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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 428 (18/06/2000)

Mantenedores da Pobreza

É muito fácil criticar aqueles que, por iniciativa própria, buscam dar dignidade e perspectiva de vida para os milhares de menores que lutam nas esquinas das grandes cidades brasileiras para sustentar suas famílias. Basta alegar os direitos universais da criança à educação e ao lazer, além de condenar qualquer tipo de envolvimento com o trabalho. No entanto, esse discurso de nada adianta na prática e só faz manter a situação atual, sem que nada possa ser alterado, a não ser a quantidade de instituições que se julgam detentoras oficiais das ações voltadas para o bem-estar infantil. A realidade social mostra que não existem fórmulas prontas para solucionar esse problema, o que torna válida toda tentativa bem-intencionada, como foi o Projeto Realidade, idealizado em 1996 pela empresária, economista e escritora Míriam Lee, na época uma das diretoras da Fiesp. Em depoimento exclusivo, ela conta como desenvolveu sua proposta inédita de ensino e fala das dificuldades encontradas para manter o projeto que, até hoje, desperta o interesse da mídia e o entusiasmo de quem acredita que pode dar a sua contribuição à sociedade.

TORTURA
"A infância representa uma fase de muito sofrimento para qualquer criança, carente ou não. Todo mundo à sua volta é maior do que ela, impondo autoridade de uma forma ditadora e podendo provocar situações de profunda humilhação. A forma mais generosa de lidar com a criança é, em primeiro lugar, ouvi-la e depois, dentro do mais estrito senso de honestidade, proporcionar independência para que ela possa pensar com a própria cabeça. Existem adultos que passam o resto da vida sem saber que são capazes, porque viveram um período enorme sem entender aquilo que era dito para eles, uma vez que nada do que dizem ou ensinam tem a ver com os interesses da criança. Foi com a intenção de me aproximar desses interesses que comecei a me envolver com os menores que trabalhavam nas ruas próximas da Fiesp. Algo fundamental que as pessoas não entendem é que eles se sentem parte responsável da família e têm orgulho disso, não são marginais. A mãe conta todos os problemas para eles, e a sociedade traduz isso como se ela estivesse abusando dos filhos."

PROJETO PILOTO
"Por meio da utilização de bonecos que representavam os vários setores da sociedade, comecei a ensinar princípios básicos de economia para as crianças e pedi aos empresários mercadorias que estavam encalhadas, em ponta de estoque, com o objetivo de montar uma feira nos finais de semana, para que elas aprendessem noções de custos e passassem a negociar diretamente com os fornecedores num segundo momento. Isso aconteceu durante três meses, no ano de 1996, com a participação de quarenta crianças em um galpão no Brás, emprestado pela minha família. A idéia era fazer com que o projeto caminhasse sozinho, pois observei que esse tipo de iniciativa não precisava de professor. Da mesma forma que os menores aprendem as coisas ruins na rua, aprendem as boas também. Era só ensinar os mais espertos, que eles iam passando para os demais na linguagem própria deles. Todos querem dinheiro, e como essas crianças não têm e nunca terão lugar na sociedade, essa seria uma forma de ajudá-las a montar o espaço delas."

PAROU POR QUE?
"A criança sem dinheiro virou um mercado. Com o propósito de cuidar desse problema, foram criadas várias fundações e instituições que ajudam uma parcela mínima de menores com um absurdo de dinheiro que entra para sustentar toda a estrutura que se forma em torno disso. Na verdade, esses programas acabam criando cidadãos eternamente dependentes, esperando a vida inteira que se faça alguma coisa por eles. São os donos da pobreza e da dependência e, o que é pior, não existe uma vírgula de generosidade, pois dar algo para alguém é a mesma coisa que dizer que esse indivíduo é incapaz, é comprar o seu orgulho, e quando ele vende seu orgulho não sobra mais nada. O Projeto Realidade parou justamente porque ia na contramão de tudo isso, baseado na proposta da independência e no compartilhamento do conhecimento de forma livre e fácil. Quem sabe ele pode ser reavaliado e retomado hoje por pessoas generosas e mais seguras de si mesmas? Eu estarei sempre pronta e disposta a colaborar para levar essa iniciativa adiante."


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