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« Memória Empresarial • ANO XXVIII - Ed. 54 (18/04/1993)

Um Raro Exemplar da Terceira Geração

Recentemente, um líder sindicalista em campanha para reeleição surpreendeu-se com a facilidade com que entrou numa das fábricas da Bicicletas Caloi S. A. Foi um contato tranqüilo com os funcionários, facilitado pela direção da empresa. Um clima oposto ao de alguns anos atrás, quando uma tentativa de greve, incentivada pelo sindicato e abortada pela direção da empresa, provocou turbulências no relacionamento.
- A Caloi mudou! Comentou o líder sindical.
- Não, a empresa continua a mesma. Vocês é que mudaram, retrucou o diretor-presidente, Bruno Caloi.
Raro exemplar de empresário brasileiro de terceira geração, Bruno Caloi tem o comportamento seguro dos longevos, fruto da lucidez que a cultura acumulada proporciona aos que enfrentaram todo tipo de tempestade. Por isso, consegue ser um turrão na hora decisiva, ao mesmo tempo que mantém um relacionamento diário de proximidade com seus 2,5 mil funcionários. Não é difícil vê-lo percorrendo as dependências de suas fábricas, checando a manipulação de máquinas de última geração e sendo chamado a toda hora por empregados que gostam de falar sobre produção ou sobre futebol. "A mentalidade do trabalhador brasileiro mudou nos últimos anos", diz. "Antes, eles não se interessavam pelo andamento da empresa, hoje, a maioria quer saber como andam a produção e as vendas." Neste depoimento exclusivo, ele fala do sucesso do empreendimento fundado por seu avô há 95 anos, apesar das crises e da concorrência. Um dos indicadores é o crescimento de 10% em 1992, ano maldito para muitos, mas normal para quem está desde os anos 50 com o pulso firme num mercado cheio de armadilhas.

SOMOS MODERNOS, APESAR DA IDADE

"Meu avô era imigrante e veio para cá sem recursos. Montou sua pequena oficina, em 1898, apenas com algum conhecimento técnico e muita vontade de trabalhar. Meu pai tocou o negócio a partir dos anos 30, depois de ter participado da Primeira Guerra Mundial, lutando pela Itália. Na Segunda Guerra, quando começaram a faltar peças de reposição, a Caloi, que era apenas comércio e representava marcas estrangeiras, como a Peugeot francesa, arriscou a fabricar alguma coisa. Entramos para valer na indústria no Pós-Guerra. Por isso, costumo comentar que já passamos por crises muito piores, em época de escassez mundial, quando esses conflitos se refletiram no Brasil de maneira significativa, além de muitas revoluções internas. Hoje, estamos com 95 anos, que é um belíssimo número, cada vez mais difícil de atingir no Brasil. A vantagem de ser uma empresa tão antiga é que essa situação nos dá confiabilidade no mercado, uma posição de respeito, muito marcante. Para quem acha que a empresa tem muita idade, reagimos com uma imagem atuante, pois conseguimos atualizar e diversificar nossos produtos e ter uma linha de comunicação esportiva e moderna. Atribuo essa longevidade à vontade de se firmar e ir para a frente. O tempo dá-nos firmeza na condução das atividades, pois, mesmo concordando que existem problemas, olhamos para trás e vemos um quadro mais desfavorável. Nossa filosofia é de ter uma empresa familiar, mas os componentes da família são profissionais. Participamos diretamente do trabalho nas nossas fábricas em São Paulo, Mococa e Manaus. Se eu, na terceira geração, achasse que tocar bateria fosse melhor do que fazer bicicleta, nem estaria por aqui."

OPTAMOS PELO ENDIVIDAMENTO, E DEU CERTO

"O segredo é adaptar-se a tudo. Se existe inflação, é preciso raciocinar como um país inflacionário e não ficar queixando-se. O importante é conseguir manobrar dentro do quadro geral, sempre pensando, é claro, nas prioridades da empresa. O Brasil ainda é um país de oportunidades, apesar de a falta de capital ser um entrave brutal. Mesmo assim, tenho visto a consolidação de novas empresas. O planejamento deve ser feito, mesmo com a possibilidade de errar. É melhor corrigir um plano do que não ter plano nenhum. O sucesso de uma estratégia não depende só das condições externas. Acho, inclusive, que a recessão obriga o empresário a ser mais eficiente. Na crise, tudo fica mais difícil, e é preciso ficar atento. Enxergamos, por exemplo, com antecedência a abertura do mercado e estamos com uma boa presença no exterior. A abertura alertou-nos para a necessidade de modernizar o parque industrial. Corremos, então, risco do endividamento para automatizar muitas áreas de produção. Fizemos, também, algumas terceirizações, e nosso parque industrial ficou muito mais eficiente. Eficiência é produtividade, e produtividade é competitividade. Esse caminho revelou-se correto, e conseguimos sair do endividamento."

CRESCEMOS JUNTO COM O MERCADO -
"A concorrência estrangeira está cada vez mais forte, mas estamos com um produto competitivo. Temos todas as possibilidades e todas as armas para manter e até ampliar nossa parcela no mercado, que, atualmente, é de cerca de 50%. Produzimos, hoje, 6 mil bicicletas por dia e trabalhamos antevendo as tendências. A abertura não nos prejudica em nada, ao contrário, acho até que nos impulsiona. Pressionados pelas dificuldades, a gente acaba superando-se. Em 1992, quando só se falou em choque, em trabalhar no vermelho, chegamos a crescer 10%. Dentro do nosso setor metalúrgico foi uma performance importante. Tenho, portanto, perspectivas otimistas para 1993, pois as condições são boas. Se aumentou a concorrência, o mercado também ficou maior, e isso deve-se muito ao nosso trabalho. Sempre tivemos a preocupação de valorizar a bicicleta. Há tempos estamos aumentando o leque de usuários. Um exemplo é o modelo Ceci, que atraiu o público feminino: provamos para a mulher que andar de bicicleta não era feio nem suburbano. Hoje, esse público representa 30% do mercado. Temos também vários tipos esportivos, desde a tradicional Caloi 12, que é mais de treinamento de corrida, e as recentes, como a Mountain Bike, que são um sucesso mundial. E estamos diversificando também nossas atividades, como é o caso da representação da marca japonesa Suzuki, de motores de popa, scoopers e geradores, que assumimos recentemente. E da francesa Motul, pioneira e expoente mundial em lubrificantes de alto nível."

LUCRO NÃO É PECADO
"Vou a cada quinze dias até a Fiesp, já fui presidente da Confederação Brasileira de Ciclismo, mantenho atividades fora da empresa, mas de maneira muito dosada. Não aconselho nenhum empresário a se dedicar inteiramente à política. O preconceito que ainda existe contra os empresários é resquício de uma mentalidade antiga, fruto da influência religiosa. Lucro, assim, fica ligado à exploração de alguém, ao pecado. Entre os anglo-saxões, ter lucro é um bem para a sociedade. Acho que essa mentalidade antiempresarial não está mudando muito entre os políticos e outros setores formadores de opinião. O que mudou um pouco foi o sindicato: eles perceberam que não adianta destruir as empresas. Os brasileiros oscilam entre o entusiasmo e a depressão. Hoje, estamos enfrentando um período de pessimismo, o que não favorece os empreendimentos."


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