.
Autor:
Gregório Mancebo Rodriguez
Qualificação:
Vice-Presidente da Associação Nacional de Investidores do Mercado de Capitais - ANIMEC
E-Mail
[email protected]
Data:
14/09/04
As opiniões expressas em matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição do Empresário Online. Proibida a reprodução sem a autorização expressa do autor.

Petrobrás: Política de Combustíveis, quem Paga a Conta?

No último dia 20 de agosto (sexta-feira), o preço do barril de petróleo atingiu novo recorde histórico de US$ 49.40 o barril para o tipo WTI - West Texas Intermediate, negociado em Nova York, e de US$ 45.00 o barril para o tipo Brent, negociado em Londres. Considerando os preços do mês de junho a cotação internacional apresentou uma evolução de 30% para o tipo WTI e 29% para o tipo Brent (que é a referencia utilizada pela Petrobrás).

A Petrobrás tem assistido a este movimento de uma forma passiva, e os principais produtos comercializados pela empresa, como gasolina, óleo diesel, e querosene, não sofreram alterações, enquanto outros produtos, como o querosene de aviação, já sofreram uma evolução de 24% no período. Portanto, verifica-se uma clara política diferenciada de preços beneficiando o consumidor interno, pelo represamento de aumentos que poderiam ter reflexos negativos sobre a inflação, principalmente em um ano eleitoral, enquanto o querosene de aviação está mais alinhado com a evolução dos preços internacionais.

O exemplo acima demonstra o casuísmo com que vem sendo tratado o assunto. Como consumidores, achamos louvável a preocupação do governo em procurar manter a inflação em níveis próximos às metas fixadas para este ano. Contudo, o represamento da inflação e o efeito das importações, já influenciados pelos novos níveis do preço internacional do petróleo, podem ter efeitos nefastos sobre a inflação futura. Como acionistas, no entanto, vemos com preocupação que todo esforço efetuado pelas gestões anteriores, em efetivamente transformar a empresa em uma companhia aberta, com uma política clara de preços para os combustíveis tendo como base um "mix" entre os preços do petróleo nacional e internacional, parece ter sido jogada na lata de lixo.

A Petrobrás está sujeita, no momento, a uma conjunção de fatores negativos, ocasionados: a) pela redução da produção doméstica de petróleo, em face do atraso da entrada em funcionamento de algumas plataformas e paradas técnicas previstas; b) ao aumento nas importações, para atender ao aumento da demanda; e c) ao cenário de alta dos preços, provocado pelo conflito com o Iraque, a instabilidade na Arábia Saudita (principal produtor e exportador), e com os problemas de produção da Yukos - principal empresa petrolífera da Rússia, além da redução dos estoques estratégicos dos EUA. Estes fatores têm influenciado negativamente a rentabilidade da empresa, tendo em vista o aumento dos custos e a falta de recomposição de preços.

O acionista controlador, a União, e a administração da empresa, estão fazendo uma gestão que pode ser considerada como temerária. Senão, vamos aos fatos: a) independente da excelente geração de caixa da Petrobrás, ela tem que estar continuamente investindo no desenvolvimento de novas áreas de exploração, refino e distribuição, cujo retorno somente ocorre no longo prazo. Portanto, se houver redução na sua capacidade de investimentos, o desempenho operacional futuro pode estar sendo comprometido; b) a redução na produção implica, necessariamente, no aumento das importações a preços internacionais (sem subsídios governamentais), com conseqüente aumento no dispêndio de divisas; c) o cenário internacional para os preços do petróleo indica que dificilmente a "commoditie" volte, no médio prazo, a ser negociada nos níveis de US$ 22.0 a US$ 28.0 o barril, anteriormente praticados pela OPEP.

Quem está pagando a conta é o acionista minoritário da Petrobrás. Senão, vejamos: as ações de empresas congêneres da Petrobrás têm tido uma valorização nos mercados internacionais em torno de 60%, tendo em vista que não compete às empresas subsidiarem os consumidores. As ações da Petrobrás, entretanto, que no início do ano estavam cotadas a R$79,20, em 24/08 se encontravam cotadas em torno de R$82,00, uma evolução pífia ocasionada pela percepção dos investidores de que a empresa estaria sendo utilizada como instrumento de política monetária. O mais estranho, considerando o contexto nacional e internacional, é que a empresa tenha apresentado, no segundo trimestre, lucro líquido apenas 8% superior ao do primeiro trimestre. Conseqüentemente, os relatórios de análise nacionais e internacionais têm apresentado as ações da Petrobrás com um excelente potencial de valorização, o qual, porém, não se concretiza, dada a percepção negativa dos investidores sobre o papel.

Caberia à administração da Petrobrás estabelecer regras claras para a política de preços dos combustíveis, que sejam de conhecimento de todos os investidores, para que estes possam avaliar convenientemente o risco de investir em papéis da companhia. A empresa precisa definir como ela deseja ser reconhecida pelo mercado: ser vista como uma empresa estatal, e, portanto, sujeita aos interesses da política monetária, ou como uma companhia de capital aberto, de economia mista, com boa governança corporativa e que dispensa tratamento equânime aos milhares de investidores individuais, aos representados pelos diversos fundos de investimento em ações ou ainda por aqueles que aplicaram seus recursos do Fundo de Garantia nos papéis da companhia.

.

© 1996/2004 - Hífen Comunicação Ltda.
Todos os Direitos Reservados.