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Autor:
Marcus Vinicius Pereira de Oliveira
Qualificação:
Consultor de Empresas e Diretor da Liner Consultoria
E-Mail
[email protected]
Data:
02/06/04
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Mudanças Empresariais. Mercado Ainda Resiste…

1) Muito se fala sobre a necessidade de mudanças nas empresas. Como uma empresa pode administrar as mudanças?

Acredito que sobre esta questão já temos algo fundamental a discutir: o que é mudar e o que é aprimorar? Entendo que mudar é algo que possa tornar o objeto diferente de suas características iniciais ou da sua localização dentro do tempo e do espaço. Quando isto acontece, normalmente, as pessoas encaram de forma natural ou aceitam. O mais difícil é administrar discursos onde várias coisas são faladas e nada de concreto acontece, o que é a maior parte dos casos nas empresas.

Como profissional, prefiro utilizar o conceito de aprimoramento, uma vez que se tratam de situações onde as alterações são lentas e graduais. Creio que os maiores transtornos aconteçam nos processos de aprimoramento. Ou seja, nas situações onde é necessário que as pessoas aprendam novos conceitos para produzir conhecimentos maiores do que os já estabelecidos.

Quando se fala em mudanças o que mais causa ansiedade e, por conseguinte, resistência, é a falta de explicações e definições para onde se irá mudar. Não existe uma forma única de administrar o processo de mudança e as resistências decorrentes da mesma. É fundamental, sim, estabelecer, com a melhor exatidão possível, aonde se quer chegar, como vai chegar e o que cada um "ganha e perde" nesse processo.

2) Como uma empresa pode motivar os seus funcionários ante as mudanças?

A melhor forma é mantendo uma comunicação honesta e mecanismos de reconhecimento à medida que são cumpridas as metas estabelecidas. Para isso, obviamente, é preciso se tratar de um processo de mudança bem planejado, onde cada um conheça o seu papel, os processos que lhe cabe e as regras do jogo.

3)Como o processo de mudança pode afetar o funcionamento de uma empresa referente a todos os níveis gerenciais e operacionais?

Os maiores efeitos nos níveis operacionais são mudanças que implicarão na redução do quadro de funcionários. Este é um assunto difícil de ser tratado e uma empresa responsável deve o efetuar com clareza de regras e se propondo a melhorar a empregabilidade dos funcionários que serão desligados da mesma.

No nível gerencial, os maiores efeitos são da ordem conceitual, pois o reposicionamento dos processos tende a gerar o sentimento de perda de poder ou de controle da situação. Neste ponto está-se diante de uma condição onde o mais apropriado seria o conceito de aprimoramento. O aprimoramento é um processo lento e que exige esforço para a aprendizagem. Na aprendizagem organizacional tanto a empresa deve se esforçar para comunicar os conceitos e forma prática de aplicá-los, assim como os gerentes devem se permitir a novos caminhos e descobertas. Quando este encontro se consolida a empresa cresce e atende aos seus objetivos iniciais.

4) Diante de mudanças que os funcionários julgam prejudiciais, o que fazer para que seus rendimentos e o medo não atrapalhem o andamento de uma empresa?

Dependerá das relações anteriores já estabelecidas entre empresa e funcionários e da cultura organizacional presente. Entretanto, a linha da honestidade e da clareza deve sempre ser mantida. Nem sempre é assim que acontece, pois sob o aspecto da empresa, como instituição, também existe um medo de perda de controle em função das novidades inerentes ao próprio processo de mudança. É fundamental imaginar que cada empresa ou segmento poderá ter suas particularidades.

Imagine que se esteja administrando um grupo de cortadores de cana. A linguagem e forma de conduta são bastante rudimentares. Neste caso, as mudanças que vão direto ao assunto tendem a ser mais eficazes. A cultura organizacional deste segmento é sutil e devastadora, pois os funcionários têm pouca argumentação e força intelectual. Não vou aqui emitir minha opinião se isto é certo ou errado, mas é o que acontece. Numa empresa neste estágio de evolução a comunicação é menos democrática e suas mudanças acontecem, quase que exclusivamente, pelas convicções da alta direção, sendo que, neste caso, os líderes de campo cumprem a importante função de ser o elo de comunicação entre os vários níveis hierárquicos.

