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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 42 (21/01/1993)

Modelo Muda Depois do Susto

Demitir pessoalmente quinhentos funcionários foi uma terrível experiência para o presidente executivo da fábrica de parafusos Metalac, Cláudio Araújo Peçanha. Mas essa cirurgia - que terceirizou departamentos inteiros, como o restaurante e a assistência médica - tornou-se vital para adaptar a empresa à realidade da recessão econômica e salvar o emprego dos 438 funcionários que ficaram, hoje responsáveis pelo mesmo volume de produção da fase imediatamente anterior à crise.
Coragem de decidir e preparo teórico são os dois vetores do perfil desse engenheiro e economista, que implantou na Metalac - que divide 47% do capital com a multinacional americana SPS Technologies - uma gestão administrativa baseada na participação, na transparência e no incentivo. Em depoimento exclusivo para esta seção, Peçanha - de tradicional família política do Rio de Janeiro - propõe o fortalecimento do modelo administrativo forjado pelas dificuldades dos últimos dois anos.
Ele está plenamente convicto de que a indústria brasileira saiu fortalecida das turbulências, tornando-se mais enxuta, ágil e produtiva. Tendo trabalhado nos dois lados do balcão, com larga experiência na administração pública - como diretor executivo do BNDES, por exemplo - e privada - Hidroservice, Coopersucar -, sua receita determina o fim do gigantismo estatal em todos os níveis, principalmente o financeiro, e o alargamento da ação do capitalismo e do mercado.
Para que isso aconteça, em sua opinião, é preciso que o empresário brasileiro abandone os vícios de origem - financiamentos com juros subsidiados, perdão de dívidas, dependência total do Estado para qualquer tipo de atividade, espécie de um original capitalismo "marxista", que faz do Brasil um país parecido com a Rússia, com uma diferença fundamental: "Lá, o programa de privatização está relativamente muito adiantado", adverte Peçanha.

SOU UM EXECUTIVO PROFISSIONAL ASSUMIDO

"Os dois sócios fundadores da Metalac retiraram-se para o Conselho e colocaram-me na presidência. Minha profissão é ser um executivo profissional e não sinto necessidade de ser acionista. No Brasil, existe preconceito contra isso, pois, aqui, as pessoas são formadas para gerir seu próprio negócio. A idéia é de que os bem-sucedidos acabam montando sua empresa, enquanto quem fracassa vai trabalhar no Estado.
A evolução do executivo é recente na formação empresarial brasileira. Eu me considero um empreendedor dentro da empresa que dirijo e aceito até o título de empresário, porque atuo como empresário em todas as etapas do processo."

O SEGREDO NÃO É A ALMA DO NEGÓCIO
"Não existe modelo brasileiro, americano, sueco ou japonês de administração. O que existe é um modelo aberto de gestão, com um conjunto de informações que são disseminadas e passam a ser usadas internacionalmente. Cada vez mais, a indústria deixa de pensar que o segredo é a alma do seu negócio.
Hoje, é comum a troca de experiências, as visitas às fábricas dos concorrentes. Antigamente, não se concebia esse comportamento. Chegou-se à conclusão de que o mais importante não é o processo produtivo, mas a gestão do processo e que todos possam ganhar com isso. Numa visita a Detroit de fabricantes brasileiros de autopeças comprovei essa preocupação na prática. Nesse grupo, a palavra de ordem é modernização, novas técnicas de gestão, conquista de prêmios de qualidade e necessidade básica de sermos competitivos."

DESBUROCRATIZAR É SIMPLES

"Dentro da Metalac, a filosofia básica é essa: disseminação da informação global. O funcionário sabe que faturamos US$ 18 milhões por ano e, se tem dúvidas contábeis, nós explicamos. Tudo é feito na maior transparência, com uma mentalidade aberta, sem controle burocrático. Se alguém precisa falar com outra pessoa, levanta e vai até ele, não manda memorando.
Existe uma comissão de representantes de funcionários, eleita democraticamente pelo voto secreto e com mandato de dois anos. Não se trata de uma assembléia, pois quem decide sou eu. Mas consigo decidir questões, como reajuste salarial, ouvindo os representantes. Esse grupo recebe, mensalmente, da própria voz do presidente informações sobre vendas, clientes, faturamento e lucro. Em assuntos mais polêmicos, como ameaça de greve, reúno todos os empregados numa praça no meio da fábrica e coloco-me à disposição para qualquer pergunta.
Nosso programa de gestão chama-se SIMPLES - Sistema Integrado Metalac de Produtividade, Lucratividade, Excelência com Segurança. Cada item tem uma meta, como reduzir os acidentes a zero ou dobrar o lucro. Nós reduzimos os diretores, e hoje a empresa é administrada por uma reunião gerencial que todas as semanas repassa cada uma dessas metas. O conceito é o seguinte: se o funcionário se sentir mais livre e motivado, vai produzir melhor. Não é nenhum paternalismo. É um princípio de administração: com liberdade, bem-informado, bem tratado, ele vai produzir mais, e a empresa terá mais lucro."

MODERNIZAR É MUDAR A CABEÇA DO EMPRESÁRIO -
"Hoje, o presidente de uma empresa leva muito mais tempo tentando ver com sua gerência a melhor forma de reduzir custos e melhorar a qualidade do que pegando avião para ir a Brasília falar com ministro. Modernizar não é comprar máquina de última geração, é mudar a cabeça do empresário em relação ao seu próprio empreendimento.
É preciso ter consciência de que o nosso desenvolvimento não vai acontecer mais com o controle estatal sobre nossas atividades. No fundo, é um problema ideológico: o empresário brasileiro era o maior instrumento do marxismo econômico. Por mais que se autoproclamasse capitalista, no fundo, ele era um instrumento do Estado. O governo controlava preços, exportação, financiamentos e ainda se tornava o principal cliente.
A Metalac também beneficiou-se dos empréstimos do BNDES, mas investiu tudo no próprio empreendimento e pagou toda a sua dívida, cumprindo religiosamente seus compromissos fiscais."

TODA EMPRESA TEM QUE TER UM LÍDER -
"Uma empresa não pode ser administrada se não existe sobre o funcionário uma avaliação do desempenho que pode levá-lo à demissão. Numa empresa pública, o princípio da estabilidade gerou um inchaço violento, pois o ineficiente não perde o emprego e o eficiente deixa de ter qualquer forma de incentivo. A estabilidade e a isonomia salarial levam à improdutividade total.
É impossível querer transformar uma empresa que não tem dono. O conceito de que o povo é o dono das estatais é bonito para escrever no jornal ou numa tese de mestrado. Toda empresa tem que ter um líder, e este precisa estar comprometido com resultados.
O grande imbroglio da economia brasileira foi provocado pelo modelo estatizante, que gera inflação a mais de 100% ao ano há mais de dez anos. Na Rússia, a situação é parecida, só que eles não pagavam com inflação, mas com filas. Agora, eles estão com nossas características, inclusive com maior número de espertos."


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