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Brincando de Fazer Negócio

Sesi e Sebrae-SP somam esforços para ensinar crianças a empreender na escola

Aprender apenas matemática, português, ciências e as outras disciplinas previstas na grade curricular do ensino fundamental deixou de ser suficiente para o cidadão que vai construir o futuro. Além de todo o conhecimento básico que uma escola pode e deve oferecer aos seus alunos, é preciso sempre levar em conta as mudanças estruturais que vêm transformando a sociedade e o mercado de trabalho. Atualmente, as possibilidades de ingressar em uma boa empresa e prosperar na carreira são cada vez menores. Além disso, várias profissões deixarão de existir a curto prazo, em razão da automação de numerosas atividades que ainda hoje mantêm muitas pessoas empregadas. Nesse cenário de incertezas e de profunda insegurança, é melhor não perder tempo e tratar de preparar as crianças também para o empreendedorismo. Essa foi a iniciativa do Sesi e do Sebrae-SP que, em conjunto, buscaram fomentar desde cedo o gosto pela livre iniciativa (ver box).


Ana Lúcia aprova a locadora de gibis organizada pelos jovens empreendedores

Em setembro do ano passado, seguindo a vertente do projeto Empreendedorismo Para o Ensino Fundamental, o Sebrae-SP entrou em contato com os responsáveis pelos centros educacionais do Sesi para implementar um programa junto aos alunos do ensino fundamental, tendo em vista dar a eles os princípios básicos da abertura de um negócio. Após a aprovação, foi escolhida a unidade de número 71, localizada no bairro do Sumaré, em São Paulo, assim como foram selecionados os professores que receberiam o treinamento, com duração de dois dias, para aplicar os conceitos em sala de aula de forma prática e estudar as apostilas que seriam distribuídas aos alunos gratuitamente, levando a uma dinâmica diferente a cada passo. Antes de dar início ao curso, a direção da escola convidou os pais de todas as crianças que iriam participar das atividades, com o objetivo de colocá-los a par das intenções das entidades. "Eles ficaram entusiasmados, e a aceitação foi grande", recorda Ana Lúcia Zapparoli, assistente de coordenação da unidade, que acompanhou todo o processo. Segundo ela, o Sesi entrou com uma verba de R$ 1 mil para a compra dos materiais necessários ao curso e para as refeições, pois os alunos deveriam freqüentar um turno adicional para desenvolver os trabalhos. Já a escola cedeu o espaço físico e a associação de pais e mestres colaborou com a compra das mesas do refeitório, que também foram aproveitadas em outras aulas.

    A implementação do projeto, que durou de setembro a novembro de 2000, abrangeu várias faixas etárias, pertencentes a diferentes fases de escolaridade, tendo começado pelos dois primeiros anos do ciclo I, equivalentes às antigas primeira e segunda séries. Luciane Guedes Nascimento, professora responsável pelas turmas, conta que os alunos se dedicaram muito às duas propostas de criação de negócios: O Doce Mundo das Balas e O Mundo do Faz de Conta. Para ela, o trabalho desenvolvido no decorrer dos encontros foi decisivo para o bom resultado da inauguração da Balamania e, no balanço final, todos se surpreenderam com a quantidade de elementos que conseguiram absorver sem perceber, realizando-se na divisão dos lucros. "De maneira lúdica e natural, eles foram aprendendo o conteúdo, a organização, o planejamento e a responsabilidade que tudo isso envolve", observa. De acordo com ela, o importante é que nada seja imposto, mas sim que o interesse e a criatividade sejam estimulados. Também a Toy’s World ou Mundo do Faz de Conta gerou bons resultados, uma vez que os alunos se dedicaram à confecção de brinquedos de sucata, máscaras, enfeites, conseguiram doações de jogos, enfeitaram a loja e até ensaiaram dramatizações.

