O Jogo Sujo do Comércio Global
Terras férteis e produtivas a perder de vista, mão-de-obra abundante e barata, ausência de catástrofes naturais e zonas estéreis. Não é por acaso que o Brasil representa para os países desenvolvidos, ao mesmo tempo, dentro da lógica contraditória da globalização, um grande mercado consumidor e uma enorme ameaça com o seu potencial de desenvolvimento. Seria interessante para o jogo perverso da competitividade mundial que o "gigante adormecido" acordasse e deixasse de ser um simples fornecedor de matérias-primas, agregando valor aos seus produtos? Até que ponto as regras ditadas pela liderança do comércio internacional estão contribuindo para manter as atividades exportadoras brasileiras exatamente onde estão? Como podemos reverter esse quadro a nosso favor? Essas foram algumas das questões levantadas pelo ministro de Estado da Agricultura, Marcus Vinicius Pratini de Moraes, durante o almoço-palestra realizado pela Associação Brasileira dos Executivos de Comércio Exterior (Adede), no dia 10 de dezembro, nas dependências do Nacional Club, em São Paulo. Recém-chegado da tumultuada reunião da Organização Mundial de Comércio (OMC), ocorrida em Seattle, nos Estados Unidos, ele trouxe reflexões profundas sobre a situação do Brasil enquanto exportador.
BARREIRAS
"Minha prioridade é tratar da renda da agricultura, um setor que contribuiu de forma extraordinária para o programa de estabilização da moeda. Mas há determinados momentos em que a agricultura precisa resgatar a sua capacidade de aferir renda. Nesse sentido, a grande tarefa que temos pela frente é, além de dar apoio tecnológico e buscar novos mecanismos de financiamento, cuidar do mercado, ou seja, para quem vamos vender. No próximo ano, o Brasil vai crescer pelo menos 4%, com a agricultura assumindo um papel fundamental nesse cenário. Para que isso aconteça, teremos que vencer as duas limitações básicas, que são o marketing e a logística. Temos que começar a promover nossas marcas, fazendo com que as empresas que comercializam nossos produtos apareçam no plano internacional. Precisamos construir a imagem do produto brasileiro, porque imagem representa maior valor agregado, e é isso que temos que aprender a vender.
SEM SUBSÍDIOS
"Não é possível falar em multilateralismo hoje com os países, subsidiando produtos para exportação. O primeiro objetivo seria a eliminação dessas práticas terríveis que só fazem deteriorar os preços e deprimir o mercado internacional. O segundo passo será a negociação para o acesso ao mercado sem restrições. Já o terceiro aspecto diz respeito aos apoios internos à agricultura. Todos reconhecem que as nações devem apoiar suas atividades agrícolas, desde que isso não gere distorções de comércio. Os europeus subsidiam o açúcar e o leite em pó a ponto de torná-los imbatíveis na comercialização, criam miséria em regiões como o nordeste brasileiro e depois mandam uma ONG estudar a distribuição de renda no Brasil. Não podemos mais aceitar esses organismos estrangeiros falando mal do nosso país. Precisamos começar a enxergar isso com mais patriotismo, pois aceitamos tudo o que vem de fora, sendo que algumas dessas políticas vão contra os nossos interesses."
INFRA-ESTRUTURA
"Cerca de 40% das nossas exportações vêm do agronegócio, o único setor que gera superávit na balança comercial brasileira. No entanto, de nada adianta sermos competitivos na porteira da lavoura ou no portão da fábrica, se não formos também na prateleira do consumidor em qualquer lugar do mundo. Este é um grave problema que estamos enfrentando. Já avançamos com a privatização dos portos, com terminais de contêineres mais eficientes, porém é preciso trabalhar para reduzir os custos de transferência na nossa produção tanto aqui quanto no exterior. A logística brasileira lá fora é zero, limitada a uma agência da Varig ou a uma filial do Banco do Brasil. Não temos armazéns alfandegados nem linhas de navegação definidas para o exterior. No ano passado, transportamos em navio de bandeira nacional somente 2% da carga total. Muito mais do que capacidade para produzir, temos que ser capazes de vender e de ter logística competitiva. A grande tarefa de crescimento deste país passa, em primeiro lugar, pelo aumento das exportações, da produção agrícola, pois o resto vem atrás."
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