|
O livre acesso e os setores de energia elétrica e telecomunicações O livre acesso ou compartilhamento de infra-estrutura é o aproveitamento da utilidade de uma determinada estrutura que passa a atender, além da atividade principal para a qual foi concebida, outras atividades de utilidade pública, incluindo a obrigação do proprietário de redes de interconexão entre fornecedor e consumidor (telefonia, energia elétrica, gás, etc.) a dar acesso a outros prestadores de serviços que com ele irão competir. Resumidamente, isto pode ocorrer por dois motivos: i) quando a criação de uma infra-estrutura exclusiva torna inviável a exploração econômica do serviço; ou ii) quando faltem meios físicos suficientes para a instalação de uma nova estrutura autônoma. Assim, o compartilhamento é hoje um dos desafios do Estado como ente regulador visto que, em muitos casos, a infra-estrutura não pode ser reproduzida por inviabilidade técnica, econômica, ambiental ou física, mesmo que tais instalações sejam essenciais para a entrada de novas empresas no mercado. Esta circunstância caracteriza muitas vezes, o poder de impedimento ao acesso de novos agentes pela detentora de tais instalações, inibindo, desta forma, o exercício da livre concorrência e a entrada de outras empresas em determinado setor. A referida essencialidade relaciona-se à concorrência, uma vez que a infra-estrutura essencial é aquela sem a qual um procedimento ou processo industrial ficaria impedido de exercer sua atividade. Assim, o detentor de tais instalações pode utilizar este poder de mercado para impedir novos concorrentes. Diante disso, é a classificação de essencialidade atribuída a uma determinada instalação, que justifica a restrição legal ao bem mais precioso de nosso direito pátrio a propriedade traduzido na aplicação do conceito de compartilhamento de infra-estrutura. Desta forma, fica o detentor das instalações consideradas essenciais obrigado a compartilhá-la com terceiro, tendo como base os princípios da livre concorrência e da função social da propriedade. Importante considerar, porém, que não existe obrigação incondicionada de compartilhar, em razão do direito ao livre acesso ter como requisitos: i) a existência de capacidade ociosa da rede; ii) a possibilidade técnica; e iii) que não haja sacrifício do direito do proprietário na sua utilização. No setor de energia elétrica e de telecomunicações, a imposição regulatória do livre acesso está presente na obrigatoriedade de compartilhamento das redes com empresas dentro de seu próprio setor e com empresas de outros setores. No que tange ao compartilhamento da infra-estrutura entre empresas do setor elétrico e de telecomunicações, é importante frisar que se tem verificado diversas discussões, principalmente com relação à remuneração pela utilização das redes. A questão é, até certo ponto, regulamentada pela Lei nº 9.472/97, igualmente denominada Lei Geral de Telecomunicações (LGT) em seu art. 73 e no art. 15, § 6º da Lei nº 9.074/95, sendo certo que ambas estabelecem o direito ao livre acesso entre as empresas de seu próprio setor e autorizam o uso compartilhado da infra-estrutura com prestadoras de serviços de outros setores detentores de atividades que encerrem o interesse público. Corroborando com o dispositivo acima transcrito, a obrigação legal de compartilhar infra-estrutura com outros agentes foi personalizada por meio da Resolução Conjunta ANEEL/ANATEL/ANP nº 001 de 24 de novembro de 1999 e posteriores alterações, a qual estabeleceu o Regulamento Conjunto para Compartilhamento de Infra-estrutura entre agentes de Setores de Energia Elétrica, Telecomunicações e Petróleo. Ambas comungam da idéia central de que, presentes os requisitos mínimos acima mencionados, as empresas não podem negar injustificadamente o acesso de outras de “interesse coletivo” à sua própria infra-estrutura. O entendimento dos nossos tribunais também reforça o acima mencionado e tem sido no sentido de afirmar a obrigatoriedade do livre acesso, diante da presença de tais requisitos. Entretanto, a questão que tem suscitado maiores discussões e impasse, é aquela que possui relação com a remuneração pelo compartilhamento. Sabe-se que a referida remuneração deve ser definida pelas partes, por meio de livre negociação, “observados os princípios da isonomia e da livre competição” e, ainda, nos termos do disposto no artigo 73 da Lei Geral de Telecomunicações, deve ser justa e razoável. O que ocorre na prática é que muitas negociações são frustradas, em razão de muitas vezes as partes não chegam a um entendimento do que seria um preço justo e razoável e, como a regra é a da livre negociação, as agências reguladoras apenas podem intervir, arbitrando o preço de compartilhamento, no caso de negociação frustrada e quando a lei expressamente autorizar, ou seja, a regra é a da não intervenção estatal. Importante frisar, no entanto, que a referida regra de não intervenção, todavia, não autoriza o abuso das prestadoras de serviços públicos na formação do preço, de forma a impedir o direito ao acesso à infra-estrutura garantido pela legislação em vigor e pelo princípio constitucional da livre concorrência. Por este fato, temos verificado que a atuação do judiciário tem ganho cada vez mais importância e, na maioria das decisões, este poder tem arbitrado o preço que entende refletir os conceitos básicos do justo e razoável nos casos levados à sua apreciação. Considerando que o Poder Público pode ser chamado a intervir, além da via judicial, pela via administrativa, deve-se ter em mente que quando o abuso se configurar em uma infração ao direito concorrencial e ou, quando se enquadrar na categoria de abuso do poder econômico, deve-se cogitar a intervenção do órgão incumbido de defesa da concorrência, o CADE, já que a exigência de preço excessivo pelas empresas detentoras de instalações essenciais pode configurar-se em uma infração ao direito concorrência. |
|
![]() © 1996/2008 - Hífen Comunicação Ltda. Todos os Direitos Reservados. |