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Autor:
Ricardo P. C. Valente
Qualificação: Consultor Internacional em Engenharia Ambiental
e-mail:
[email protected]
Data:
04/04/2008
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Apagão Ambiental

Lamentavelmente a expressão “apagão” está se incorporando a nossa língua como um acontecimento indesejado, previsível pelas autoridades públicas e de origem desconhecida por grande parte da população.

Foi assim, com o primeiro apagão, quando “apagou mesmo” a luz de norte a sul do Brasil, como se ninguém soubesse do estado débil do nosso sistema de distribuição de energia, da capacidade de geração e etc...

Vivemos a pouco o “apagão na aviação aérea civil brasileira”, que teve seu estopim no trágico acidente do avião da Gol com o Legacy. O acidente foi apenas a “ponta do iceberg” dessa modalidade de apagão. Precisamos esperar que 154 pessoas perdessem a vida, no acidente do avião da TAM, no aeroporto de Congonhas, para as autoridades apenas começarem a se auto-acusarem, e darem início a medidas concretas e consistente para definitivamente dar um grau mínimo de segurança e de respeito aos passageiros, que dependem do transporte aéreo.

Os brasileiros devem estar pensando: Qual deverá ser o próximo apagão?. Sem dúvida, teremos uma lista de fortes candidatos, dependente apenas da ocorrência de um acidente de grandes proporções.

Mas apagão, para ser apagão mesmo, deve ser de origem desconhecida por grande parte da população. Portanto, devemos excluir desta lista de apagões, como da Previdência Social, da Educação, da Segurança Pública, das Estradas, dos Portos, da Saúde Publica e por ai a fora. A epidemia de dengue no Rio de Janeiro, que vivemos no momento, não pode ser considerado “apagão da dengue”, visto ser de conhecimento público já a alguns anos.

Um forte candidato a um novo apagão é a dos “PCBs”, bastando apenas a ocorrência de um primeiro acidente no Brasil, visto que no mundo já ocorreram vários, para se tornar mais um genuíno apagão. Ele preenche perfeitamente todos os pré-requisitos, vejamos;

Os PCBs são desconhecido da grande maioria da população. Apenas algumas pessoas já ouviram falar do seu nome comercial e mais popular, Ascarél, óleo de transformadores elétricos.

Um acidente envolvendo este produto é altamente indesejado, dependendo das circunstâncias que o mesmo venha a ocorrer, poderá causar uma catástrofe ambiental e ou a saúde humana, não se limitando ao território nacional.

O potencial de danos ao Meio Ambiente e a Saúde Humana decorrentes de um acidente envolvendo os PCBs, são de pleno conhecimento das autoridades públicas, e em especial as do Meio Ambiente e Saúde.

Mas afinal, o que são os PCBs? As autoridades públicas realmente são conhecedoras do problema? Por que não se posicionam prudentemente?

Vamos por partes.

Os PCBs ( bifelinas policloradas ), também conhecido popularmente como Ascaréis, são compostos sintéticos utilizados como óleo isolante em equipamentos elétricos, mais especificamente em transformadores e capacitores.

Nos anos 80, os PCBs foram classificados mundialmente como produto perigoso por apresentarem algumas características que lhe conferem um significativo potencial de risco ao Meio Ambiente e diretamente a saúde Humana; por não serem biodegradáveis – ou seja, se dispersos no meio ambiente eles permanecem intactos por muitos anos, são bioacumulativos – isto é, eles se acumulam nos tecidos dos organismos vivos, como também são comprovadamente cancerígenos para animais e suspeito cancerígeno para o Homem, segundo a OMS. Além disso , outro grave aspecto, é que na ocorrência de um incêndio onde a temperatura atinja 400 0C, os PCBs se decompõe , formando substâncias altamente tóxicas e cancerígenas, conhecidas como dioxinas e furanos.

Os transformadores elétricos, que contém esse tipo de óleo não estão instalados somente nas industrias de uma maneira geral, mas sim dispersos em locais públicos como; metrôs, estadios de esportes, hospitais, salas de espetáculos, bancos, universidades, aeroportos, portos etc..., todos locais factíveis de incendio e de vazamentos. Portanto, estamos diante de uma situação de elevado risco, ao se considerar a gravidade e a probabilidade da ocorrencia de um acidente envolvendo os PCBs.

As autoridades responsáveis, são conhecedoras deste assunto, e não há que se ter dúvida, visto um conjunto de leis, portarias e resoluções em pleno vigor, como as que se seguem;

Portaria Interministerial ( MIC/MI/MME ) No 19 de 29/01/81 - É a lei brasileira que proíbe a fabricação e comercialização dos PCBs em todo território nacional, mas no entanto permite a utilização dos equipamentos com PCBs até o final da sua vida útil. Ou seja, pode-se continuar operando com o transformador contaminado com PCBs, sem qualquer restrição.

Resolução CONAMA No 313, de 29/10/02, que dispõe sobre a obrigatoriedade dos detentores de equipamentos elétricos contaminados com PCBs de apresentar aos respectivos órgãos estaduais de meio ambiente o inventário desses estoques, na forma e prazo a serem definidos pelo IBAMA, que até o momento não se pronunciou, ou seja, não dispomos de inventário e conseqüentemente desconhecemos o tamanho do iceberg.

Em maio de 2004, o Brasil ratificou a Convenção de Estocolmo, a qual reconhece 12 POPs (Poluentes Orgânicos Persistentes) dentre eles os PCBs e seus derivados, dioxinas e furanos, que deverão ser banidos da terra até 2025, por apresentarem elevado risco ao Meio Ambiente e Saúde Humana. No entanto, até o momento nenhuma medida concreta foi tomada para que o Brasil venha honrar o que assume internacionalmente.

Em 22/02/2006, foi promulgada no Estado de São Paulo, a Lei 12 288, de autoria do Dept. João Caramez (PSDB), que preenche todas as lacunas legais pertinentes a este assunto, definindo claramente a obrigatoriedade da elaboração de inventários dos resíduos de PCBs( conteúdo, forma e prazos), fixando as condições para a sua eliminação, com definição de prazos, e multas elevadas no caso do seu descumprimento.

Porque o IBAMA (CONAMA 313), Ministério do Meio Ambiente, Ministério e o das Relações Exteriores ( Convenção de Estocolmo ), permanecerem estáticos frente a este “potencial apagão”. Por que não seguem o exemplo do Legislativo Paulista? Estão esperando o que?.

Mas a responsabilidade não para somente no Poder Legislativo, mas sim no Poder Judiciário, via o Ministério Público, que deve fiscalizar e denunciar o Poder Executivo no seu dever de fiscalizar e gerenciar os passivos ambientais e a destinação final dos resíduos de PCBs.

A pergunta que se faz é; Com o advento da Lei 12 288, o que o Governo Paulista fez para o atendimento aos requisitos desta lei, através da sua Secretaria do Meio Ambiente, Cetesb e outros órgãos de controle ambiental,? Todas empresas entregaram os seus inventários nos moldes previsto pela Lei? As que não o fizeram, foram multadas? Foram feitas as respectivas vistorias? As empresas estão atendendo o cronograma de destinação final dos resíduos em questão? O Ministério Público já realizou diligencias junto aos órgãos de controle ambiental do Estado?, das empresas e demais detentores de transformadores contaminados com PCBs, para verificar se a Lei está sendo cumprida? , ou será que estamos correndo o risco de mais uma nova modalidade de apagão, o “apagão ambiental”?

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