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Autor:
Alfried Plöger
Qualificação:
Presidente da Abigraf Regional São Paulo (Associação Brasileira da Indústria Gráfica) e da Associação Brasileira das Companhias de Capital Aberto (Abrasca), coordena o consórcio de exportação do setor gráfico
E-mail:
[email protected]
Data:
25/08/05
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A Desventura do Câmbio

No primeiro quadrimestre, superávit comercial do setor gráfico caiu 58,8%
A indústria gráfica brasileira, constituída por cerca de 15 mil empresas e empregadora de 200 mil pessoas, realizou imenso esforço articulado para reverter um déficit histórico de sua balança comercial setorial, que chegou a US$ 426 milhões em 1997. O resultado desse empenho, que abrangeu investimentos de US$ 6 bilhões em atualização tecnológica, máquinas e equipamentos, a criação de um consórcio de exportações no âmbito da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf) e a prospecção sistemática de mercados, começou a apresentar resultados efetivos em 2003, quando, pela primeira vez em 10 anos, registrou-se superávit, de US$ 73,7 milhões. Em 2004, novo resultado positivo, de US$ 100,7 milhões.

No entanto, toda essa mobilização do setor - que contou com o engajamento de numerosas gráficas, trabalho individual e coletivo das empresas, participação ativa do sistema associativo, verdadeira saga na busca de melhor qualidade e tecnologia de ponta - começa a ser seriamente ameaçada pela inconseqüência da política cambial do governo, dentre outros fatores. As exportações de produtos gráficos (abrangendo itens como cadernos, artigos de papelaria e embalagens, dentre outros) registraram preocupante redução entre os meses de janeiro e abril deste ano, em relação ao mesmo período de 2004. O montante das vendas externas no primeiro quadrimestre de 2005 foi da ordem de US$ 50,35 milhões, contra US$ 64,99 milhões nos quatro primeiros meses do ano passado, ou seja, uma queda de 22,5%.

Por outro lado, as importações aumentaram 5%, passando de US$ 36,9 milhões, nos primeiros quatro meses de 2004, para US$ 38,8 milhões, em igual período de 2005. Esta brusca alteração na performance do comércio exterior da indústria gráfica pode ser atribuída a uma série de fatores conjugados. Pode-se dizer que há um conjunto de variáveis contribuindo para um enfraquecimento do mercado externo. Contudo, não há como negar que a contínua valorização do Real ante o dólar acaba interferindo de forma significativa nas vendas externas. Com margens já reduzidas, as gráficas exportadoras lutam para preservar a sua receita, em um quadro cambial cada vez menos competitivo.

Exemplo do impacto da apreciação da moeda nacional encontra-se em levantamento da Associação Brasileira de Comércio Exterior, baseado nos dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Em março deste ano, houve queda do número de empresas exportadoras. Em comparação com o mesmo mês de 2004, nada mais, nada menos do que 259 companhias saíram do mercado externo. Há um ano era observada firme tendência de crescimento do número de empresas exportadoras no Brasil, mas os números evidenciam uma acentuada inversão no ritmo de crescimento. Cabe ressaltar que o patamar do câmbio costuma ser importante para as pequenas e médias empresas (perfil de mais de 90% das gráficas brasileiras), uma vez que as grandes acabam tendo capital para se proteger das perdas de receitas advindas da valorização do Real frente ao dólar.

É importante lembrar, também, que foi justamente o aquecimento do mercado internacional um dos fatores que possibilitaram ao Brasil um aumento de 30% nas exportações. Isto deflagrou um novo ritmo para a economia. Inegavelmente, o comércio exterior foi um dos combustíveis para a expansão em torno de 5% do PIB em 2004, a maior em dez anos, e para que os setores produtivos emergissem do enfadonho 2003. É interessante verificar que o crescimento inicialmente focado nos setores exportadores gerou demanda para os segmentos de bens de capital e outros voltados ao mercado interno, com o aumento do emprego e do consumo. Um ótimo exemplo foi o comportamento da indústria paulista, que teve expansão de (8,5%), conforme demonstrou o estudo Levantamento de Conjuntura da Fiesp.

Além do problema cambial, há outra variável que vem afetando as vendas externas de produtos gráficos: a competição exercida pela China, em importantes mercados de destino das exportações do setor. O caso de cadernos é exemplar. As exportações do produto situaram-se em US$ 9,89 milhões entre janeiro e abril de 2005, ante US$ 15,76 milhões em igual período do ano passado, com queda de 37,2%. Notou-se, ainda, redução das vendas externas no segmento de embalagens. Um dos principais produtos da pauta de exportação do setor gráfico são as caixas e cartonagens dobráveis de papel ou cartão não caneladas. No primeiro quadrimestre de 2005, as exportações do produto totalizaram US$ 4,8 milhões, contra US$ 19,7 milhões em igual período de 2004, com recuo de 75,4%. Caso as vendas externas de cadernos e dessas embalagens tivessem se mantido no mesmo patamar observado em 2004 - ou seja, sem crescimento -, as exportações totais do setor estariam registrando alta de 9,5%.

No que se refere às importações, verifica-se aumento no item "etiquetas impressas", de US$ 1,5 milhão, no primeiro quadrimestre de 2004, para US$ 2,8 milhões, em igual período de 2005. Outros produtos do segmento de impressos comerciais também vêm sendo objeto de crescimento das importações, como os calendários e manuais de distintos produtos.

Felizmente, ainda não se pode classificar o resultado do primeiro quadrimestre como tendência irreversível de 2005. Com certeza, há, além dos problemas mencionados, componentes sazonais no caso de alguns produtos, cuja curva de exportações ao longo do exercício ainda pode enveredar para o caminho da recuperação. No entanto, é impreterível que o governo abandone sua renitência com relação à política cambial, pois, mantido nos patamares atuais, o valor do Real ante a moeda norte-americana será empecilho muito grave para a competitividade dos produtos brasileiros no mercado externo.

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