Para Luciane, ninguém sabe o que espera essas crianças no futuro e, mesmo que elas não venham a desempenhar o papel de empreendedores, já são pessoas enriquecidas pela oportunidade de vivenciar essa experiência, mais conscientes de tudo aquilo que envolve o mundo do comércio e a sociedade. "Além disso, o simples fato de esses estudantes terem-se preparado para trabalhar de forma autônoma algum dia, recebendo a noção de preço, a idéia de coletividade e de divisão de lucro, adiciona nova visão no caso de optarem por abrir um negócio mais adiante", acrescenta. A professora resume o sucesso da empreitada na frase do pequeno Vinícios, aluno da segunda série na época da aplicação do projeto: "Achei superinteressante o trabalho, porque nós aprendemos a ser homens de negócio e a lucrar com isso".

Oficina e show room ensinam a reciclar papel

Andréa Lúcia Gadelha do Nascimento, professora responsável pelas turmas dos dois primeiros anos do ciclo II, equivalentes às antigas terceira e quarta séries, conta que as crianças receberam os conceitos básicos do empreendedorismo e conseguiram perceber o que poderiam fazer e até onde poderiam chegar com a montagem da feira Praticando a Natureza e com a criação da Locadora de Gibis. "A primeira experiência forneceu uma visão ampla de como vender frutas, verduras e legumes, enquanto a segunda exigiu uma atenção maior na elaboração dos catálogos das revistas que eles mesmos trouxeram de casa, no cadastro de clientes e na distribuição de funções", relata.

Ainda segundo ela, tanto na inauguração da feira livre quanto na abertura da locadora aos alunos e pais de outros períodos da escola, houve muito empenho de todos em querer aprender e colocar em prática os conceitos sobre preço, custos e até sobre ecologia, vistos durante as aulas expositivas. "Os estudantes absorveram tudo e viram que a venda é um processo lento, tem que fazer pesquisa, planejamento", observa. Na opinião de Andréa, trata-se de uma iniciativa fundamental que prepara os futuros cidadãos para o mercado de trabalho. "Como não sabemos se eles vão conseguir bons empregos quando precisarem inserir-se profissionalmente, temos que dar também essa noção de que é possível investir em um negócio próprio, de forma que isso venha a ser mais uma opção de vida", acredita.

    O primeiro ano do ciclo III, a antiga quinta série, esteve a cargo de Milene Pereira Ramos, professora de ciências da unidade. Em conjunto com os alunos, foi escolhida a montagem da pequena confecção de relógios Quem Sabe Faz a Hora e, a partir disso, houve um esquema de orientação passo a passo no que se refere aos fornecedores, à clientela e aos procedimentos de propaganda e marketing do negócio. "O sucesso do produto foi tão grande para os próprios alunos, que muitos nem queriam vender as peças depois de prontas, mas, mesmo assim, montamos a loja e conseguimos negociá-las", conta a professora. Ela ainda salienta que, se houvesse uma continuidade, algumas dessas empresas simuladas teriam condições de continuar funcionando, porque os jovens conseguiram desenvolver o tino comercial, atingindo seus objetivos e obtendo bons resultados. "Isso seria excelente, já que muitos desses alunos terão dificuldade para cursar uma faculdade e garantir uma vaga no mercado de trabalho", avalia. "Com base em experiências dessa natureza, eles conseguem ter uma perspectiva de futuro e vislumbrar uma luz no fim do túnel", complementa.

Outro trabalho bem-sucedido foi o Show Room do Papel Reciclado, organizado pela turma do primeiro ano do IV ciclo, antiga sétima série, sob o comando da professora Maria de Lourdes Munhoz. Segundo ela, os alunos participaram ativamente dos encontros, aprendendo as técnicas de fabricação de papel e da montagem de slogans publicitários para mobilizar a atenção dos clientes. Com isso, conseguiram não só inaugurar suas empresas como também receber diversas encomendas, tendo que fazer hora extra na escola para entregar a mercadoria. "Fiquei emocionada ao vê-los buscando desesperadamente dar conta da clientela", relata a responsável pelo projeto.

