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Autor:
Jorge Donadelli
Qualificação: Presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Franca - Sindifranca
Site:
www.sindifranca.org.br
Data:
11/05/2007
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Culpa

Há dias a imprensa noticiou, com grande destaque, que Franca tem a pior média salarial do Estado e, a culpa é da indústria de calçados, que responde por quase a metade dos empregos em nossa cidade.
São dados fornecidos pelo Ministério do Trabalho e não há o que se contestar.Quanto à culpa... veremos...
Franca tradicional pólo calçadista que se especializou na produção de calçados masculinos de boa qualidade. Há quase um século vem melhorando seus produtos e conquistando mercados no mundo inteiro - hoje exporta para mais de setenta e cinco paises. E inaugurará, ainda este ano, o Centro de Design que ensejará, além dos bons produtos, exportar a moda brasileira.
Pela boa qualidade que produz, eleva o valor de seus preços. Enquanto a média brasileira não passa de U$9,82 por par, nosso sapato alcançou o preço de U$ 21,41, no ano passado. Se comparado com os demais setores calçadistas do Brasil, Franca paga em torno de 20% a mais seus salários. Perde para outros segmentos da economia por algumas razões óbvias. Por exemplo: a qualificação profissional do operário e a idade. Sessenta por cento do operariado calçadista tem idade entre dezesseis e vinte e cinco anos e o grau de instrução exigido não vai além do ensino médio, enquanto outros centros, como os produtores de carros e aviões, a maioria dos trabalhadores tem curso superior e a média de idade é acima de vinte e cinco anos. Pode acontecer de um operário que faz parte de um grupo de salários baixos, enquanto jovem, vá se compor no grupo dos bons salários após os vinte e cinco anos e já ter passado por uma indústria calçadista.
Por ser uma indústria de mão-de-obra intensiva - o sapato passa pela mão do homem em torno de cento e vinte vezes, durante o processo de fabricação - é grande geradora de emprego e generosa na distribuição de renda. Não se descobriu, ainda, uma máquina de fazer sapatos como, por exemplo, uma colheitadeira de milho que substitui a mão-de-obra de 400 homens, em um dia de trabalho. A indústria calçadista por ser de mão-de-obra intensiva é pouco exigente em formação profissional. Qualquer especialização, no calçado, o operário poderá executar com menos de seis meses de prática. Se ele vem da zona rural e entra em uma fábrica, ganhando $ 485,00 por mês (piso salarial), em seis meses, ele poderá ser um cortador de pele e ganhar cerca de $ 1.500,00 por mês.
É comum, em uma fábrica de calçados, trabalhar pai, filho e filha registrados e, em casa, trabalha a mãe, nos intervalos das obrigações de dona de casa, em costuras manuais. Daí a renda familiar ser uma das melhores do Brasil.
Não é por acaso que prefeitos e governadores de outros estados e outras regiões assediam Franca, querendo levar nossas indústrias para suas regiões. E curiosamente, em tempos passados, a imprensa noticiou que uma cidade, candidata a receber uma indústria automobilística, estava fazendo movimento para não recebe-la. Alegava-se que empregavam o engenheiro, porém não empregavam o filho da doméstica que trabalha para a família do engenheiro.
Não é por acaso que Franca tem crescido mais que a média de outras cidades e tem atraído hotéis, restaurantes e grandes redes de lojas.
Não é por acaso que Franca não tem grandes riquezas, porém não tem miséria, não tem favelas e quase não tem pedintes e, mesmo a violência, se comparada com outros centros, é menor.
Como um artista que dá o máximo de si, ao final do espetáculo, cumprimenta ao público e espera por aplausos, o setor calçadista espera ser reconhecido como mola propulsora do progresso de nossa cidade e não como vilão das crises. Pois, ainda que com dificuldades, este setor aumenta a oferta de empregos e responde por sessenta por cento do PIB do município.
Será o setor culpado? ou culpa é um predicativo honroso?

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