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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 58 (16/05/1993)

Com os Pés no Chão, nas Mãos de Deus

O empresário da crise - foco principal desta série de depoimentos - manifesta sua criatividade a partir de experiências traumáticas. A ameaça ao patrimônio, à sobrevivência e ao próprio empreendimento gerou, em primeira instância, ansiedade, medo e frustração, mas essa fase já passou. Hoje, acontece um fenômeno ainda pouco estudado pelos especialistas em administração: escaldado pelas dificuldades, o empresário brasileiro criou um modelo estratégico próprio, adequado aos problemas do País, aos caprichos do mercado e ao tamanho real das suas pernas.
E o que é mais importante: ele sistematiza, empiricamente, um universo conceitual, que é verdadeiro maná de sugestões para os teóricos profissionais. Samir Nakad, proprietário da Sameka Modas Ltda. - www.sameka.com.br -, por exemplo, jamais sonhou em se transformar em objeto de estudo, já que possui uma pequena empresa têxtil, com apenas cinqüenta funcionários, escondida na pequena Birigüi, interior de São Paulo.
Mas, apesar de suas limitações físicas, ele pode revelar, com lucidez, o que está acontecendo no Brasil real. Membro de uma família tradicionalmente envolvida com o setor têxtil, ele assumiu a empresa aos 19 anos, em 1983, e seu desenvolvimento como empresário coincidiu com seu processo de amadurecimento pessoal. Aprendeu a verticalizar, terceirizando, por exemplo, uma solução que ele explica neste depoimento exclusivo.
Também aprendeu outras coisas, como preferir clientes pequenos aos grandes magazines, explorar mercados no interior dos estados, produzir mais com menos gente, escolher chefes que coloquem a mão na massa, contratar com parcimônia, ganhar menos, mas sempre. E crescer com os pés no chão, mas colocando seu empreendimento nas mãos do Altíssimo, como ele gosta de se referir à entidade que o salvou de um enfarte, no auge da crise.

SAÍDA PELA DIAGONAL
"Para conseguir qualidade de forma homogênea nos produtos que fabrico - malhas infantis, principalmente, entre outros itens -, decidi verticalizar, mas trabalhando com terceiros, já que não tenho capital nem consumo para verticalizar do começo ao fim. Agora, compramos os fios dentro das especificações, mandamos confeccionar e tingir os tecidos dentro das nossas especificações e padrões. O resto - corte, estamparia e costura - a gente faz internamente.
Isso dá garantias para os comerciantes, que conseguem sempre comprar exatamente o que está exposto no nosso mostruário. E também nos dá equilíbrio nos custos e na qualidade que oferecemos no mercado. O objetivo é conseguir o ponto certo da balança, em que o consumidor fica satisfeito com o produto e consegue pagar um preço justo. Nossa escala de produção é baixa, e o preço não é tão favorável como o das grandes manufaturas, mas sobrevivemos, porque vendemos peças exclusivas para poucos clientes.
Como trabalho dentro da realidade do mercado, acredito que estou praticando preços corretos. Nossos clientes ganham dinheiro vendendo nossos produtos e costumam ser fiéis na reposição das peças. Acho que o maior atrativo é que oferecemos peças com uma beleza singular, o que agrada o representante e o lojista, e isso faz com que a gente vá ganhando mais mercado."

MAIS CLIENTES, MENOS RISCOS

"Já atendi grandes empresas, mas, honestamente, não tenho interesse. Sinto que o grande não me traz o retorno constante do pequeno. Mesmo quando há uma retração, o pequeno ainda compra um pouco, mantém um relacionamento com o representante, pois sabe que ele e a empresa fornecedora precisam sobreviver. O grande pode, de repente, cortar os pedidos, além de pressionar muito por preços e prazos.
Os grandes, agora, estão comportando-se de maneira diferente, estão descentralizando as compras, criando etiquetas e departamentos específicos, entrando em nichos do pequeno lojista, o que tem aumentado a concorrência. Mas minha preferência é pelos pequenos, que se encaixam na minha produção de 350 a 400 conjuntos por dia. Quando pulverizamos as vendas, corremos menos riscos de inadimplência, é possível ficar de pé e trabalhar.
Outra vantagem é que você não sofre uma pressão tão grande por ser um pedido muito alto. E existe o fator atendimento: grande empresa não consegue tratar o cliente de maneira diferenciada e próxima. Quem quiser falar diretamente comigo tem acesso à minha agenda, e isso não acontece nas grandes estruturas.
Com uma produção menor, você vive mais tranqüilo e pode atender mercados menos congestionados, como o interior de Minas Gerais, Bahia, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e até mesmo cidades do interior de São Paulo. Curiosamente, vendemos bastante para Fortaleza, que é um centro distribuidor para as pequenas cidades do interior do Nordeste."

ESTAMOS NAS MÃOS DOS CONSUMIDORES
"Com as crises sucessivas, houve uma espécie de seleção natural do nosso setor. A gente sente que as pessoas que levam mesmo jeito para o comércio continuam aí, trabalhando. Elas conseguiram enquadrar-se, comprando o que podem vender, sem excessos, e não estão mais preocupadas com lucros, fazendo grandes estoques. Mas acredito que mais importante do que a mudança de mentalidade do empresário é a necessidade de uma nova postura do consumidor.
Feliz ou infelizmente, estamos nas mãos dos consumidores. Eles precisam conscientizar-se de que o melhor caminho é comprar apenas o necessário, exigindo mais qualidade e durabilidade dos produtos. Eles precisam saber como se conduzir no orçamento mensal. Se for criada essa cultura no público, poderemos crescer com mais segurança. Assim, os consumidores poderiam ajudar a manter a atividade empresarial de forma tranqüila, adequada à realidade. A crise ensina-nos a ter mais produtividade. Hoje, estou produzindo 70% do que produzia há dois anos, mas com 50% dos recursos utilizados. Aprendi a não trabalhar mais com expectativas, apenas com a realidade. Agora, procuramos atender o mais rápido possível o que o mercado nos impõe de imediato."

UMA FORÇA VINDA DO ALTO
"Quando você reduz sua empresa, os custos fixos passam a representar mais, e isso pesa na rentabilidade. Mesmo assim, considero um bom sinal a gente poder aumentar a produtividade mantendo a produção, pois isso pode trazer mais resultados para a empresa.
Aprendi, com as dificuldades, a administrar de maneira diferente, pois o empresário só obtém sucesso se fizer o funcionário participar das decisões. Ele também aprendeu que é melhor ganhar um pouco menos, mas de maneira constante. E a mudar seus hábitos. Hoje, procuramos aproximar as equipes, com os chefes fazendo muitas vezes o serviço do subalterno, e este desempenhando algumas funções do chefe.
No auge da crise, quando as coisas estavam muito difíceis, consagrei a empresa a Deus. Falei que eu era apenas um administrador, estava procurando fazer o melhor possível e que precisava de uma força para continuar o trabalho iniciado há tanto tempo. Pedi ajuda não para mim, mas para poder manter o empreendimento. A partir daí, deu tudo certo."


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