    A visão das entidades

    O projeto Empreendedorismo Para o Ensino Fundamental promovido pelo Sebrae-SP tem como objetivo desenvolver uma cultura empreendedora, necessária à inserção do cidadão no mercado de trabalho, em razão das constantes transformações econômicas e das novas tecnologias, que fazem desaparecer e surgir profissões. A parceria com o Sesi busca sensibilizar os alunos sobre questões atuais que envolvem a compreensão de vantagens, dificuldades e possibilidades de criar e desenvolver pequenos negócios, atentos à função da propaganda e marketing como estratégia de efetivação e sucesso do empreendimento. "Esse projeto propicia também o desenvolvimento de habilidades e competências indispensáveis à formação do aluno/cidadão nas várias fases de evolução do programa e amplia o âmbito de ação do processo de ensino e aprendizagem, vindo ao encontro de conteúdos desenvolvidos no tema transversal Trabalho e Consumo", acrescenta Luís Carlos de Souza Vieira, superintendente operacional do Sesi/Senai.

    Segundo ele, foram obtidos resultados positivos no que diz respeito à mudança de postura de alguns alunos, estreitando os vínculos entre alunos/professores/pais/escola, à valorização do patrimônio escolar e à efetiva participação na realização de atividades propostas. Nos depoimentos de professores, alunos e pais, houve significativa manifestação de pais, proprietários de pequenos estabelecimentos comerciais, que relataram maior interesse dos filhos nos negócios, bem como de sugestões para melhorá-los. "No decorrer dos trabalhos, buscamos impulsionar o desenvolvimento de competências e habilidades como iniciativa, planejamento, organização, responsabilidade, criatividade, desenvoltura, colaboração, respeito às opiniões do grupo e avaliação dos resultados", observa Vieira. "Nas unidades que tiveram o projeto-piloto, estaremos assegurando a continuidade do projeto por meio do incentivo aos alunos em seus empreendimentos, possibilitando a eles apresentar e comercializar seus produtos nos eventos, campanhas e festividades da escola", esclarece.

    Também de acordo com Marcelo Duarte, consultor técnico da Unidade de Educação e Desenvolvimento da Cultura Empreendedora do Sebrae-SP, o projeto repercutiu de forma bastante favorável, fazendo com que houvesse maior integração da comunidade no dia-a-dia da escola. "Os alunos melhoraram o seu desempenho nas matérias curriculares, ficaram mais interessados pelos estudos, enquanto os professores deram conta de que também podem realizar empreendimentos, inclusive na área da educação", destaca. Ele ainda acredita que a comunidade como um todo percebeu que um trabalho como esse possui uma importância fundamental para o desenvolvimento regional.

    Vieira informa que o Sesi está estudando a reestruturação do projeto para que se possa realizá-lo com um custo menor (hora extra de professor para capacitação e desenvolvimento do programa, refeição do aluno, material didático, matéria-prima para o empreendimento), o que viabilizaria a sua manutenção nas escolas-pilotos para que se dê oportunidade aos alunos de vivenciarem as várias etapas do programa e a implementação de um número maior de unidades escolares. Já Marcelo aposta em parcerias com os setores público e privado. Nesse sentido, a comunidade pode colaborar por meio de parcerias e patrocínios para o fornecimento dos materiais, com a abertura de espaços para exposição e venda dos produtos empreendidos. Pais empreendedores que possuem estabelecimentos comerciais ou industriais podem promover uma visitação, visando estimular os estudantes com vivências práticas e significativas.

    "Ao participar desse programa, nós vislumbramos a melhora de qualidade de vida, o aumento da renda familiar, organização dos estabelecimentos comerciais e industriais, desde o processo de produção até o atendimento aos clientes, aperfeiçoamento da mão-de-obra, contribuindo para a evolução e o progresso da comunidade local e, conseqüentemente, da sociedade como um todo", declara o superintendente do Sesi/Senai. O representante do Sebrae-SP leva em conta fatores como a globalização, a questão da empregabilidade e a qualificação profissional, promovendo a geração de postos de trabalho e renda por meio do desenvolvimento de novos negócios. "Preparamos crianças e jovens para o mercado de trabalho não só na criação de uma empresa mas também como indivíduos mais qualificados e preparados para o futuro", complementa.

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Publicado na Revista Sala do Empresário - Edição nº 19
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