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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 45 (09/02/1993)

Muito Motor para Pouca Oficina

Oficina suja, mecânico despreparado, orçamento no teto: quem não enfrentou esse tipo de problema? Mas também existe o outro lado do balcão: usuário displicente, desinteressado e muitas vezes mau pagador. Para amenizar os conflitos é que existe a recessão. Profissional que não sabe mexer em ignição eletrônica nem cuidar da aparência do seu estabelecimento é melhor desistir do ramo. E motorista que precisa de alguém para mudar uma peça qualquer será obrigado a encostar o carro.
Essas duas tendências - qualidade no atendimento das oficinas e mais auto-suficiência na manutenção dos veículos por parte dos proprietários - são apontadas como determinantes para os próximos anos, segundo Geraldo Luiz Santo Mauro, presidente do Sindirepa Sindicato da Indústria de Reparação de Veículos e Acessórios do Estado de São Paulo. Um dos sócios da Motolux, firma de retífica de motores fundada em 1959 e com sessenta funcionários, ele já esteve em congressos e visitou empresas na Alemanha, nos Estados Unidos e no Japão para comprovar isso.
No exterior, descobriu que a indústria de automóveis está passando por transformações radicais, que vão mudar os conceitos de reparação de motores e outros serviços. E viu na progressiva introdução dos carros importados no Brasil um desafio para o nosso mercado, com alto potencial de demanda reprimida, provocado pela defasagem tecnológica e pelas dificuldades econômicas.
Neste depoimento exclusivo, ele destaca a importância do trabalho feito pelo seu sindicato em favor da melhora da qualidade nos serviços automotivos, através da conscientização dos empresários e do treinamento da mão-de-obra. E defende o esforço nacional de superação tecnológica feito pelo setor para enfrentar dificuldades históricas do País.

GASOGÊNIO E ÁLCOOL, ALAVANCAS PARA O PROGRESSO

"A crise de combustível de 1941 a 1945 obrigou a frota do Brasil a enfrentar o gasogênio, que esmerilhava o motor por dentro. O resíduo do carvão para gerar o gás entrava dentro do motor, agindo como se fosse areia. Quando acabou a guerra, houve um grande surto de retíficas. Outra situação singular foi a crise energética, em 1973, quando surgiu a alternativa do álcool como combustível.
Sem que estivéssemos esperando, desempenhamos um papel relevante. Havia desinteresse da indústria de automóveis, pois o projeto delas era montar veículos a gasolina. De repente, perceberam que já tínhamos feito 40 mil conversões e as empresas, apenas 15 mil carros novos a álcool. Aí, a situação inverteu-se, e eles fabricaram 330 mil veículos, diante de 42 mil modificações feitas por nós.
A participação nesse episódio forçou-nos a penetrar um pouco na tecnologia do motor. Havia muito imitador na praça que não sabia nem da existência da câmara de combustão. Hoje, a maioria das retíficas possui conhecimento técnico: se o álcool não deixou lucros financeiros, pelo menos deixou know-how. Isso nos coloca à vontade para enfrentar desafios, como a ignição eletrônica."

O USUÁRIO É COMODISTA E NÃO SELECIONA A OFICINA

"Durante certo tempo, publicamos uma tabela de preços na imprensa, para orientar o consumidor. Desistimos, quando verificamos que ninguém estava interessado. A falta de credibilidade de muitas oficinas também é culpa do usuário. Ele precisa fazer uma seleção, obrigar o estabelecimento a pelo menos melhorar de aspecto.
A maioria não gosta que o mecânico tire a nota, muitos falam que pagam e depois desaparecem, achando que fazem com isso um grande negócio. Mas, eles estão é atrapalhando os esforços de implantação de programas de qualidade.
Graças ao Senai, que atendeu nossas sugestões, hoje estamos com um bom programa de treinamento da mão-de-obra, que é feito com cuidado. Não se pode tirar um profissional durante quinze dias para fazer um curso. Primeiro, porque não existem condições para isso e, segundo, por que ele volta uma vedete e vai querer montar, sem sucesso, sua própria oficina. Conseguimos reformular a carga horária, criando cursos noturnos e o diploma a prestação, mantendo a expectativa para poder segurar o pessoal no emprego.
Estamos, também, organizando os empresários das oficinas mecânicas e conseguimos formar núcleos fortes em São José dos Campos, Taubaté, Jundiaí, Sorocaba, Itu, Ribeirão Preto, formando, inclusive, algumas associações. Começamos convidando todo mundo para jantar periodicamente, para que possam conversar, trocar idéias e unir esforços e, assim, melhorar os serviços."

MULHERES REGULAVAM MOTORES NOS ANOS 50

"Nasci dentro de uma oficina mecânica, pois meu pai era do ramo. Ele foi corredor de automóveis no início do automobilismo no Brasil e sempre participou do setor de reparação. Foi também pioneiro no atendimento de auto-elétrico até meia-noite, incluindo domingos e feriados, na década de 40. Éramos especializados em peças de emergência.
Montamos a primeira oficina de regulagem de motor, já com equipamentos eletrônicos, mas o serviço era feito por mulheres. Meu pai preparou uma equipe feminina, pois acreditava que regular carburador, por exemplo, era um trabalho mais delicado, que exigia paciência, zelo e aptidão. Isso funcionou durante seis anos.
Entre 1948 e 1951, durante uma crise energética, muitas indústrias compraram gerador próprio, e isso despertou mais um tipo de negócio. Meu pai visualizou um mercado, que era comprar motor fora de uso, reformar e acoplar num gerador. Isso impulsionou nosso negócio. Mas, em 1959, voltamos à retífica, pois era possível concentrar valor num trabalho simples. Você atendia quatro clientes por dia, vendia quatro motores e faturava o mesmo que uma oficina em uma semana."

BRIGA COM A VOLKSWAGEN GEROU ENTENDIMENTO

"A Volks tinha uma retífica de grande porte e, na época, opusemo-nos, chegando até a apresentar um projeto de lei proibindo a participação de multinacional no setor de reparação. Entendíamos que o País precisava de tecnologia de indústria, já que tínhamos a de reparo, onde o know-how é 100% nacional - temos, hoje, inclusive, um parque satisfatório de máquinas de retíficas feitas no Brasil.
Esse projeto gerou uma série de descontentamentos, mas acabou aproximando-nos, pois passamos a dialogar. Chegou uma hora em que a própria Volkswagen viu que o negócio dela não incluía as retíficas. Na Alemanha, eles têm uma retífica que faz novecentos motores por dia, só que lá o setor não tinha uma posição de independência como o nosso. Quando as multis vieram instalar-se aqui, já existiam mil empresas especializadas. Hoje, só em São Paulo, o segmento emprega 450 mil pessoas, isso porque houve enxugamento com a recessão.
No atual processo de recuperação econômica, nosso setor é privilegiado, pois, antes do pessoal comprar o novo, vai é consertar o que já tem. Estamos vivendo um surto de adiamento dos consertos, mas vai chegar uma hora em que ele vai ter que nos procurar. Temos uma rede instalada que também vai atualizar-se para atender o usuário de carro importado. A importação gera competitividade, mas eu acho que os importados só serão sucesso no Brasil quando as empresas fabricantes vierem instalar-se aqui, montando paralelamente uma rede própria de assistência."


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