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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 65 (04/07/1993)

Um Lance Tamanho Família

Se o mercado brasileiro fosse comparado a um pelotão de fuzilamento, o último desejo de um empresário condenado à morte seria fatalmente um só: "Exportar". A metáfora não ocorre a Ademar de Barros Filho, presidente do Conselho de Administração da Lacta, a número 1 do setor de chocolates no Brasil, empresa que representa um faturamento anual de quase US$ 300 milhões. Mas pelo menos é essa a sua constatação, diante da situação extrema a que foi confinada a classe empresarial do País.
De Chicago à China, ele tem procurado reverter, lá fora, o quadro de dificuldades internas. "Estamos exportando para onde for possível", diz, "e negociando com 25 países diferentes. Isso tem-nos permitido recuperar com certa rapidez os efeitos da recessão que se abateu sobre o País em geral e com muita força no nosso setor. "Ele viu, nas suas viagens, o pequeno número de empresários que tem hoje condições de fazer contatos pessoalmente para conseguir penetrar em mercados promissores, como a China. E, ao mesmo tempo, amargou a decepção do pouco caso do governo em relação a esse potencial, que aumentaria as chances de sairmos da crise.
Essa disponibilidade, que o transformou num profissional afinado com as pesadas exigências dos clientes no exterior, é atribuída por ele a uma bem montada estratégia que fez da familiar Lacta uma empresa totalmente profissionalizada. Ele destaca que, em qualquer empreendimento já consolidado, o processo é lento e implica radical reeducação dos quadros, com aumento significativo da participação de todos.
Foi graças a essa decisão - detalhada no depoimento exclusivo a seguir - que a Lacta pode exibir algumas vitórias importantes, como a conscientização da empresa da sua capacidade e a conseqüente conquista do primeiro lugar.

O MODELO ADMINISTRATIVO BRASILEIRO É O DA SOBREVIVÊNCIA -
"Existem empresas do segmento de balas que estão exportando mais de 40% da sua produção. Elas precisam ter um pé no mercado internacional, senão fecham. A situação do País exige do empresário uma regra básica fundamental: sobreviver, como puder, e aí vale tudo mesmo - ele sabe o que isso significa. A sofisticação administrativa só vem depois que a empresa conquista a estabilidade. E as mudanças, pelo menos no nosso caso, foram muito lentas.
Elas começaram há mais de dez anos, com a substituição de elementos da família por profissionais de mercado, recobrindo diversas áreas, como administração, recursos humanos, finanças, marketing, planejamento, vendas. O resultado mais precioso desse processo foi crescimento e capacidade de competir. Temos mantido o primeiro lugar, que conquistamos em 1988, dentro de uma luta muito grande.
A mudança é lenta, porque envolve uma verdadeira revisão de conceitos, quase uma reeducação. Isso significa uma atuação constante de todo o corpo diretivo e do corpo gerencial, que também é diretivo, com participação cada vez maior. Quando se decide hoje uma determinada meta, ela não é uma diretriz isolada, fechada na sala de um diretor, mas é o fruto de uma verdadeira ação coletiva de um colegiado."

O MODELO DEIXOU DE SER AUTORITÁRIO -
"O que aconteceu, no fundo, foi uma descentralização, um processo de delegação com supervisão. Existe um trabalho de consulta, e a chefia só decide em instância final. O corpo diretivo torna-se responsável pela execução. Há muitos anos, eu exercia aqui dentro funções administrativas e comerciais. Hoje, sou presidente do Conselho de Administração, represento o corpo acionário da companhia.
Minha presença diária aqui é acompanhar, junto ao diretor-geral, que não é da família, a execução do orçamento da companhia, gerado no planejamento. Isso significa acompanhar a execução de todos os planos e programas propostos e aprovados em discussão plena, que começam sempre no segundo semestre. Nosso orçamento de 1993, por exemplo, foi discutido a partir de outubro do ano passado e, em novembro, ele estava pronto. Em dezembro, nas reuniões finais, ele foi impresso e, em janeiro, distribuído e examinado. Assim, estamos executando uma peça de planejamento estratégico.
Tradicionalmente, existe no Brasil um modelo autoritário de gestão, mas isso mudou nos últimos anos. Nenhuma empresa, hoje, sai das dificuldades sem o espírito de sacrifício de todo o conjunto. No nosso caso, foi preciso mexer na área de recursos humanos - menos enxugar e mais preparar, aperfeiçoar, treinar e praticar."

SÓ É POSSÍVEL CRESCER LANÇANDO NOVOS PRODUTOS -
"Em período de crise, o planejamento é mais delicado e complexo, porque implica busca de alternativas. Num país como o nosso, em plena recessão, o que uma empresa deve fazer para crescer, se ela já tem uma linha de produtos de rotina e uma posição definida no mercado? Ela só cresce lançando produtos novos, que preencham vazios nas suas linhas atuais ou na dos seus concorrentes.
Trata-se de um trabalho muito grande de sensibilidade em relação ao mercado, pois é preciso criar produtos em condições compatíveis com o poder aquisitivo de um povo que não tem mais nada no bolso. Um exemplo de produto novo é o Lancy, que, no passado, em plena recessão, estourou todas as previsões, nos dando 10% do mercado. Foi pura geração interna, uma gestação coletiva, envolvendo aspectos mercadológicos, comerciais, de produção, de controle de qualidade etc.
Não é todo dia que isso acontece, mas, quando você tem competência e sorte, os resultados são espantosos. Neste ano, quebramos a rotina e lançamos dois produtos em fevereiro, um mês terrível, com apenas catorze dias úteis. Ainda a sazonalidade influi muito na estratégia interna: temos 2,5 mil funcionários, mas precisamos contratar mais mil, quando se aproxima o período de Páscoa, para dar conta da demanda."

A CHINA OPTOU PELA PROSPERIDADE
"Um dos grandes valores da economia mundial chama-se Deng Xiao Ping, o número 1 do Partido Comunista Chinês. Ele diz o seguinte: "a condição de socialista-marxista não é uma condição de pobreza". Ele aprendeu com os russos, que foram derrotados pela fome. Então, a opção liberal chinesa é uma opção política, absolutamente correta. O povo chinês tem direito à prosperidade.
Atualmente, a China está construindo dez hidrelétricas, mas só tem uma empresa brasileira desse setor fazendo contatos lá. O cenário está aberto para quem quiser associar-se, pois aquele país é um gigante, não existe nada pequeno. E o que eu vi lá? Falta dinheiro para as despesas básicas na embaixada de um país que já superou o Brasil em termos de Produto Interno Bruto e que, em dez anos, vai encostar nos Estados Unidos.
Os últimos governos atrasaram o país, e o empresário costuma não fazer política partidária para não sujar as mãos. Mas quem entra em política, em qualquer lugar do mundo, vai envolver-se com aspectos escabrosos do comportamento humano. Se o empresário não ocupar esse espaço da política partidária, outro aventureiro ocupa. É preciso, pois, montar uma estratégia empresarial interna que nos permita fazer política."


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