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Autor:
Celso Cardoso Pitta
Qualificação: Administrador com especialização em gestão de pessoas
e-mail:
[email protected]
Data:
03/04/2008
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Organizações Orientadas a Processos

A história do conhecimento humano, no ocidente, divide-se em dois grandes momentos: um período que teve como característica o estudo e a investigação do funcionamento do mundo pela lógica estrutural dos fenômenos, da visão cartesiana, e outro que passou a entender a realidade como sendo um processo, ou seja, a partir de um modelo dinâmico, e não mais atomista.

Na física, por exemplo, no início do século XX, surgiu a idéia de que a natureza da matéria seria formada por energias e não somente por sólidas partículas elementares, como dizia a física newtoniana.

Depois de Einstein, o mundo passou a ser visto como uma complexa rede de natureza energética cujo funcionamento se desenvolve por conexões e relações. A Física Quântica, então, trouxe uma nova compreensão sobre o funcionamento do Universo - um modelo sistêmico.

Este novo conceito estendeu-se, mais tarde, para outras áreas do conhecimento científico como a psicologia, a medicina e, mais recentemente, a biologia.

Todavia, as empresas e organizações tal como conhecemos atualmente absorveram de maneira extraordinária o pensamento e o modelo cartesiano, baseado na lógica estrutural, que fez muito sucesso no período racionalista, após a era do pensamento escolástico, da Idade Média.

As estruturas básicas das empresas do século XX foram aquelas formadas por atividades organizacionais baseadas em suas tarefas departamentais. Esta visão, exigida pelo aperfeiçoamento da fabricação de produtos mais complexos, acabou também por definir unidades operacionais mais sofisticadas, em uma estrutura empresarial cujo modelo vigora até hoje, com ênfase em suas “estruturas elementares”.

Pressionadas pela concorrência local e global, as empresas e organizações em todo o mundo viram-se obrigadas a melhorar a produtividade, aumentar a flexibilidade e a qualidade de seus produtos e serviços, entregando resultados em um tempo cada vez menor.

Entretanto, uma nova dificuldade se impôs para estas organizações: para se entender o todo da organização, não era mais suficiente analisar as partes de uma empresa isoladamente para a resolução dos problemas de gestão e condução dos seus negócios, qualquer que fosse a área de atuação.

Esta situação exigiu a construção de uma nova forma de se administrar. Para este novo modelo havia a necessidade de se gerenciar as demandas que os clientes estavam exigindo: maior confiabilidade, qualidade, rapidez, e personalização.

Aos poucos, as empresas entenderam que a visão departamental, baseada na simples execução de tarefas, precisava ser substituída por um novo conceito organizacional: uma visão orientada por processos.

Os problemas que até então essas empresas enfrentavam não podiam mais ser resolvidos pela simples execução, e nem pela melhoria contínua de suas atividades departamentais que não atendiam mais as necessidades e desejos provenientes de seus clientes e do próprio mercado. Esta transição, entretanto, ainda não aconteceu de forma satisfatória.

Tais problemas não estão mais reduzidos a uma lógica linear de causa e efeito. São problemas que se desenvolvem com inúmeras variáveis que afetam o resultado final esperado pelo cliente.

Quando um consumidor, por exemplo, reclama que recebeu um aparelho de TV quando, na verdade, comprou um equipamento de som, ele está reclamando de um processo, não de um departamento.

As empresas, então, descobriram o óbvio: o cliente sempre enxerga processos.

Mas afinal, o que é um processo? Em uma definição bastante simplificada, é um conjunto de atividades que visa a obtenção de um resultado, e que agrega valor para quem paga por um produto ou por um serviço.

Por causa de uma visão voltada para seus produtos, durante séculos, as empresas colocaram toda sua atenção na execução de tarefas departamentais e não em seus processos. Olhavam somente para si mesmas, e para sua estrutura gerencial narcisista.

Nessas organizações, as pessoas, clientes e fornecedores eram apenas meios, dificuldades ou facilidades, para se atingir um objetivo.

