A Lógica Diante da Aventura
Treinado, desde
o berço até a faculdade, para ser funcionário, o profissional
brasileiro costuma passar por um grande aperto na hora em que assume um negócio
por conta própria. Seu único aliado, na hora de decidir, é
o bom senso, versão popular da lógica. Com esse instrumento, ele
precisa enfrentar a selva do mercado e conviver com o espírito de aventura
que inspira os negócios, num país em que a economia ainda é
regida pelos caprichos coloniais dos seus governantes.
A competência de gerenciar esse paradoxo faz parte do acervo empírico
do empresário nativo. Fazê-lo conceituar esse tipo de experiência
é função jornalística deste espaço, investido,
desde 1987, na missão de trazer a público o modelo brasileiro
de administração. Esse embate entre lógica e aventura,
por exemplo, foi tirado do depoimento - sintetizado a seguir - de João
P. Cardoso Filho, diretor administrativo e financeiro e um dos sócios
da Draitec Ind. e Com. de Componentes Eletro-Eletrônicos Ltda. - tel.:
(011) 746-6700.
Cardoso trouxe, junto com os outros sócios, as vantagens e os vícios
de quem sempre trabalhou em multinacional e descobriu a importância de
trabalhar no meio das dificuldades. A busca permanente de soluções
está disseminada em toda a corporação, que fabrica relês
de vários tipos, além de atuar em outras linhas de produto para
as áreas de informática e telecomunicações.
QUEBRAMOS A CARA VÁRIAS VEZES
"Éramos gerentes de multinacional, e bastava fazer um sinal para
aparecer alguém e assessorar-nos. Trouxemos de lá uma experiência
muito boa em relação ao conhecimento técnico e à
abertura da cabeça para o mercado. Mas, para resolver os problemas do
dia-a-dia, nós não sabíamos absolutamente nada. Quando,
em 1990, resolvemos assumir esta empresa, que foi fundada há oito anos
por uma pessoa que não faz mais parte da sociedade, descobrimos que ser
empresário é fazer absolutamente tudo aquilo que pedíamos
para os outros.
Quando você é empresário, todos os problemas são
seus. Para resolvê-los, optamos pela lógica. Quebramos a cara várias
vezes, mas, de modo geral, conseguimos entender tudo o que não conhecíamos
a fundo. A época da nossa experiência inicial foi de recessão
muito grande, provocada pelo Plano Collor, mas considero um ótimo começo,
pois quando você começa na dificuldade a tendência é
aprender muito mais.
No Brasil, não existe a formação de empresário.
Quem monta uma empresa submete-se a uma aventura. Você descobre isso depois
que já está no negócio, parece até filme de Indiana
Jones. É preciso atirar, acertar, sair de situações difíceis
e ter um jogo de cintura muito grande. Todo empresário brasileiro é
um empresário de risco. Você tem que fazer aquilo que está
na sua cabeça e não pode vacilar."
A ESTRATÉGIA DOS INVESTIMENTOS
"Nós planejamos com dois anos, em média, de antecedência.
Discutimos e criamos metas, definindo novos produtos, decidindo investir em
determinado segmento e, depois, vamos atrás desses objetivos. É
importante escrever esses objetivos, pois ajuda a concretizá-los. Procuramos,
assim, erradicar uma visão míope da nossa função,
pensando a longo prazo e com horizontes mais amplos.
Uma visão ampla do nosso negócio é a comutação,
a ligação. Pois, hoje, o relê é eletromecânico,
daqui a pouco isso pode mudar. Baseados nisso, buscamos novas tecnologias ou
parcerias. É por isso que estamos participando do projeto-piloto de associativismo
do SEBRAE/SP, a Associaval. Esse engajamento é fruto das minhas idas
e vindas ao SEBRAE/SP, que é uma instituição que realmente
auxilia os pequenos e médios empresários, que existe para que
o empresário cometa menos erros e crie empresas sólidas.
O empresário pode criar mecanismos para que o próprio produto
financie o projeto escolhido. Para comprar uma máquina, por exemplo,
é preciso criar um projeto para ela, colocar tudo no papel e ver se ela
vai poder pagar-se. Foi assim que começamos com mil e 2 mil relês
por mês e já estamos fabricando 300 mil, mas nossa meta para 1996
é de 1 milhão de unidades por mês. Isso sem inchar a empresa,
apenas aperfeiçoando os métodos de fabricação."
« NO INTERIOR TUDO É MAIS FÁCIL
"Temos, hoje, na Draitec 87 funcionários e 45 na Prositec, situada
em Serra Negra, interior de São Paulo. Nossa estratégia é
a descentralização, pois São Paulo, apesar de ainda ser
um importante centro de vendas, é um lugar caótico para a produção.
Aqui, a mão-de-obra come mal, vive mal, mora mal, enfrenta um trânsito
caótico. No interior é diferente, pois a pessoa, no mínimo,
tem casa própria, ou vive na casa dos pais, e o nível cultural
também é melhor.
Nossa unidade em Serra Negra serve para prestar serviço para a Draitec.
Passamos uma série de linhas de produtos para lá, e ela faz toda
a industrialização para nós. Estamos num bairro em que
o pessoal mora encostado à indústria, vai almoçar em casa
e volta para trabalhar. É uma facilidade.
Estamos, também, investindo bastante em terceirização,
especialmente nos processos de estamparia, injeção de plástico
e montagem. São microempresas com cinco funcionários, em média,
que trabalham com o acompanhamento do nosso controle de qualidade e o ferramental
desenvolvido por nós. Isso gera emprego, barateia nosso custo e multiplica
a produção."
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