Confecção Cria Soluções para a Crise
O segredo da camisa
chinesa é revolucionar o conceito de "qualidade". Basta observar
o colarinho, a embalagem e a etiqueta, que são considerados impecáveis.
Acrescente-se um preço imbatível - R$ 10 em média
-, e está criado o problema para as confecções brasileiras.
Mudar toda uma cultura empresarial já era uma tarefa difícil,
mas o processo foi acelerado pela ressaca econômica do Plano Real.
Como enfrentar, além da pressão estrangeira, a inadimplência
dos consumidores? A empresária Rosana Calvó Sala Leite, da
Confecções Confevia Ltda. - Tel.: (11) 5181-0818 -, teve que
suar para enfrentar esse tipo de armadilha. Herdeira de uma indústria
fundada em 1963, especializada em camisas e que hoje possui sete lojas de varejo,
ela arriscou alto para, primeiro, salvar o patrimônio dos próprios
erros internos e, depois, enfrentar a concorrência na maré alta
da abertura comercial. Baseada em sua experiência, ela dá, a seguir,
uma breve aula de sobrevivência.
QUEM NÃO USA UMA VANTAGEM PARA OBTER OUTRA DANÇA
"Meus pais - Francisco e Anita - possuíam uma banca de
roupas na feira. Um dia, apareceu um marreteiro do Ceará que trazia num
saco camisas prontas e vendeu tudo rapidinho. Aquela visão fez com que
camisas prontas passassem a fazer parte dos produtos vendidos. Depois, com o
apoio do meu avô, a banca virou uma lojinha na Av. Santo Amaro. Camisas
vendiam bem, até que nosso fornecedor mudou para o interior e resolveu
ensinar meu pai como confeccionar o produto em série. O resultado era
razoável, e não havia concorrência. O negócio deslanchou
quando decidiram produzir moda jovem, totalmente vanguarda.
A empresa dispunha de uma larga vantagem competitiva. Estávamos praticamente
sozinhos no mercado, trabalhando com baixo custo e alta qualidade, respondíamos
rapidamente às mudanças e produzíamos com uma estrutura
enxuta. Mas tudo isso não foi usado para o aumento da capacidade de produção
e do poder de vendas. Conseqüentemente, nossos custos aumentaram, a estrutura
tornou-se pesada e surgiu a concorrência, que demorou, mas acabou lentamente
alcançando, uma por uma, todas as vantagens que a empresa possuía.
O dinheiro obtido com uma vantagem competitiva deve ser gasto na obtenção
de uma nova, senão o que temos na mão se torna um desperdício.
Mas você custa a quebrar quando existe muito capital. O pessoal todo se
acomodou e, com o passar do tempo, trocamos nosso perfil, deixando de atender
o público jovem. A marca foi envelhecendo junto com os clientes."
PERDA DO CONTROLE
"Administrar uma pequena confecção com uma lojinha na frente
atuando sozinha no mercado era tarefa fácil. Mas a empresa cresceu, abriu
seis filiais, a concorrência aumentou e a coisa complicou-se. Para piorar,
surgiram brigas entre os sócios, meus pais separaram-se e aquela administração
tornou-se insustentável. Depois de amargas experiências com consultorias,
em 1993 resolvi assumir a direção da empresa. Concentrei todos
os meus esforços para readquirir a posição de mercado,
baseada numa estratégia de liderança de qualidade, redirecionando
meu alvo para o público jovem. Iniciei um trabalho de sensibilização
para a qualidade total, fiz investimentos em pessoal, treinamento, máquinas
e equipamentos. Assisti de camarote à abertura do mercado e à
entrada dos produtos chineses, porém meus antigos conceitos de qualidade
não me deixaram perceber a dimensão do estrago que estava para
acontecer. As vendas entraram em queda livre, e eu demorei para compreender
os verdadeiros motivos. A impressão que eu tinha era de que o mercado
sempre sofre quando tem um choque na economia, mas, depois, tudo volta ao normal."
PONTO DE EQUILÍBRIO
"Custei a entender que a abertura do mercado era um processo sem volta
e o consumidor nunca mais seria o mesmo. Resolvi, então, suspender o
processo de mudanças, fazer um enxugamento de 40% dos custos da empresa.
Refiz todos os cálculos de custos, reduzi as margens, tive que aumentar
meu giro de 10 mil para 15 mil peças por mês e optei por produtos
importados. Tudo isso foi feito para readquirir o equilíbrio financeiro
da empresa. Hoje, eu posso afirmar, com segurança, que o cálculo
do ponto de equilíbrio deve ficar todos os dias em cima da mesa do empresário.
Não devemos comprar uma agulha ou contratar um funcionário sem
antes calcular o impacto desse custo adicional no ponto de equilíbrio
da empresa."
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