Agora imagine uma grande mudança em uma empresa de desenvolvimento de softwares. Certamente, as explicações e formas de conduzir o processo de mudança deverão ter uma argumentação mais sólida e a empresa deverá medir o que ela perderá se os funcionários não incorporarem o novo modelo. Neste caso, a cultura organizacional tende a perpetuar as relações que preservem ou aumentem as condições de conhecimento individual ou das equipes.

Portanto, apesar de ações diferentes, é fundamental estabelecer o que vai acontecer e aonde a empresa quer chegar. Para cada circunstância deve-se utilizar a comunicação mais apropriada, porém sem perder a firmeza de propósitos e dos objetivos finais.

5) Qual o diferencial competitivo que uma empresa precisa ter e o que o RH pode contribuir para isso?

Isso dependerá de cada mercado, das condições de competição e das estratégias estabelecidas. Por exemplo, se as estratégias de uma determinada empresa é de preço (menor custo), RH deverá ter papel fundamental como facilitador da padronização de processos. Em uma empresa calcada em pesquisa e desenvolvimento, a gestão do conhecimento deve ser um dos pontos-chave da preocupação de RH, assim como a manutenção de talentos.Enfim, o papel de RH deverá variar de acordo com a estratégia estabelecida pela empresa.

6) Nos processos de mudanças, quais os retornos proporcionados pelo RH à empresa?

Podem ser vários os retornos, porém é muito difícil estabelecê-los sem uma correlação direta com a estratégia organizacional, pois o que pode ser um bom retorno para uma empresa não é necessariamente bom para todas as outras. De forma implícita, acredito que os gestores empresariais esperam que a área de recursos humanos possa amenizar conflitos, ou seja, manter o melhor clima organizacional possível. Isto muitas vezes se confunde com a manutenção do status quo. Novamente, me darei ao direito de não julgar se isto é bom ou ruim; deixo para os leitores a reflexão se pode haver mudanças e manutenção de status quo concomitantemente. E será bastante proveitosa se esta reflexão terminar na questão: existir resistência no processo de mudança é ruim?

Como consultor, vejo que o grande retorno que o RH pode trazer é a manutenção da estrutura das relações humanas dentro da empresa, permitindo o desenvolvimento organizacional, mediante críticas, alinhado ao desenvolvimento das pessoas (no nível técnico e do auto-conhecimento).

7) Como o capital humano é desenvolvido, em meio a tantas mudanças?

As formas de desenvolver o capital humano são várias e pode depender de cada caso. Portanto, prefiro me ater a questão de que desenvolver o capital humano é tornar as pessoas melhores sob o aspecto técnico e do auto-conhecimento; decorre deste processo um grande nível de conscientização. Com isso quero evidenciar que é melhor aprofundar o diálogo sobre a definição de capital humano em lugar do estabelecimento de meios para atingi-lo. Sem um conceito ajustado para a realidade do que vivemos, o capital humano é apenas uma moda que disfarça o conceito de mão-de-obra já estabelecido na relação capital-trabalho.

8) Qual a imagem que as empresas pretendem passar a seus funcionários e como o RH ajuda nesta missão?

Esta é uma questão bastante aberta e não possui uma resposta exata. O importante é saber que a empresa deve se preocupar em estabelecer uma imagem (valores e políticas) e esta ter coerência com suas ações, mantendo uma sintonia adequada à percepção de seus colaboradores, entre o que se diz e o que se faz. Quanto menor o esforço da empresa neste sentido, maiores serão as distorções e falta de direcionamento nas relações empresa / colaboradores, permitindo, com freqüência, maior resistência nos processos de mudança.

