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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 84 (14/11/1993)

Ousadia no Mercado de Lingerie

Roupa íntima feminina é vendida com apelos fortes, aparentemente anticonvencionais. Mas as consumidoras sabem que acontece exatamente o contrário. As peças são confeccionadas sempre nos mesmos padrões, nos moldes que a publicidade determinou como sendo o corpo ideal de mulher. Só que esse modelo nem sempre bate com a realidade, e muita gente sem as medidas ideais fica sem produtos confortáveis, bonitos e com preços acessíveis.
O motivo desse descompasso talvez seja o domínio excessivo de homens em pontos-chave do setor e a distância que as grandes empresas cavaram em longos períodos de hegemonia. Isso tudo costuma afastar a indústria das necessidades das suas clientes. Marta Leal Neves esbarrou nesses problemas tanto na época em que era apenas uma compradora quanto agora, que possui a Violet Confecções, microempresa situada na zona central de São Paulo.
Quando tentava comprar peças íntimas, não conseguia encontrar o que queria e ouvia a mesma queixa de suas amigas ou de outras freguesas nas lojas que freqüentava. Depois que entrou para o ramo, viu que os compradores nos pontos-de-venda eram homens, os vendedores também, quem vendia as máquinas para a indústria a mesma coisa e, o mais importante, eles estavam também no comando na maioria das empresas especializadas.
Resolveu, então, atrever-se a criar uma nova modelagem, baseada nas medidas de pessoas reais. Viu que o número para uma calcinha pode ser diferente do número de um sutiã, por exemplo. E que muita gente acostumada a comprar tamanho médio - porque é dominante no mercado - precisava era de medidas maiores, mas que não atentassem contra a estética. Ao mesmo tempo, resolveu oferecer qualidade de primeira a preços três vezes menores.
A seguir, ela conta como está conseguindo impor-se num segmento considerado de alto risco, graças a sua estratégia de inventar um caminho próprio, fabricando roupas íntimas adequadas ao gosto e às necessidades de quem compra, e ao apoio do SEBRAE/SP.

CONCORRENTE GRANDE NÃO ME ASSUSTA
"É difícil vender o produto, quando você é microempresa. Quando comecei, em fevereiro deste ano, fazia só calcinha e sutiã, nos moldes conhecidos. Senti dificuldade de entrar nas lojas, em São Paulo, e tive que ir para o interior, onde consegui colocação. Mas resolvi enfrentar os preconceitos. Primeiro, internamente, pois precisei desfazer a sociedade para poder seguir meu caminho.
Insisti em fazer peças com matéria-prima de qualidade. A lycra que eu uso é a mesma das grandes grifes. Depois, para mudar a modelagem e começar a confeccionar roupas com medidas maiores, de 46 para cima, tive que comprar máquinas e adequá-las ao que queria. Hoje, posso fazer produtos com acabamento de qualidade, sem usar o maquinário das grandes indústrias.
Foi uma das soluções que eu encontrei com muito esforço, pois comecei sem saber de nada. Mas meus produtos estão tendo aceitação, e as pessoas já começam a exigir a marca Violet, pois um dos cuidados que eu tive foi fazer roupa bonita para pessoas não magras, peças que seguram barriga ou busto muito grandes. Por que só quem é magra pode vestir-se com conforto ou usar lingerie com um toque de sedução?
A roupa que eu faço é para qualquer tipo de mulher, e isso garante o sucesso. É por esse motivo que não temo os grandes concorrentes, pois eles estão distantes dessas consumidoras. Quando você cresce, enche-se de assessores, gerentes e outros funcionários, que acabam decidindo por você ou impedindo que se tenha acesso ao que o mercado realmente precisa. Já me queixei de empregado de loja que não me deixa falar com o dono. Por que não deixam o chefe decidir? É assim que eles vão perdendo contato e abrindo brechas para as pequenas indústrias. Quando minha empresa crescer, vou tratar todo mundo da mesma maneira, grande ou pequeno cliente. Pois você só cresce com os pequenos, não com os grandes."

OS ANÚNCIOS SÃO DIRIGIDOS AOS HOMENS

" Quando anunciam roupa íntima de mulher, colocam a modelo de bruços, sem sutiã, numa posição insinuante. Isso, naturalmente, não funciona para a mulher. Custei a me fazer entender com o vendedor de máquinas, que era homem e, no fundo, não conhecia os detalhes das peças. Também tive que contratar vendedor homem, pois são os homens que compram nas lojas, em sua maioria. Numa reunião recente com empresários do setor, só havia duas mulheres.
Eles não levam em consideração que a maioria das brasileiras tem quadris largos e seios pequenos. Precisei fazer ajustes na modelagem para ampliar as opções, pois, no padrão tradicional, nem três regulagens dão conta das nuanças do corpo. Há detalhes nas medidas das costas das mulheres que podem mudar tudo. É nisso que presto atenção, para poder acertar.
Comecei fazendo 1,2 mil peças por mês e já estou atingindo 5 mil. Fabrico, hoje, 22 itens, como conjuntos, camisolas, baby-dolls, short-dolls, entre outros. Meu preço é calculado na quantidade de peças que posso fazer por metro de matéria-prima. Mas ainda não estou satisfeita totalmente: quero aprimorar mais o que faço, para consolidar minha marca como aliada das consumidoras."

NÃO REVISTO MINHAS FUNCIONÁRIAS -
"O mercado é preconceituoso. Querem gente morando próximo à fábrica, não querem negros nem nordestinos. Isso acontece em tudo que é setor. Tenho contratado pessoas de cor e gente vinda do Nordeste. Estou supersatisfeita. Elas trabalham com disposição e com grande senso de responsabilidade. Não costumo revistar a bolsa de ninguém nem pedir que levantem a saia. E também não desconto, quando há atrasos eventuais.
Aqui, o funcionário tem liberdade de apontar os erros, pois, para uma empresa ir bem, é preciso que haja um bom entrosamento. Eles sabem que tudo o que ganhamos é reinvestido aqui mesmo, principalmente em matéria-prima e novas máquinas.
Hoje, eu tenho uma pessoa para cuidar da produção, mas a administração e as vendas são direto comigo. Já vendi livros, o que é dificílimo, e já trabalhei duro como cabeleireira ou mesmo como empreendedora informal, vendendo comida na praia. Acho que o esforço está valendo, pois, em menos de um ano, já consegui muitas vitórias. Há um grande mercado para ser explorado, e estou disposta a enfrentar essa barra. Não tenho nem o segundo grau completo, mas existem coisas que estão no sangue. Muita gente formada em Administração de Empresas não consegue ter sucesso na gestão de uma firma.
Depois de tantas dificuldades, resolvi passar adiante as informações que consegui, pois eu acho que tem lugar para todo mundo no mercado. Quem for bom fica, quem não tiver competência fecha."


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