O Especialista Luta pelo seu Mercado
Especialidades
são, tradicionalmente, departamentos estanques, isolados entre si pelas
barreiras funcionais. Mas isso está mudando. Hoje, a tendência
não é especializar-se em funções, mas em processos.
Isso cria um paradoxo: o especialista está ficando, cada vez mais, parecido
com um clínico-geral, embora jamais possa ser confundido com um generalista.
Vamos tomar o exemplo de um engenheiro-clínico. Trata-se do profissional
que cuida da interface entre o equipamento médico e o paciente. Poderia
haver algo mais especializado?
No entanto, ele precisa aliar outras especialidades da engenharia e da medicina
ao gerenciamento da tecnologia dirigida aos cuidados com a saúde. Isso
significa fazer a conexão de diversas atividades científicas para
atingir um objetivo, como a segurança hospitalar, por exemplo, que já
é uma especialidade dentro da engenharia clínica. É o caso
de Lúcio Flávio de Magalhães Brito, um dos quatro
sócios da Engenharia Clínica Consultoria e Comércio
Ltda. - tel.: (011) 881-1250.
Ele faz parte de uma elite de cinco engenheiros-clínicos brasileiros
com certificação internacional que cuidam da formação
de novos quadros e procuram sensibilizar os hospitais sobre a necessidade desse
trabalho, fundamental para diminuir o índice de erros que ocorre na área
da saúde, no Brasil. Junto com o irmão Tales e Paulo Roberto Najas
- todos engenheiros -, ele, praticamente, descobre um mercado, lidando
com consultoria, treinamento, planejamento, inspeção de segurança,
instrumentação biomédica e marketing. É disso que
ele fala a seguir.
COMO EVITAR O ERRO MÉDICO "A engenharia
clínica como profissão é relativamente nova, com um currículo
escolar desenvolvido nos anos 70. A profissão foi definida pelo American
College of Clinical Engineering (ACCE), que fica em Houston, Estados Unidos,
e do qual faço parte desde 1991. Ela é fruto da combinação
multidisciplinar da engenharia - química, mecânica, elétrica,
computação - com as ciências da vida, que, usualmente
incluem bioquímica, biologia, fisiologia e anatomia. É uma especialização
da engenharia biomédica, que, por sua vez, atua nos projetos de novos
equipamentos.
É diferente da bioengenharia, que pesquisa a compatibilidade de novos
materiais com o tecido humano. E também da engenharia hospitalar, que
age na infra-estrutura de um hospital. O engenheiro hospitalar preocupa-se com
tudo o que existe entre o poste de luz até a tomada, e o clínico
cuida da tomada para dentro dos equipamentos, valendo o mesmo raciocínio
para os sistemas de gases medicinais, água etc. Mas é preciso
ter uma visão global do processo, pois, às vezes, o erro médico
não está ligado diretamente ao equipamento, mas, por exemplo,
a defeitos nas instalações elétricas, o que, neste caso,
deixa de ser um erro médico. O fato é que ninguém desconfia
disso.
Como montar um sistema de ar comprimido medicinal com equipamentos convencionais
lubrificados a óleo? Ou um freezer em uma sala de medicamentos? Quais
os cuidados com a iluminação? Como implantar os equipamentos para
beneficiar o paciente? O engenheiro-clínico cuida dessas coisas para
o administrador, o arquiteto e o engenheiro hospitalar."
ROMPENDO AS BARREIRAS PROFISSIONAIS
"No Brasil, muitas vezes, precisamos assumir tarefas de outras especialidades,
pois não podemos deixar de fornecer informações para o
administrador. Devido à escassez de profissionais no mercado, sou uma
pessoa multidisciplinar. O fato de estar num hospital é uma vantagem,
pois é um ambiente que congrega muitos especialistas. Procuro romper
com as barreiras interprofissionais, pedindo ajuda a quem detém o conhecimento.
Digo o seguinte: 'Vim para ajudar você, e você me ensina. Se
precisar estudar eu estudo, se precisar comprar um livro eu compro'.
Esse perfil múltiplo da engenharia clínica costuma provocar espanto.
Sinto isso nos cursos que ministro na Universidade Federal da Paraíba,
na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na Unicamp e na USP. Mas, em geral,
somos bem aceitos pelos outros especialistas, pois não viemos tomar o
lugar de ninguém. Viemos para que o médico faça mais medicina
e o enfermeiro mais enfermagem. Já treinei mais de quinhentos médicos,
enfermeiros e engenheiros e ajudei a formar 65 engenheiros-clínicos,
que estão no mercado, abrindo espaço e procurando especializar-se
ainda mais.
No meu caso, estou fazendo mestrado em engenharia biomédica com ênfase
na engenharia clínica aplicada à segurança do ambiente
hospitalar, que é um problema sério em todo o mundo. Elaborei
para o Ministério da Saúde um manual sobre esse assunto, que mostra
desde os aspectos legais até um glossário geral com normas de
qualidade e informações. A maioria dos hospitais no Brasil é
carente de segurança, por vários motivos. Além disso, aliado
à imperícia médica, existe o mau uso ou a subutilização
dos equipamentos, o que nos abre a perspectiva de contribuir com grande parte
do processo relacionado a esta área, como as especificações
técnicas em licitação, manutenção preventiva,
reposição de peças, treinamento etc."
ENGENHEIRO PRECISA SABER ADMINISTRAR
"Eu acredito que estamos formando um mercado, que é potencialmente
muito grande, ajudando, inclusive, na sua divulgação através
de artigos e da organização de eventos. Estima-se que cerca de
20 a 40% de todos os equipamentos médicos existentes no Brasil, com valor
aproximado de US$ 1,5 bilhão, estão parados por falta de instalação,
acessórios, peças de reposição e serviços
de manutenção. Nossa intenção é formar técnicos
que cuidem dos equipamentos em regime de parceria conosco.
Podemos cuidar, também, do planejamento e da tecnologia hospitalar, assumindo
tarefas de quarteirização, ou seja, checar o trabalho de firmas
que prestam serviços para os hospitais em regime de terceirização.
Contamos com o apoio do SEBRAE/SP para implantar esses processos."
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