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Autor:
Miguel Ignatios
Qualificação: Presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB).
Site:
www.advbfbm.org.br
Data:
09/03/2007
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Legislativo em sintonia com a nação

Desde o fim dos governos militares, em 1985, o poder político - até então concentrado exclusivamente nas mãos do Executivo - passou a ser dividido com o Legislativo, principalmente a Câmara de Deputados e o Senado, em âmbito federal; além das assembléias estaduais e das câmaras municipais.
Essa mudança estrutural demorou a ser percebida pela sociedade. Mas, curiosamente, foram os próprios parlamentares federais (deputados e senadores) os que levaram mais tempo para se adaptar às suas novas e importantes funções.

Acostumados apenas a dizer sim ou não aos projetos de interesse do Executivo, de repente, deputados federais e senadores viram-se obrigados a debater, realmente, e em profundidade, os grandes problemas do País.

Grupos de pressão e lobistas demoraram menos para perceber a mudança e, em pouco tempo, passaram a enviar caravanas de representantes dos mais diversos setores de atividade para os gabinetes de deputados e senadores.
Assustados e mal preparados para exercer cargos tão importantes, a maioria deles preferiu declinar de suas funções, passando a exercê-las, de fato, e para valer, apenas quando grandes temas, que mobilizam a opinião pública, chegam aos plenários da Câmara e do Senado.

Dessa forma, na ausência de grandes votações, a rotina parlamentar fica reduzida às discussões, nas diversas comissões técnicas das duas Casas, e à recepção de lobistas e de grupos de pressão, por parte dos assessores parlamentares.

Junte-se a isso o hábito da contumaz infidelidade partidária (quase 50 novos parlamentares mudaram de partido, no período compreendido entre o fim da campanha eleitoral de 2006 e a posse da nova Legislatura, no início de fevereiro), e teremos aí uma porta aberta àquilo que a mídia chama de "balcão de negócios".

Disciplinar as relações entre agremiações políticas e candidatos eleitos é um dos objetivos da reforma política, que já recebeu, por diversas vezes, do governo, o "carimbo" de prioritária.

Mas o que me interessa abordar mais de perto neste artigo é o compromisso que o parlamentar eleito deve ter com a sociedade. Em levantamento recente, o jornal "Valor Econômico", mostra que um em cada três deputados federais, eleitos em 2006, e empossados em fevereiro, é ligado à atividade empresarial.

Dos 513 deputados eleitos, 170 são ligados de alguma forma à área empresarial. Em 2002, esse número era de 145. No Senado, a participação de parlamentares empresariais também é de um terço: 27 senadores num total de 81.
Os Estados com maior número de deputados ligados à atividade empresarial são: Minas Gerais (26), São Paulo (24), Paraná (16), Bahia (13), Rio de Janeiro e Pernambuco (9).

Por áreas de atividade, a produção rural lidera, com 25% do total, seguida pelo comércio, com 15%. Depois, aparecem, em ordem decrescente: o setor de serviços diversos, com 11%; agroindústria e indústria alimentícia, com 8,8%; saúde, com 7%; transportes, com 6,4% e mídia, com 4,7%.

Além da "bancada" empresarial, destacam-se também grupos informais, que se unem, eventualmente, para defender interesses comuns: ambientalistas, com cerca de 290 representantes, aí incluída boa parte dos parlamentares ligados à atividade empresarial; ruralistas, sindicalistas e evangélicos, dentre outros, com capacidade de obter mais de 100 votos no plenário da Câmara.

Se fizessem seu papel como deveriam, sem serem reféns do Executivo, tomando a iniciativa de aprovar projetos de lei que estejam em consonância com a sociedade, e, sobretudo, criando novas leis, independentemente daquelas oriundas do governo, apenas os representantes empresariais e ambientalistas já seriam suficientes.

Os primeiros em razão de a sua agenda consensual - redução da carga tributária, desoneração imediata de alguns setores; flexibilização da CLT, com mais geração de empregos e melhor distribuição de renda; redução da burocracia, implantação das reformas previdenciária (do setor público), política e do Judiciário - interessar também a toda a sociedade.

Os segundos em razão de sua atuação ser necessária para fiscalizar e tornar viáveis todas aquelas metas, socialmente justas, sem agredir o meio ambiente.

No Brasil, ainda é preciso que nos lembremos o tempo todo de uma verdade óbvia, mas que é quase sempre esquecida: o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, fiscalizados pela mídia, eleitorado, grupos de pressão organizados, ONGs, dentre outras entidades, só fazem sentido numa democracia plena se atenderem aos interesses da sociedade, que é soberana.

E não, como, infelizmente ainda acontece com freqüência intolerável, serem usados como instrumentos em prol de interesses de Estado, de agremiações políticas, de classes ou de corporações.

No século 17, na Inglaterra, foram feitas várias revoluções, para tirar do rei, a exclusividade de legislar e de julgar divergências. Depois delas, o Parlamento inglês passou a legislar não apenas para o Estado, mas também para toda a sociedade. E a Justiça passou a ser ofício de juízes, promotores e advogados.

Apesar de o Brasil, às vezes, desafiar a história, representantes do Executivo, Legislativo e Judiciário não devem se esquecer de que o destinatário maior e final de suas ações é a sociedade.

Vai demorar um pouco ainda até que o brasileiro se torne um cidadão pleno. Por enquanto, ele é apenas consumidor e contribuinte, ainda que em minoria. A sociedade já se conscientizou de que ela é capaz de conseguir aquilo que deseja.

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