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Autor:
José Matias Pereira
Qualificação:
Economista, Professor de Finanças Públicas da Universidade de Brasília e Doutor em Ciência Política
E-mail:
[email protected]
Data:
29/06/05
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A Prevalência da Função Social na Nova Lei de Recuperação de Empresas e Falências

É inegável para a economia brasileira a importância da entrada em vigor no começo de junho último da nova Lei de Recuperação de Empresas e Falências, Lei nº. 11.101, de 09 de fevereiro de 2005. A nova lei na medida em que busca viabilizar a continuação do negócio ou a preservação da empresa - vem corrigir uma falha existente na antiga lei falimentar aprovada em meados dos anos quarenta do último século - que primava em punir, além do empresário, a própria empresa que tinha as suas atividades encerradas.

Essa decisão judicial pelo seu caráter ultrapassado - provocava a deterioração dos ativos da empresa. Nesse jogo de soma menos um, onde na maioria dos casos perdiam todos, em especial os empregos que desapareciam, bem como as demais atividades que estavam interligadas à empresa no mercado.

O novo diploma legal que adotou nos seus princípios conceitos modernos, utilizados por países com legislações mais avançadas, como Espanha, EUA e França - vem corrigir uma séria distorção da antiga legislação, que não levava em consideração os valores intangíveis das empresas falidas. Com a decretação da falência desapareciam com elas suas marcas e seu nome comercial, que em muitos casos haviam sido construídos ao longo de décadas. Isso pode ser percebido em setores sensíveis como: aviação civil, bancário, siderúrgico, tecelagem, varejista, entre outros. Verifica-se que em distintos casos os nomes comerciais dessas empresas valiam mais que os seus passivos financeiros.

Com a nova lei tornou-se possível levar em consideração a viabilidade econômica da empresa em dificuldade, que irá permitir a aplicação de um plano que leve à sua recuperação. Ao criar a possibilidade de resolver as crises econômico-financeiras das empresas, a nova Lei de Recuperação e Falências busca evitar que ocorra o desaparecimento de unidades produtivas do país. Esse princípio está concretizado no artigo 47 da Lei que estabelece: "A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica".

É importante ressaltar, entretanto, que a prevalência do princípio da conservação da empresa não pode ser aplicada indistintamente para manter qualquer atividade econômica em funcionamento. A recuperação de uma empresa somente se justifica se os custos sociais e econômicos com a sua preservação forem menores do que sua rápida liquidação. Nesse sentido, podemos constatar que o novo diploma legal, no seu art. 75, teve essa preocupação: "A falência, ao promover o afastamento do devedor de suas atividades, visa a preservar e otimizar a utilização produtiva dos bens, ativos e recursos produtivos, inclusive os intangíveis, da empresa". Fica evidenciado, assim, que estará na dependência da viabilidade econômica da empresa em dificuldade a possibilidade de adotar-se um plano para a sua recuperação.

Isso não será uma tarefa fácil, visto que na busca de preservação da empresa teremos sérios interesses em conflitos, especialmente entre os credores. Isso está descortinado nos arts. 6, §4, 49 e 161 da nova lei, que permitem ao credor com garantias executar seus créditos, desde que ultrapassados os seis meses do processamento de recuperação judicial. Isso nos leva a concluir que, entre outros aspectos, para evitar que as empresas continuem a ser entes passíveis de serem descartados, os juízes terão que privilegiar nas suas decisões, os princípios da função social dos contratos e da boa-fé objetiva definidos no Código Civil.

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