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Autores:
Edemir Marques de Oliveira e Camilo Gribil
Qualificação:
Diretores de impostos da BDO Directa Consultoria e societária
E-Mail
[email protected] e [email protected]
Data:
13/03/04
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PIS/PASEP e COFINS Sobre Bens e Serviços Importados: Mais um caso de Emenda Inconstitucional.

O Governo Federal publicou a Medida Provisória n. º 164, de 29 de janeiro de 2004, que dispõe sobre a incidência das contribuições ao PIS/PASEP e a COFINS no caso de importação de bens e serviços.

O pretexto para edição da norma é o tratamento isonômico que deveria nortear as aquisições de bens e serviços no mercado interno e externo. A referida MP foi editada com base na nova redação do artigo 195, inciso IV, dada pela Emenda Constitucional n.º 42/03, que inseriu o fato de importar como uma nova fonte de financiamento da seguridade social. Não são poucos os argumentos jurídicos acerca da inconstitucionalidade desse gravame, afinal o Governo Federal está denominando de PIS/PASEP e COFINS uma exação que não é nem PIS/PASEP, muito menos COFINS. Essa exação ou é um novo tributo ou é uma nova fonte de custeio. Nesse sentido, para cada espécie existe uma diretriz clara na Constituição Federal que não permitiria a instituição desse gravame pela forma com que foi implementada.

Acreditamos que haja limites para o poder constituído derivado reformular o texto constitucional. As constantes alterações promovidas no texto constitucionais, por meio de emendas, em nada contribuem para a segurança jurídica que deveria nortear as relações entre o Estado e os Cidadãos/Contribuintes; pelo contrário, abala toda a estrutura dos direitos e garantias individuais que deveriam ser rigorosamente observadas. No entanto, tornou-se uma prática comum no Congresso dos dias atuais, não a preservação da Constituição Federal, mas sua contínua alteração visando atender aos constantes apelos dos diversos entes políticos. Nesse sentido, foi editada a Emenda Constitucional n.º 42/03, cujo objetivo foi, supostamente, constitucionalizar a cobrança das contribuições nessas situações.

O poder constituinte originário é quem tinha competência para determinar quais tributos poderiam ser instituídos pelos entes políticos. E, esse constituinte, sim, não tinha limites para delinear a hipótese de incidência da contribuição. E ele usou suas prerrogativas! Optou por deixar fora do campo de incidência os bens e serviços importados.

Entretanto, o constituinte não estava desatento sobre a necessidade futura de caixa do governo para fazer frente às suas despesas. Tanto assim que o artigo 195, § 4. º prevê a instituição de outras fontes de custeio, desde que observado o artigo 154, inciso I, que determina que esta nova fonte de custeio seja instituída por Lei Complementar, obedecido Princípio da Não-Cumulatividade, bem como não tenha fato gerador e a base de cálculo próprio dos impostos já existentes atualmente. A forma como a Constituição Federal poderá ser emendada está descrita no artigo 60 da Carta. Vejamos o que estabelece o parágrafo 4º, inciso IV, deste artigo: 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:(...) IV os direitos e garantias individuais.

Destarte, é vedada a deliberação de qualquer proposta de emenda que tenha como objetivo afastar qualquer direito ou garantia individual dos contribuintes. Neste sentido o STF declarou que: Uma Emenda Constitucional, emanada, portanto, de Constituinte derivada, incidindo em violação à Constituição originária, pode ser declarada inconstitucional, pelo Supremo Tribunal Federal, cuja função precípua é de guarda da Constituição. Elo exposto, temos que nosso direito posto é firme no sentido de considerar inconstitucional uma emenda que viole a Constituição originária, mesmo porque emanada de um poder derivado. Ademais, entendemos que, por estar fora do campo de incidência das referidas contribuições, a tributação dessas importações só seria possível com base na competência residual &Mac246; conforme artigo 154, inciso I da Constituição Federal.

Ainda assim, segundo entendemos, nem nos termos do artigo 154, inciso I, esta norma poderia ser constitucionalizada. Tanto a Emenda Constitucional como a Medida Provisória incorrem em vicio de inconstitucionalidade, pois, dentre outros argumentos:

1. o constituinte derivado não poderia criar, por Emenda Constitucional, nova fonte de custeio, haja vista que o constituinte originário elencou apenas a folha de salários, o faturamento e o lucro como base das contribuições;

2. o artigo 195, parágrafo 4.º, combinado com o artigo 154, inciso I, foram violados pois:

a) Medida Provisória não é Lei Complementar;

b) O Princípio da Não-Cumulatividade não está sendo observado, haja vista que as pessoas jurídicas que não estão enquadradas na sistemática de cálculo não-cumulativa, bem como as pessoas físicas, não terão como utilizar o crédito da contribuição paga &Mac246; a exemplo do ocorrido com ICMS sobre bens importados por pessoas físicas e por prestadores de serviços; e

c) A importação já é gravada por imposto específico. Portanto, essa hipótese de incidência não poderia ser utilizada.

Assim, em nossa opinião, estamos diante de uma Emenda Constitucional viciada pela inconstitucionalidade, por ferir os direitos e garantias estabelecidas pelo poder constituinte originário não sendo diferente a inconstitucionalidade da MP. Ao Estado é defeso criar mecanismos que visem, de qualquer forma, vedar o pleno direito que têm os cidadão de não pagar tributos que não obedeçam aos rígidos critérios estabelecidos pelo Texto Constitucional. As pessoas que pagam tributos nesse País não podem arcar com os constantes déficits orçamentários do Estado, tendo seus direitos ceifados a todo o momento que o governo julgar necessário, afinal já tivemos a oportunidade de nos manifestar acerca do significativo crescimento da carga tributária brasileira nos últimos anos, a qual é superior a 35% (trinta e cinco por cento) do Produto Interno Bruto (PIB) atualmente, sendo notório o fato de a qualidade dos serviços públicos não ter acompanhado &Mac246; proporcionalmente - esse expressivo crescimento.

Acreditamos que um dos problemas que esta absurda carga tributária acarreta para o verdadeiro contribuinte é o de que poucos acabam pagando muitos tributos e, em contra-partida, muitos não pagam nada ou quase nada. Qualquer projeto de reforma tributária séria deveria considerar uma sensível redução da carga tributária, aumentando, assim, a base de contribuintes e trazendo para a formalidade os que hoje se encontram fora dela. Infelizmente, o que se observa no País é que, ao invés de adotarmos políticas rígidas no controle dos gastos públicos, o caminho utilizado é sempre o da majoração de tributos para equacionar a despesa pública. Esperamos que o Poder Judiciário esteja atendo à questão e que possamos ter efetivamente um Estado Democrático de Direito, onde os direitos dos contribuintes sejam respeitados e não postos à margem, em decorrência das constantes dificuldades que impede o Estado de honrar seus compromissos.

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