Com o passar do tempo, entretanto, as empresas e organizações adotaram uma nova forma de conduzir suas atividades, com uma visão nos seus processos. Mas isso não aconteceu por uma iniciativa delas. Elas foram obrigadas a repensar seus modelos de negócios. E quem as obrigou a isso? O cliente, que com uma maior consciência de suas determinações psicológicas e de suas necessidades, começou a exigir um novo comportamento de seus fornecedores.

Esta visão, entretanto, revelou outra face que as empresas e organizações não haviam também percebido: suas estruturas funcionais eram incompatíveis com essa nova dinâmica.

Pessoas, estilo gerencial, comportamento, cultura, sistemas de informação e de medição de desempenho, tudo precisava de um novo modelo mental para se adequar a essa nova realidade.

É esse o motivo pelo qual muitos investimentos em tecnologia da informação como o ERP (Enterprise Resource Planning), CRM (Customer Relationship Management), Supply Chain Management e outros, não foram e não são utilizados de maneira adequada – estão inseridos em uma estrutura organizacional ultrapassada, preocupada somente com a redução de custos e o aumento da performance operacional.

Mas o que é esse modelo mental? É uma nova forma de ver as coisas, por outra perspectiva, de maneira sistêmica.

É importante compreender que as empresas que adotam uma visão focada em processos não estão inventando e nem criam processos. Eles já existem. As pessoas é que não os enxergam. Eles já estão lá o tempo todo, gerando resultados, positivos ou não, para a empresa.

Um aspecto fundamental nesta visão é que processos não se restringem aos departamentos. Eles atravessam as paredes departamentais e vão até o cliente. Isto gera uma necessidade, como já foi dito, de se ver as coisas de forma diferente.

Um processo de fechamento de conta de um paciente hospitalar, por exemplo, quantos departamentos envolvem?

Qual departamento é o responsável final pelo resultado deste processo? O Financeiro? Informática? Hotelaria? Contas médicas? Não, nenhum deles! De acordo com a visão sistêmica de processos não se fala em departamentos. Esta é a primeira regra!

A segunda é inverter a noção de produção de bens ou de serviços. Na visão de processos não se produz nada sem se avaliar o que o cliente está solicitando. Assim, em uma organização orientada a processos, os profissionais são autodirigidos e são responsáveis tanto por realizar o trabalho quanto por garantir que os resultados e seus processos sejam feitos com critérios de qualidade muito definidos.

Em uma organização departamentalizada, essas atividades não podem ser realizadas pela simples razão de que os conceitos de resultado e de processos não são conhecidos pelas pessoas, e as gerências trabalham de forma centralizada, além do que os trabalhadores desconhecem suas colaborações no produto final, limitando-se à execução de tarefas restritas aos seus “feudos” empresariais.

Por outro lado, quando um resultado torna-se visível, os trabalhadores sentem-se gratificados por sua contribuição e sentem-se intimamente ligados a ele.

Nos programas de mudanças organizacionais esta é a premissa básica: envolver todos nas transformações, conscientizando as pessoas de suas colaborações. Sem isso a motivação torna-se impossível.

Uma organização orientada a processos estimula o desenvolvimento da maturidade em seus colaboradores. Quando os resultados são mensuráveis, o reconhecimento também fica claro para todos na organização, assim como todas as regras de negócio.

Abaixo, está ilustrado um quadro comparativo entre os dois modelos de gestão:

Modelos Mentais da Organização

HIERARQUIZADO

Poder centralizado, relação de comando entre chefes e subordinados
Os gerentes motivam, cobram, premiam e punem os funcionários
O sistema de informação da empresa é proprietária das fontes que as geraram
As atividades são agrupadas por cargos e funções
Defesa de território
Visão departamental por tarefas
A evolução profissional se dá por departamentos e depende das chefias
Relacionamentos pessoais ficam restritos aos departamentos
O resultado é medido pelo desempenho setorial

SISTÊMICO

Redes de relacionamentos
Os colaboradores exercem influência uns nos outros para atingirem um objetivo comum.
O sistema de informação é corporativo e distribuído
As atividades são papéis que as pessoas desempenham.
Defesa do interesse comum
Visão orientada por processos
A evolução profissional se dá por competência essencial das pessoas
Relacionamentos pessoais são distribuídos pelos processos
O resultado é medido pela eficiência dos processos.

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