Pais não Deixam Escola Fechar
Pais não Deixam Escola Fechar
Fazer a matrícula e pagar a mensalidade pode não ser o suficiente para garantir um bom estudo para os filhos. Alguns exemplos mostram que há limites para a total delegação de poderes em tarefa tão fundamental como a educação. O sucateamento da rede pública de ensino, por exemplo, mais do que um desleixo governamental, é grave sintoma de doença da sociedade, sinal de que as famílias foram expulsas das decisões e obrigadas a acatar a ineficiência pública ou a refugiar-se nas escolas particulares.
A longa crise educacional fez com que os pais prestassem mais atenção nas rotinas das salas de aula, onde qualquer iniciativa feita com bom senso e criatividade é encarada como um antídoto contra o caos. Na última década, métodos em transição costumam conviver com preços em elevação. Ao mesmo tempo em que esse serviço obrigatório encarece cada vez mais, é comum surgirem dúvidas sobre a eficácia dos novos rumos pedagógicos. Assim, a única saída para evitar o pior é participar.
Foi o que aconteceu na Escola Caleidoscópio Ltda. - Tel.: (016) 623-0861 -, de Ribeirão Preto, que atende cem crianças entre 3 e 12 anos. Quando os professores André Luís Ferreira de Oliveira e Cristina Gama Sauaia acharam que as dificuldades para manter o empreendimento tinham, afinal, vencido qualquer tipo de esforço, os pais resolveram virar a maré, pois não queriam abrir mão da qualidade escolar já experimentada pelos alunos.
No depoimento a seguir, André e Cristina contam como isso aconteceu e falam sobre a estratégia adotada para fazer a empresa sobreviver e começar a crescer.
FILOSOFIA MAIS INFORMÁTICA
"A idéia de fundar uma escola diferenciada surgiu no final de 1988. Nossa intenção era fazer uma escola em que a gente conseguisse ficar mais em contato com as crianças. Propusemo-nos a ter classes pequenas, o que permite dar um atendimento mais personalizado. Além disso, preocupamo-nos em introduzir novidades, como ensino da filosofia e da informática, iniciativa absolutamente inédita na cidade.
A escola foi, então, criada para que as crianças pudessem ser mais atuantes, e não tão passivas como no ensino um pouco mais tradicional. É importante buscar o que a criança tem dentro de si, trabalhar isso, comparar com os valores de outras pessoas e ir crescendo através da reflexão e da observação. Vimos que essas seriam duas atividades nas quais a criança estaria por inteiro descobrindo-se e usando o que ela guarda interiormente.
Com a informática, introduzimos uma disciplina em que a criança não fica presa a um programa rígido para obedecer e que, com o auxílio do computador, pudesse defrontar-se com dificuldades para resolver por conta própria, sem que a professora ficasse dizendo se ela está certa ou errada. É a chance de cada uma delas descobrir coisas novas, seguindo o ritmo pessoal.
O nome sintetiza esse espírito de dinamismo, pois Caleidoscópio é um brinquedo colorido, onde novas formas sempre surgem, formando conjuntos agradáveis e harmoniosos. Trata-se de uma ferramenta que deixa a criança à vontade para fazer muitas coisas ao mesmo tempo. A professora pode, então, ter dez crianças trabalhando ao mesmo tempo, cada uma de uma forma diferente, dando atendimento a cada uma, porque o computador permite isso. Elas vão ficando mais independentes, mais autônomas também. Isso está muito ligado com a filosofia."
MOBILIZAÇÃO E CONSULTORIA MUDAM TUDO
"Nós temos, também, outras atividades que fazem as crianças valorizarem mais o ambiente escolar, como futebol, culinária, balé, expressão corporal, oficina de teatro. Sabíamos que isso tinha impacto positivo nas famílias dos alunos, mas não imaginávamos a dimensão dela. Por isso, surpreendeu-nos a reação dos pais, quando, no ano passado, avisamos que a escola ia fechar por dificuldades financeiras. Eles praticamente se recusaram a aceitar o fato.
Uma das mães procurou-nos e indicou o SEBRAE/SP. Um consultor veio para fazer um diagnóstico, conversou bastante conosco, fez um levantamento da situação e participou da reunião com os pais, para esclarecer alguns pontos. Ele pensava em sensibilizá-los, mas os pais já estavam motivados para ajudar. As dicas dadas pelo consultor geraram resultados, como suprimir os descontos - pois a escola precisa ter recursos para dar todo o tipo de suporte aos alunos - e fazer propaganda mais incisiva.
Também foi preciso criar comissões e convocar os pais para divulgar o trabalho. Foi importante, também, transformar a aparência física do prédio, pois ele tinha um jeitão de casa e precisava ficar com uma imagem mais adequada, que transmitisse mais segurança. Fizemos, então, uma reforma, construímos uma quadra, criando um espaço maior para as crianças brincarem, e os pais foram à luta atrás de amigos, fazendo propaganda, organizando uma festa que acabou atraindo mais crianças para cá."
É TUDO MUITO TRANSPARENTE
"Conseguimos um grupo de pais que está preparado para o que der e vier. De nossa parte, abrimos a administração, ficou tudo muito transparente. Ninguém aqui está querendo ficar rico, e todos sabem quanto se gasta em aluguel e nos salários dos professores e do pessoal da manutenção. Ao todo, existem umas trinta pessoas envolvidas com o trabalho da escola.
Funcionamos muito num esquema doméstico, pois a saúde financeira ainda não é essas coisas. Por exemplo, não temos recursos para um vídeo, então, alguém traz um aparelho de casa, e tudo se resolve. Achamos que isso vai ficar nessa situação por mais algum tempo. Mas deu para dar uma aliviada. Não estamos mais no vermelho, estamos conseguindo administrar. Esperamos ter sede própria, duplicar os cursos de manhã e de tarde. Nossa intenção é implantar o período integral, mas isso, por enquanto, é inviável."
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