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Autor:
Lívio Giosa
Qualificação: Vice-presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB), coordenador do Instituto ADVB de Responsabilidade Social e coordenador geral do Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE)
E-mail: [email protected]
Data:
24/08/06
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Hora de Descruzar os Braços

A sociedade brasileira, particularmente a paulista, tem assistido atônita às levas de ataques e violência urbana, comandadas pelo crime organizado, tanto na capital do Estado como nas cidades do interior. As causas evidentes deste verdadeiro atentado ao Estado de Direito são sobejamente conhecidas e à sociedade restou, entre perplexa e impotente, torcer para que as respostas das autoridades sejam suficientes para conter a violência e a afronta à cidadania.

No entanto, além dessas causas mais óbvias, já devidamente diagnosticadas, uma reflexão mais ponderada sobre o problema mostra que é preciso aprofundar o debate e, a partir de um mapeamento das origens profundas da violência, propor ações que, não sendo meramente reativas, ataquem a questão em seu núcleo.

Isto quer dizer que é necessário ir muito além das medidas de segurança, imprescindíveis, sem dúvida, para enfrentar neste momento a ponta visível do iceberg, e caminhar no sentido de impedir que o caldo de cultura que tornou possível o avanço do crime organizado a este ponto se reproduza nas gerações futuras.

Ou seja, é essencial que a sociedade como um todo descruze os braços e comece imediatamente a propor um modelo de sustentabilidade social, envolvendo parceiras público-privadas para atacar, desde logo, as condições que propiciam o aparente domínio do crime organizado.

Há hoje indicações mais do que claras de que a ausência de ações no passado recente estejam agora mostrando suas conseqüências. Por exemplo, o comando da polícia no Estado identificou uma “terceirização” dos atentados em São Paulo.

O famigerado PCC, segundo o próprio comandante-geral da Polícia Militar no Estado, incumbiu jovens de 18 a 20 anos de praticar as ondas de violência a que temos assistido. Ou seja, são esses jovens “terceirizados”, agindo a pé ou de bicicleta, usando gasolina e artefatos caseiros, que têm podido manter a diretriz do PCC de espalhar estrategicamente o terror.

Não se trata de nenhuma coincidência: este “exército” jovem, disposto a cumprir sem discutir ordens de organizações criminosas, está na mesma faixa etária do maior contingente de desempregados do País. Segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), estão desempregados no Brasil cerca de 45% dos jovens com idades entre 16 e 24 anos!

Este contingente tem as portas do mercado de trabalho fechadas por várias razões - e a econômica é apenas uma delas. Na sociedade atual, a empregabilidade depende basicamente do grau de educação, ou seja, de competitividade, que o indivíduo alcançou. Em outras palavras, o mercado, que absorve cada vez mais tecnologias sofisticadas, que eliminam os postos de trabalho ou buscam um profissional mais qualificado, exige alto desempenho profissional.

É tudo que o enorme “exército” de recrutas do PCC não tem. Fora da marginalidade sobra para esses jovens, se tiverem sorte, a economia informal. Conforme os dados da OIT, são essas as opções que restam a 93% dos jovens que deveriam entrar no mercado formal a cada ano.

Estes dados mostram que não dá mais para a sociedade assistir passivamente a tal esgarçamento do tecido social. É mais do que hora de iniciar ações baseadas em propostas como, por exemplo, as Oito Metas do Milênio, definidas pelas Nações Unidas para enfrentar questões como a fome e a miséria, assegurar educação de qualidade a todos, atuar no sentido de garantir condições mínimas de saúde, habitação e qualidade de vida.
A idéia é começar já - quando todas as feridas estão à mostra. E começar por São Paulo, implantando projetos que juntem parcerias público/privadas, programas de capacitação e qualificação, construção de metodologias para aferir os resultados sociais das ações. Cada município do Estado deveria ter seu banco de dados social, de modo que se implantasse uma verdadeira Inteligência Social, base para projetos utilizando Tecnologia Social de Sustentabilidade.

Um programa deste tipo, que poderia chamar-se “São Paulo Estado Socialmente Responsável”, buscaria mobilizar as comunidades, promovendo parcerias e alianças entre a iniciativa privada e prefeituras, ong’s, clubes de serviço, universidades, órgãos públicos estaduais e federais, entre outros.

Não há mais como esperar para agir. E o começo é abrir uma ampla discussão para dotar o modelo de sustentabilidade social das ferramentas, investimentos e apoios necessários. Levantadas às condições sociais de cada município, o programa teria um banco de dados sociais do Estado.

A partir daí, é arregaçar as mangas e começar implantando projetos-piloto em municípios e regiões da Capital em clara situação de risco social. Trata-se de um começo, mas a gravidade da situação mostra que é preciso agir de imediato para impedir algo até então impensável: todo um Estado e uma sociedade reféns do crime.

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