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Autor:
Marcos Venicio Sanches
Qualificação: Contador e sócio-diretor da BDO Trevisan
E-mail:
[email protected]
Data:
24/01/2008
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Legislação sem fronteiras

Bom começo para 2008. Nasce, após sete anos de gestação, uma lei que altera para melhor disposições da legislação societária e representa um passo fundamental para a convergência das práticas contábeis brasileiras ao padrão internacional de contabilidade – IFRS (International Financial Reporting Standards).

Foi longa e morosa a tramitação no Congresso Nacional do projeto de lei 3.741, apresentado em 2000, que agora, após sanção presidencial, transformou-se na Lei 11.638, que altera e revoga dispositivos das Leis de no 6.404 e 6.385, ambas de 1976.

Alguns dos principais avanços desta nova legislação referem-se à Demonstração dos Fluxos de Caixa em substituição à Demonstração das Origens e Aplicações de Recursos e à elaboração e divulgação da Demonstração do Valor Adicionado. Pela nova lei, as alterações ocorridas durante o exercício, no saldo de caixa e equivalentes de caixa, deverão ser segregadas em três fluxos: das operações, dos financiamentos e dos investimentos. Além disso, deve constar do documento a demonstração do valor adicionado como o valor da riqueza gerada pela companhia, a sua distribuição entre os elementos que contribuíram para a geração dessa riqueza, tais como empregados, financiadores, acionistas, governo e outros, bem como a parcela da riqueza não distribuída.

Entre outras alterações estão a criação da conta de Ajustes de Avaliação Patrimonial, no Patrimônio Líquido, destinada ao registro da contrapartida dos ajustes de determinados ativos e passivos a valores de mercado, inclusive os referentes a instrumentos financeiros; criação do grupo do ativo intangível; análise periódica compulsória da recuperação dos valores registrados no imobilizado, intangível e diferido; e ajuste a valor presente de ativos e passivos de longo prazo.

A nova lei se aplicará também às chamadas Sociedade de Grande Porte de capital fechado. Considera-se de grande porte as companhias caracterizadas por ativo total maior do que R$ 240 milhões ou receita bruta anual superior a R$ 300 milhões. Essas também terão que apresentar demonstrações contábeis segundo os mesmos padrões estabelecidos na Lei das Sociedades Anônimas e auditadas por auditores independentes.

As alterações proporcionadas pela nova lei causarão impacto não só nas empresas que deverão se adequar à legislação contábil, mas também nas empresas de auditoria que prestam serviços à essas corporações e no campo educacional. A carreira do contador sofrerá alterações. As faculdades e universidades, que formam o profissional de contabilidade, precisarão acrescentar aos currículos escolares uma disciplina que possa transmitir conhecimento específico sobre as normas internacionais para que o aluno, ao se formar, tenha condições de competir em nível de igualdade com profissionais que já atuam em grandes empresas. Atualmente, nenhuma escola forma o profissional que atende às exigências de uma grande firma de auditoria. Esse profissional é formado dentro da empresa e é muito cobiçado pela concorrência, o que valorizou, e muito, o passe do que vem sendo chamado de “auditor global”.

A economia brasileira só tem a ganhar com os reflexos positivos e conseqüências favoráveis da nova legislação. As qualidades e vantagens não se limitam ao impacto favorável na atração de investimentos. Não há dúvida de que padrões contábeis confiáveis e universalmente conhecidos, auditoria e melhor divulgação das informações proporcionam mais transparência, facilitam a análise de crédito, reduzem o spread bancário e os juros para o capital produtivo e possibilitam melhor acompanhamento da gestão. Além disso, essa transparência traduz-se em menor risco para o investidor, facilidade de acesso ao mercado externo e estímulo ao investimento estrangeiro no País.

Também está previsto que a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), o Banco Central e demais órgãos e agências reguladoras podem, por meio de convênio, adotar, no todo ou em parte, procedimentos e recomendações contidos em estudos técnicos de organizações com expertise e/ou dedicadas à pesquisa e divulgação de princípios, normas e padrões de contabilidade e auditoria. Assim, a nova lei abre a preciosa oportunidade de se agregar à prática, riquíssimo conteúdo advindo de instituições com reconhecida competência no ramo, em especial o CPC - Comitê de Pronunciamentos Contábeis.

No livro “O mundo é plano”, de Thomas L. Friedman, é clara a idéia de um mundo sem fronteiras. O Brasil não podia ficar de fora da trilha rumo ao círculo virtuoso e se manter com uma legislação anacrônica e inadequada no campo das práticas contábeis. Com a realidade de um mundo de negócios sem fronteiras, a aprovação da Lei 11.638 foi muito providencial. Em 2008 teremos muito trabalho.

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