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Autor:
Antônio Carlos Fernandes
Qualificação:
Médico ortopedista e Diretor Clínico da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente)
E-Mail
[email protected]
Data:
01/09/04
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Melhor Prevenir do que Arcar com o Custo Social

Surgiu como um ideal. E, como grande parte dos ideais, parecia pouco provável que se tornasse realidade. Mas, do pouco provável, a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) entende bem. A instituição surgiu, em 1950, também como um objetivo difícil de ser conquistado pelo médico Renato da Costa Bomfim, que queria ver tratadas e reabilitadas as inúmeras vítimas de Poliomielite, grande vilã da época. Hoje, com a pólio erradicada do País desde 1994, a entidade é considerada centro de referência internacional quando o assunto é deficiência física, realizando cerca de cinco mil atendimentos por dia, em quatro Estados brasileiros: São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. Além disso, uma unidade fluminense, na cidade de Nova Iguaçu, será inaugurada ainda este ano.

Desta forma, quando o diretor voluntário da AACD, João Luiz Silva, chegou de Miami, em 2001, com um ideal na bagagem, ninguém na entidade se surpreendeu. Começava ali mais uma batalha vitoriosa: a fortificação das farinhas de trigo e milho com ácido fólico (vitamina B9). Consumido regularmente por mulheres em idade fértil, previne uma doença considerada mais grave do que a Paralisia Infantil: a Mielomeningocele, má-formação congênita, em que a medula espinhal e a coluna vertebral se desenvolvem de modo inadequado. A conseqüência é a paralisia nos membros inferiores, na bexiga e no intestino. Não tem cura. O resultado deste ideal? Atende por Resolução RDC 344, de 13 de dezembro de 2002 e está valendo desde o último dia 18 de junho. A idéia foi importada porque contra fatos não há argumentos: em países como Estados Unidos, Chile e Canadá, depois da adição do ácido fólico nas farinhas, a incidência da doença havia baixado em média 50%.

Desde a adição do iodo no sal de cozinha, em 1952, para evitar a incidência do bócio endêmico (papeira), não ocorria uma fortificação alimentar estabelecida por lei no País. Só este fato já deixa claro o nível de dificuldade enfrentado pela AACD para sensibilizar as autoridades competentes sobre a necessidade do procedimento. As primeiras visitas à sede da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em Brasília, ocorreram em 2000. A compreensão do que era a doença e de como ela poderia ser evitada foi ilustrada com a gentil presença de uma das várias mães que sentem na pele o problema. Maria Helena Souza e suas duas filhas portadoras de Mielomeningocele nos acompanharam às reuniões fechadas da Agência. Mais do que isso, tiveram força mãe e filhas para dar seus depoimentos. Esta sensibilização foi repetida, em setembro de 2003, na sede da AACD, em São Paulo, quando foram reunidos os principais fabricantes de farinhas do País, bem como os representantes das entidades responsáveis pelo setor.

Acontecia o I Encontro dos Amigos do Ácido Fólico. Além da sensibilização, a preocupação da Diretoria da entidade era esclarecer que os empresários não seriam prejudicados com a determinação que estava por vir. Para isso também foram convocados um pesquisador científico da Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos), que esclareceu aos presentes sobre questões técnicas que envolvem a adição do ácido fólico: não há alteração do sabor ou da cor dos alimentos enriquecidos pela substância.

Também foi apresentado estudo da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), comprovando que o custo do enriquecimento com a vitamina B9 e o ferro, por tonelada, é irrisório se levado em consideração o custo social que a doença provoca. Para se ter uma idéia, uma criança de 8 anos, por exemplo, já foi submetida, em média, a uma cirurgia para cada ano de vida. Além do sofrimento, inquestionável, existe a questão econômica. O governo arca com uma conta que, a partir de agora, deverá ser paulatinamente reduzida. Trata-se de medida simples que poderá operar literalmente milagres.

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