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Autor:
Jayme Buarque de Hollanda
Qualificação:
Diretor geral do INE - Instituto Nacional de Eficiência Energética e diretor do Fórum de Co-geração e Geração Distribuída
E-mail:
[email protected]
Data:
08/07/05
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Agroenergybusiness - Energia do Campo Agregada aos Negócios

O nome do ministro Roberto Rodrigues está associado ao Agrobusiness, forma abrangente de designar os negócios agrícolas ao longo de uma complexa cadeia produtiva da economia. Pois eu queria propor ao ministro uma extensão do conceito e criar o agroenergybusiness, agregando à complexidade do agrobusiness as questões muito especiais das energias nascidas no campo. Afinal, no momento em que se equaciona o biodiesel, é bom lembrar que a energia contida nas 500 milhões de toneladas de cana-de-açúcar da safra esperada em 2010/11 equivalerá a uma produção de 1,7 milhões de barris/dia de petróleo, quase a produção do Brasil hoje.

Quando, nos anos 70, o preço do petróleo quadruplicou, para reduzir a dependência externa, o Brasil, que produzia apenas 15% das suas necessidades, decidiu intensificar a pesquisa de petróleo no país e substituir gasolina por álcool, ampliando substancialmente a produção deste combustível.

As duas políticas foram bem sucedidas, mas tomaram caminhos diferentes quando, em meados dos anos 80, os preços do petróleo voltaram a cair. A pesquisa do petróleo no Brasil se manteve, mesmo tendo as descobertas ocorrido em águas profundas, com custos de exploração acima dos preços praticados. Já a política do álcool, cujo uso estava em plena expansão, perdeu sua componente estratégica. Sucessivos governos passaram a ver o Proálcool como uma pedra no sapato e o programa só não foi desfeito porque havia milhões de veículos a álcool circulando aumentaria a poluição urbana e porque impactaria a balança de pagamentos em alguns bilhões de dólares com a importação de gasolina.

Havia um desconforto das áreas tradicionais de energia com esta fonte originada nos campos de plantação em vez dos campos de petróleo e se passou a trabalhar como se o uso do álcool como combustível fosse terminar. Tanto, que a agência para tratar de combustíveis em geral foi chamada de Agência Nacional do Petróleo, foram construídas fábricas de MTBE, o poluente aditivo da gasolina derivado do petróleo para substituir o álcool, e o ICMS Imposto sobre a Circulação de Mercadorias - da gasolina passou a ter um regime diferente do aplicado ao álcool.

A valorização do real nos anos 90 reduziu ainda mais a competitividade do álcool com a gasolina em um setor que, por ser exportador, tinha sua economia abalada. Estas incertezas bloquearam também o desenvolvimento da produção elétrica usando a biomassa combustível da cana. As quantidades deste material são tão importantes que, para evitar a sobra de biomassa, que seria um estorvo, folhas e palhas são queimadas nos campos e as centrais de energia das usinas acabam operando como verdadeiras piras. Aproveitada devidamente, as usinas poderiam produzir de 10 a 15% das necessidades do país com vantagens para o sistema elétrico, pois ficam próximas das cargas, o que reduz investimentos em transmissão, podem ser desenvolvidas em pouco tempo e têm sazonalidade, complementar às hidrelétricas, o que reduz os riscos de falta. Em síntese, pratica-se o maior desperdício energético do país na atualidade.

Na virada do século atual o panorama mudou completamente. Além dos preços do petróleo terem aumentado e permanecido em patamares elevados, o mercado internacional do álcool se firmou e a introdução dos veículos flexíveis tem garantido maior racionalidade no mercado doméstico. Desta forma, os eventuais desconfortos do agroenergybusiness do álcool vão se desfazendo com os atores passando a aceitar e a conviver com o que há até pouco era visto como uma esquisitice energética do Brasil.

A nova lei do setor elétrico reduziu as barreiras legais para que se desenvolva todo o potencial, mas ainda falta derrubar resistências culturais. O setor elétrico, por exemplo, não considera este potencial nos estudos que fundamentam as decisões porque estas usinas de geração distribuída fogem do paradigma dos geradores de grande porte e das longas linhas de transmissão.

Por outro lado, como o setor canavieiro tem boas perspectivas de expansão e de retornos nas suas atividades tradicionais, tende a priorizar os investimentos que estas venham a requerer. Para desenvolver a nova atividade é preciso uma expectativa estável onde dificuldades, como as sofridas nos anos 90 quando, por falta de uma política energética de longo prazo, o país quase extinguiu o programa do álcool que ajudou a construir com tanto esforço.

A oportunidade para desenvolver o potencial de geração é única, pois dezenas de novas destilarias serão implantadas para atender a crescente demanda e as cerca de 300 unidades, construídas para o Proálcool há mais de 20 anos, precisam modernizar seus sistemas de energia.

Quebrar este impasse e fazer com que esta energia seja aceita no fechado clube do setor elétrico será o principal desafio do Agroenergybusiness. Ao ministro, caberá o trabalho de acelerar o processo, eliminando as resistências que, por serem de natureza cultural, têm que ser combatidas com vontade política.

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