Para que isso aconteça o RH deve cultuar os valores e as políticas, permitindo que sejam objetos transacionais nas relações empresa / colaboradores. Quanto mais claros e éticos os valores, as políticas e as ações, mais honestas são as relações com os colaboradores e as demais partes interessadas.

9) Quais os tipos de mudanças por quais as empresas mais passam e deixam os seus funcionários temerosos? Você pode citar uma experiência prática?

As questões relativas ao aumento de produtividade e de redução de custos. O temor é que este processo tende-se a reduzir o quadro de pessoas, uma vez que a relação básica nestas contas é de mão-de-obra e não cabeça-de-obra.

No final do ano passado passei por esta situação. Durante 5 anos a empresa trabalhou para melhorar a produtividade através das pessoas, ou seja, tornar as equipes mais capacitadas para que pudessem produzir mais com menos. Contudo, a posse de uma nova diretoria entendeu que poderia reduzir custos reduzindo o número de pessoas e fez disto uma forma de marcar a sua gestão. Fizeram uma super festa para anunciar as novidades da gestão e o que efetivamente aconteceu foi o corte imediato das pessoas. Foi uma comunicação perversa e vejo que hoje a direção tem muita dificuldade em manter a relação de honestidade junto aos colaboradores. A confiança ficou arranhada. A busca do resultado no curto prazo e completamente destituído de valores e senso estratégico deixou uma ferida que ficará latejando por um bom tempo.

Quero reforçar bastante a questão da estratégia organizacional, pois quando ela não existe e é bem comunicada, tem-se a sensação que sempre haverá uma surpresa e torna-se difícil administrar o número de impulsos que se denominam como mudanças. A maior parte das empresas brasileiras não possui estratégia. Logo, o que chamam de mudanças é fruto de posicionamentos a esmo, falta de rumo e de opções para resolver problemas ou manter vantagens competitivas.

10) Como as mudanças são geralmente passadas aos funcionários? Seria pelo RH ou seria pelo diretor? Como o RH auxilia este diretor?

Geralmente as mudanças não são comunicadas com clareza para todos os níveis hierárquicos e aí começam os problemas. O porta-voz da mudança pode ser a direção ou o setor de RH, depende do tamanho da empresa e da profundidade da mudança.

Conforme o nível e extensão das mudanças pode afetar diretamente os vários níveis de liderança e torna-se necessário que vários atores entrem em cena para que sejam garantidos os resultados planejados. Neste caso, cabe ao RH identificar os melhores líderes ou formá-los, além de fornecer instrumentos que facilitem o diálogo, a convergência nas situações de conflitos e as medições para avaliar a evolução.

11)Em relação à participação, os funcionários possuem voz ativa para opinarem em situações de mudanças?

Na maior parte das vezes não, pois existe um grande abismo entre os objetivos das empresas e os objetivos pessoais, mesmo que os belos discursos organizacionais encubram este fato.

Existe uma crença irracional de que a informação centralizada gera poder. Porém, é a informação disseminada que gera valor e convergência. Como as informações não são disseminadas e a participação é restrita a se fazer o que se mando, nas mudanças organizacionais sempre existe, no nível do inconsciente coletivo, a questão: Qual será o preço a ser pago neste processo de mudança? Quais serão as perdas a serem negociadas? De acordo com a capacidade de absorver perdas, as resistências (a voz dos funcionários, o que é diferente de participação) poderão se apresentar em menor ou maior grau. E, em função da importância dada à resistência exercida, como uma antítese, melhor será a síntese e o aprimoramento organizacional.

12) Como um profissional de RH pode evitar as resistências às mudanças para que seus funcionários não prejudiquem o andamento das atividades da empresa?

Para esta questão, cabe uma outra pergunta: Será que o RH deve evitar as resistências ou compreender as resistências para permitir a aproximação e as convergências? Evitar resistências é um caminho disfarçado para a manutenção do status quo - tudo como sempre foi, em sua essência.

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