese: pena ter fracassado a recente tentativa de avanço na questão dos subsídios agrícolas, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). A queda dos subsídios seria determinante para as nações emergentes, grandes exportadoras de commodities. Curiosamente, o retrocesso no diálogo partiu de um dos países envolvidos na guerra com o Iraque — a Austrália —, que bateu de frente com quem? União Européia...

Fechado o parêntese, voltemos à questão relativa ao novo mapa político-econômico mundial pós-guerra no Iraque, sob o foco de interesses da economia brasileira. Certamente, o Brasil não estará se afastando da economia norte-americana, que continua sendo partner de grande importância. A Alca — mesmo que seu cronograma atrase em função da guerra e dos eventuais temores quanto à falta de limites no exercício prático da Doutrina Bush — deverá ser implantada. Porém, o intercâmbio econômico entre Brasil e União Européia, incluindo uma futura área de livre comércio entre esse bloco e o Mercosul, é alternativa cada vez mais acalentada.

Curiosamente, dois estudos divulgados no segundo semestre de 2002 apontavam a tendência de maior número de negócios entre a Europa e o Brasil. O primeiro é o Relatório da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados). O documento mostra que haviam caído sensivelmente os investimentos estrangeiros no Estado de São Paulo, como em todo o País, no primeiro semestre de 2002, em relação a igual período de 2001. No entanto, indicava que países da Europa haviam aumentado as inversões na economia paulista. Exemplos: Alemanha (US$ 59 milhões no primeiro semestre de 2001 e US$ 82 milhões, em 2002); França (US$ 120 milhões contra US$ 174 milhões); e Bélgica (zero/ US$ 230 milhões). Estados Unidos e Inglaterra haviam reduzido seus investimentos aqui. Fora do eixo ocidental, a China, que tinha anunciado investimentos de US$ US$ 39,8 milhões no primeiro semestre de 2001, passou para US$ 166,1 milhões.

O segundo estudo é o "Monitor de Cidades Européias", realizado anualmente pela Cushman & Wakefield, multinacional da área imobiliária, que revelou: São Paulo é a segunda, dentre todas as cidades do mundo fora da Europa, nos planos de expansão e investimentos de 506 empresas do Velho Continente. Atrás apenas de Xangai, mas à frente de metrópoles como Nova Iorque, Chicago, Tóquio, Miami, Los Angeles e Sidney...

Coincidências e analogias com a guerra à parte, a verdade é que as relações econômicas internacionais passam por mudança, agora apressada pelo cenário de beligerância. É preciso que o Brasil aproveite as oportunidades que se abrem para diversificar suas parcerias internacionais e ganhar mercado externo. Esta é uma tarefa conjunta dos setores públicos e privados, em cujo escopo é fundamental a participação pró-ativa das entidades de classe.

No âmbito da indústria gráfica, por exemplo, 60 empresas já aderiram a programa de incentivo à exportação. O plano foi criado em 2002 pela Abigraf Regional São Paulo (Associação Brasileira da Indústria Gráfica), com o apoio da Apex e do Sebrae. O investimento é de R$ 7 milhões e a perspectiva é de que, em três anos, os segmentos gráficos promocional, embalagem, editorial e papelaria aumentem suas exportações de US$ 150 milhões para US$ 250 milhões/ano. Este pequeno exemplo demonstra as imensas possibilidades da economia brasileira, efetivamente potencializadas pela nova conjuntura político-econômica mundial. Tratemos de trabalhar muito e de realizar as reformas constitucionais para, mais uma vez, não perder o trem da história.

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