.
Autor:
Manoel Messias da Silva
Qualificação:
Presidente da Central de Cooperativas de Crédito do Estado de São Paulo (Sicoob Central Cecresp)
E-mail:
[email protected]
Data:
20/08/05
As opiniões expressas em matérias assinadas não refletem, necessariamente, a posição do Empresário Online. Proibida a reprodução sem a autorização expressa do autor.

Cooperativismo de Crédito Ganhou mas Ainda não Levou

As mudanças na política nacional de acesso ao crédito, estimuladas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no início de seu mandato, alteraram o alcance do cooperativismo de crédito na sociedade brasileira. A edição da Resolução 3106/03 representou a retomada de uma trajetória interrompida na década de 60, quando o governo proibiu a formação de novas cooperativas de livre admissão e liquidou centenas delas. Porém, a Resolução completou dois anos no dia 25 de junho e ainda não apresentou resultados significativos para o setor.

Neste período, apenas 37 novas cooperativas obtiveram a liberação de funcionamento do Banco Central. Os números baixos não refletem falta de vontade do cidadão de se reunir em associações para garantir crédito mais barato. Muito pelo contrário. O Banco Central recebeu 187 processos de formação de cooperativas nos últimos dois anos.

Atualmente, só o Sicoob Central Cecresp (Central das Cooperativas de Crédito de São Paulo) está trabalhando em 19 projetos de constituição. Destes, 14 são para empresários que precisam de crédito para investir no seu negócio e vêem nas cooperativas uma forma menos burocrática e mais barata de conseguir financiamento. O BC recebeu ainda outros 155 pedidos de cooperativas que já atendem a um determinado público e pretendem ampliar sua base de associados.
Aponto dois motivos que explicam a tese do ganhou, mas não levou.

Um gargalo vem do Banco Central. As exigências atuais são semelhantes às da formação de um banco comercial e a verificação de documentos pode ultrapassar um ano. O BC argumenta que os entraves burocráticos visam assegurar a sustentabilidade das novas instituições financeiras. A intenção é positiva, sem dúvida, no entanto, a morosidade desmotiva os interessados. Afinal, quem precisa de crédito não pode esperar tanto tempo. Uma alternativa poderia ser a diferenciação das exigências conforme o porte das cooperativas - pequenas, médias e grandes. Ou a Cooperativa Central poderia pré-analisar e se responsabilizar pelos projetos de constituição. Após isto o Bacen expediria autorizações provisórias de funcionamento, agilizando o processo.

A partir de 4 de julho, atendendo a uma antiga solicitação do setor, passou a funcionar no BC um departamento para supervisionar exclusivamente as cooperativas e outros órgãos não vinculados a bancos. Ou seja, apesar da estrutura enxuta, o BC percebeu a necessidade de alocar pessoal especializado para atender o segmento. Agora, precisa ser mais criativo, e quem sabe, delegar às centrais de cooperativas uma parcela do processo de constituição e transformação de cooperativas, descongestionando o fluxo de processos.

Nossa Central foi considerada apta pelo BC a atuar na fiscalização e monitoramento das cooperativas. Supervisionamos o funcionamento das 196 filiadas, implementamos controles internos, promovemos auditorias e capacitamos dirigentes. Se o BC delegar mais tarefas, temos certeza que podemos ajudar. Afinal, cooperar é a nossa essência.

Outro motivo que dificulta o crescimento do setor vem da própria Resolução 3106, que impõe restrições para a constituição de cooperativas em municípios com mais de 100 mil habitantes. Infelizmente, a abertura promovida pelo governo não foi plena e a população das capitais e das regiões metropolitanas do país não tem acesso ao crédito via cooperativa. Para dar continuidade ao processo de flexibilização, o governo precisa rever esta norma.

O cooperativismo de crédito já esperou muito tempo: foram mais de três décadas de restrições. Ainda somos pequenos -1.430 empreendimentos respondem por menos de 2% da movimentação financeira do país, mas confiamos no potencial da cooperação para ampliar o acesso ao crédito a juros justos a mais parcelas da população.

Cooperativismo forte significa crédito com mais incentivos. Para transformar o Brasil numa nação cooperativista, o governo precisa promover ajustes. Entendo como prioridades a revisão da Resolução 3106/03, o aumento das possibilidades de financiamento com repasse do FAT via BNDES e o acesso ao desconto em folha para servidores públicos federais associados em cooperativas de crédito. Enfim, o governo precisa pensar em um modelo. Do contrário, o movimento crescerá desorganizadamente.


.

© 1996/2005 - Hífen Comunicação Ltda.
Todos os Direitos Reservados.