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Autor:
Raul Corrêa da Silva
Qualificação:
Diretor da RCS Auditoria
E-Mail
[email protected]
Data:
07/09/04
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Família, Família, Negócios à Parte

Está na hora de os filhos assumirem o comando da empresa. Nada mais natural para quem representa uma espécie de continuidade da vida dos pais. A relação de parentesco pode inclusive ser um grande benefício e diferencial para a administração de um negócio, exatamente como pensam quatro milhões de empreendedores brasileiros. Em 65% desses casos, no entanto, a passagem do bastão virou sinônimo de ruína.

O negócio familiar pode ser entendido como a base do desenvolvimento da sociedade, correspondendo a 54% dos serviços no País, 12% do agronegócio e 34% da indústria. Mas de cada 100 companhias com essa estrutura, apenas 30 alcançam a segunda geração e cinco sobrevivem à terceira. Por que? Simplesmente porque não foram levadas em conta duas palavras fundamentais: competência e planejamento.

Uma empresa é um ser social e existe muito além dos seus donos. É desta maneira que ela tem de ser vista e o planejamento deve apresentar como ponto principal a sua perpetuação. No Brasil, essa cultura ainda não está disseminada, o que leva até companhias fortes ao fechamento depois de alguns anos.

O filho sempre planejou ser um músico e o pai acaba colocando-o para tocar uma fábrica, somente por considerá-lo a melhor pessoa do mundo. O provável perfil do herdeiro será o de alguém mal preparado, sem competências profissionais bem desenvolvidas e, o que é pior, sem fazer o que gosta. Você, como funcionário, se sentirá estimulado ao constatar que este pode ser o seu chefe?

Imaginemos se, além disso, outros parentes entram na história. Quando os filhos assumem a empresa dos pais, geralmente os respectivos cônjuges também passam a ter algum direito de propriedade. A companhia ganha vários donos e o controle administrativo está fadado ao fracasso. Passado algum tempo, a quantidade de sócios começa a incluir os primos, seus cônjuges e ex-cônjuges e os representantes das gerações anteriores. Isto sem falar nos casos onde há mais de um sócio fundador.

Este exemplo mostra claramente a necessidade de estabelecer regras claras para a participação de parentes. E se mesmo depois de minuciosas análises o empresário julgar o filho a pessoa mais gabaritada para substituí-lo, a dica é antes deixá-lo se fazer sozinho, no mercado, em outra empresa. Meu filho, por exemplo, trabalha em um concorrente. Se ele vier para cá prematuramente, provavelmente vou “matá-lo” no sentido profissional, ainda mais se lhe der um bom salário.

Nas empresas familiares, as questões emocionais são muito mais fortes. Portanto, quanto antes as regras sucessórias forem estabelecidas, melhor. É na condução adequada deste processo que está a chave do sucesso. É dever do dono conduzí-lo, não pondo em risco o que mais preza - a sua família e sua “criação”/empresa.

O mais razoável, antes de tudo, é buscar um aconselhamento profissional (mentoring), isento de influências corporativas e familiares, mas abrangente nos aspectos jurídicos, organizacionais, de relações humanas e até psicológicos. A implementação planejada de um family office facilita muito o processo, desde que a equipe de consultoria de suporte agregue esta somatória de competências.

Planejar a sucessão familiar requer também iniciativas como a criação de um “conselho de família”, onde alguns membros representarão os interesses do conjunto. Outra recomendação é estabelecer um acordo formal com direitos e deveres dos herdeiros, quer trabalhem na empresa ou não.

Para que o papel de “filho do dono” seja garantia de credibilidade, o herdeiro certamente precisa passar por baterias de treinamentos e uma preparação profissional criteriosa, sem receber o bastão gratuitamente. Tudo isso sob o monitoramento de um Conselho Consultivo ou de Administração. A sucessão também deve ser empregada tendo em vista a diluição natural dos laços sangüíneos, evitando assim a fragmentação do controle decisório/ administrativo e as disputas pela liderança do negócio.

Mas que tal, ao contrário disso, colocar o sucessor nos quadros funcionais só depois da morte do dono? Da mesma maneira que ele não pode ser inserido imediatamente em um cargo estratégico de comando, o filho não deve atuar simplesmente em qualquer função ou como um mero observador. Possibilitar que ele siga carreira especializada em determinada função é mais um atalho para a derrocada. E se houver outros sucessores, jamais os mantenha em funções de assessoria. A confusão estará armada.

Afetividades à parte, a família em um negócio pode ser um “tiro no pé”. Uma empresa familiar, com imagem positiva perante o mercado, fornecedores, clientes e parceiros, certamente teve sua estrutura de sucessão bem delineada. E o mais importante: quem faz o que gosta, com preparo e dedicação, sempre será bem sucedido em qualquer empresa.

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