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Autores:
Luís Eduardo Iseppe e Fernando Salgado
Qualificação:
Sócios da Consultoria Atitude - Gerando Resultado Sustentável
E-Mail
[email protected] e [email protected]
Data:
01/06/04
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Novos Parâmetros Exigem Mudança das Empresas

O mundo dos negócios está experimentando uma nova fase em termos de riscos e oportunidades. Organizações aparentemente sólidas, algumas até com claro domínio de mercado e milhares de funcionários, passam a sofrer impactos de questões que antes passavam desapercebidas, mas agora geram graves consequências. Hoje vemos casos de empresas que desaparecem da noite para o dia como: Enron, Parmalat e WorldComm. Também existem empresas que vivem pesadelos e têm que rever seus conceitos e atuação como: Shell, BP, Nike e Mac Donald's.

O que está mudando é uma ampliação significativa dos parâmetros de impacto nos negócios. A começar pela quantidade e diversidade de relacionamentos: clientes cada vez mais exigentes e participativos, fornecedores integrados à cadeia de produção influenciando nas decisões, ONG's muito bem estruturadas e fortes, funcionários mais preocupados com qualidade de vida e outras formas de remuneração, dentre outros. As questões que tiram o sono dos executivos estão extrapolando os limites empresariais, aumentando a sensação de falta de controle sobre elas. E para agravar ainda mais o quadro, tal ampliação está acontecendo em diversas dimensões: econômica, ambiental, social e até a humana, considerando-se que estamos em última instância falando de relacionamento entre pessoas.

Na parte econômica, a governança corporativa vem assumindo um papel decisivo na avaliação dos resultados das empresas, considerando novos fatores ligados às dimensões acima citadas. A transparência, o relacionamento com o mercado financeiro e sobretudo a ética estão cada vez mais sendo consideradas como ativos intangíveis que aumentam o valor da empresa num mundo cada vez mais avesso ao risco.

Hoje nos Estados Unidos US$ 1 de cada US$ 8 é investido nos chamados SRIs (Social Responsible Investors) - fundos que têm "screening" de investimento ambiental, social e/ou ético. Em todo o mundo foram criados indicadores que medem a performance de empresas que se destacam nesse conceito como o Dow Jones Sustainability Index, o DSI400 e FTSE4Good. Embora a volatilidade desses índices ainda seja alta (devido, entre outros, ao numero bem menor de empresas que participam nele), esse desempenho é um sinal claro de que existem oportunidades por trás da atuação consciente. Outro exemplo é o ranking financeiro da Business Week, onde empresas éticas mostraram desempenho aproximadamente 14% maior.

Outra dimensão que está trazendo grandes impactos para os negócios é a ambiental. Além dos evidentes prejuízos com imagem, os custos relacionados a "consertar" danos ambientais tornaram-se um importante fator competitivo. Porém, existem empresas que vão além. Não enxergam mais o lado ambiental como um custo, mas sim como uma oportunidade. Existem inúmeros exemplos de empresas que repensaram seus produtos e processos de produção, obtendo ganhos operacionais consideráveis, se destacando de seus competidores e acessando novos mercados como Native, Xerox, Kodak, Shell, The Body Shop, entre outras.

A dimensão social está associada à análise de todos os stakeholders diretamente ligados à empresa. Inúmeras empresas têm tido dificuldade em obter licenças devido à sua inabilidade em se comunicar com a comunidade. Num cenário já existente de maior consciência quanto à cidadania, a comunicação deve ter duas vias, através de um diálogo aberto e estruturado, resultando num verdadeiro engajamento da empresa a todos os seus stakeholders (acionistas, meio ambiente, ONGs, comunidade, clientes, fornecedores, governo e funcionários). Pressões vêm também de clientes externos que cobram cada vez mais uma postura socialmente ativa das empresas, ainda mais num país cheio de desigualdades sociais como o Brasil. Uma postura voltada à verdadeira solução das questões sociais, de consciência do papel de cada um, empresa e comunidade para a construção de um futuro melhor. Isso é muito diferente de filantropia.

Por fim temos a dimensão humana, onde o trato com os próprios funcionários é o exemplo mais fácil: em um estágio de desenvolvimento onde a importância do capital físico das empresas diminui ao passo que o capital intelectual e humano está ganhando cada vez mais peso, funcionários satisfeitos, motivados e leais, são uma vantagem competitiva bastante tangível. Do outro lado, processos trabalhistas e similares podem chegar a ser não só muito caros, como também desviar a atenção da alta gerência de assuntos estratégicos de negócio. Existem também exemplos de empresas que pagaram um alto preço por usarem trabalho forçado, trabalho infantil, por cooperarem com governos que não respeitam os direitos humanos, etc.

Embora estejamos abordando dimensões distintas, todos os casos acima têm um ponto em comum: eles envolvem situações que podem definir as ações que as empresas devem tomar para durarem no tempo, bem como os impactos que elas terão na estabilidade da vida no planeta. A preocupação com essas situações, as questões fundamentas de negócios associadas a elas e as ações que serão tomadas para respondê-las em um horizonte de médio e longo prazo é o que chamamos de Sustentabilidade. O conceito é bastante amplo. Para as empresas, ele tem como base a revisão de suas decisões estratégicas e operacionais. Trata-se de como analisar os negócios de maneira mais holística, sempre considerando os aspectos econômicos, ambientais, sociais e humanos além dos limites da empresa, abrangendo todos os stakeholders.

O importante é que a mudança das empresas a caminho da Sustentabilidade se torna mais viável quanto mais estrategicamente ela é tratada. O problema é que muitas vezes as estratégias são desenvolvidas mas, na hora da implantação, o que parecia excelente no papel não se torna realidade. Isso ocorre por diversas razões: a falta de consistência da própria formulação estratégica, o não entendimento e comprometimento da empresa em seus diversos níveis e, principalmente, as questões pessoais de relacionamento, maturidade e culturais.

A Sustentabilidade e seus sinônimos como a Responsabilidade Social Corporativa (RSC) e o Desenvolvimento Sustentável não são moda ou ferramentas que vieram para substituir as melhores práticas de gestão. São conceitos fundamentais a serem incorporados à estratégia das organizações que têm objetivos de longo prazo perpetuando sua razão de ser, bem como a vida do planeta. Aplicar tais conceitos pode representar um campo inteiro de possibilidades estratégicas que nunca foi utilizado. A partir do momento em que as empresas entendam esse diferencial, soluções criativas e de longo prazo trarão resultados significativos para elas e para o mundo.

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